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A mais acirrada e consequente questão internacional contemporânea, com implicações geoestratégicas avassaladoras, acaba de sofrer importante mudança. Apesar das críticas do governo israelense, a conclusão do rumoroso acordo sobre o programa nuclear iraniano, anunciado pelo Conselho de Segurança da ONU, ao romper o isolamento de Teerã, consegue obter inegável êxito jurídico, técnico e político.

O programa de Teerã, de clara busca de capacitação nuclear, não incidia apenas no conflito pan-islâmico, de fratricida disputa entre sunitas e xiitas, atingindo todo o equilíbrio de forças no Oriente Médio, com impactante reflexo na segurança do Estado de Israel e na questão palestina. Embora o atual acordo represente esforço coletivo das Nações Unidas, a incluir a rara adesão sino-russa, é a Casa Branca que banca o fragoroso desafio, apto a constituir-se tanto no mais expressivo êxito da política externa de Obama quanto no seu mais lamentável fracasso.

Não há como defender o isolamento como ferramenta eficiente de política externa

O pano de fundo da demanda incide na recorrente questão da proliferação nuclear fora do restrito clube dos clássicos detentores da bomba atômica, o que o embaixador brasileiro Sérgio Correia da Costa já designava, nos anos de 1970, como “colonato nuclear”. Hoje, se o debate parece o mesmo, os riscos potenciais do enriquecimento de urânio adquirem proporções dramáticas, sem os pesos e contrapesos da Guerra Fria, em que inimigos eram francamente previsíveis, com nome, telefone vermelho e endereço.

Após isolamento político e bloqueio econômico asfixiantes, o Irã renovado do presidente Rouhani obtém agora a suspensão de embargos da comunidade internacional, em troca da suspensão vigiada de sua capacitação nuclear. Como país hipossuficiente, de alimentos a medicamentos, o Irã volta a respirar e a reativar sua combalida, porém promissora economia petroleira, o que por certo inquieta não apenas Israel e Arábia Saudita, mas todo o entorno de interesses do explosivo Oriente de mil guerras.

Longe do erro histórico que se tenta imputar a Obama, não há como defender o isolamento como ferramenta eficiente de política externa, em que a negociação e o diálogo têm se demonstrado mais eficientes. A desastrada guerra do Iraque, de maldita herança legada não apenas à sociedade americana, é, nesse sentido, rutilante exemplo.

Houvera a diplomacia norte-americana do próprio Obama, conduzida pela secretária de Estado Hillary Clinton, permitido que se prosseguissem as negociações intermediadas por Brasil e Turquia, há cinco anos, muito se teria adiantado na agenda virtuosa que agora se constrói. Foi ocasião perdida, embora fosse o Irã ainda governado pela política intransigente de Ahmanidejad e de sua sintonia apurada com os aiatolás fundamentalistas. As negociações que se estimavam promissoras, primeiro incentivadas e depois boicotadas pela Casa Branca, demonstram o recorrente tropismo da política externa americana de democratas que se parecem republicanos e vice-versa. Agora, contra os agouros mais conservadores, do Knesset aos opositores de Obama e de Rouhani, mas com apoio maciço da comunidade internacional, dá-se uma concreta chance à paz.

Jorge Fontoura, doutor em Direito Internacional, é analista de política externa.
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