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Na disputa pelo serviço de delivery de comida por aplicativo, empresas estrangeiras afirmam que pretendem investir bilhões no Brasil, de acordo com anúncios feitos recentemente.
A colombiana Rappi informou que sua aposta para os próximos três anos será de 1,4 bilhão, enquanto a chinesa Meituan desembolsará 5,6 bilhões para implantar no país seu aplicativo “Keeta”. Já a brasileira 99 disse que pretende reativar o serviço 99Food, inativo desde 2023, e, para isso, promete injetar cerca de R$ 1 bilhão.
O que há em comum entre todas essas empresas é que a principal estratégia de negócio para ganhar mercado está em isentar os restaurantes da cobrança de taxas pelas entregas realizadas.
Mas o que essas companhias pretendem fazer em relação aos motociclistas? O que elas têm a oferecer de vantagem aos entregadores, principalmente no que diz respeito à sua segurança? Afinal, o trânsito brasileiro é considerado o terceiro mais violento do mundo, e os motociclistas são as principais vítimas de acidentes no país.
É claro que, para a nossa economia, são importantes os investimentos dessas empresas e a geração de emprego e renda. No entanto, os acidentes também resultam em grandes prejuízos aos cofres públicos
Hoje, não existe no Brasil nenhum mecanismo de amparo às vítimas de acidentes de trânsito. Criado em 1974, com o objetivo de indenizar os acidentados (independentemente da culpa) em casos de morte, invalidez permanente e despesas médicas, o DPVAT teve a arrecadação de recursos extinta em 2020. No atual governo, chegou a haver uma proposta de criação do SPVAT (Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito), mas, em dezembro de 2024, ela foi revogada.
No entanto, em maio fomos a Brasília e apresentamos a deputados, senadores e ministros uma proposta de Projeto de Lei que obrigue plataformas de transporte de passageiros e entregas de mercadorias a contratar seguro de vida e acidentes pessoais em favor de motociclistas e passageiros.
Entre outras garantias, estariam R$ 150 mil aos familiares em caso de morte acidental; ao próprio trabalhador, em casos de invalidez permanente, total ou parcial; ou um auxílio de R$ 20 mil para cobrir despesas médicas, hospitalares e odontológicas.
Só em 2024, as internações de vítimas de acidentes de trânsito no Sistema Único de Saúde custaram R$ 3,8 bilhões – sendo que 60% dos internados eram motociclistas, de acordo com estudo publicado pela Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) e pela Associação Brasileira de Medicina de Emergência (Abremed).
Portanto, é urgente que haja um mecanismo de amparo a essas vítimas, que muitas vezes passam por um longo período de recuperação, afastadas do trabalho e sem qualquer renda extra, além de frequentemente ficarem com sequelas irreversíveis.
É inadmissível que a fome de grandes empresas por um lucro desenfreado se sobreponha à integridade física e à dignidade de mais de 1,5 milhão de brasileiros que trabalham como entregadores por meio de aplicativos, como se a vida de cada um deles valesse menos que um lanche.
Lucio Almeida é presidente do CDVT – Centro de Defesa das Vítimas de Trânsito.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



