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Federações partidárias e a vontade de mascarar partidos políticos

Câmara
(Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil)

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A reforma eleitoral de 2021 estabeleceu uma nova regra para as próximas eleições: a criação e o funcionamento das federações partidárias, permitindo que diferentes partidos possam se unir em âmbito nacional para as eleições majoritárias (presidente, governador, prefeito e senador) e proporcionais (deputado federal, deputado estadual e vereador), com estatuto próprio durante o mandato conquistado nas urnas – em regra, quatro anos –, sem impedimento de sua continuidade para um novo mandato conquistado. As federações seguirão as mesmas regras utilizadas por partidos políticos quanto à fidelidade partidária, atuação dos parlamentares e possíveis sanções de seus membros. Segundo as justificativas para a criação dessa nova regra, as federações servirão de teste numa possível fusão futura, e servem de alívio para os partidos nanicos sobreviverem à cláusula de barreira para uso do Fundo Partidário e horário gratuito de rádio e televisão.

A criação das federações partidárias foi uma saída encontrada pelos políticos para driblar uma regra que modernizou nosso sistema eleitoral a partir das eleições 2020, que foi o fim das coligações nas eleições proporcionais, em que vários partidos poderiam se unir e compartilhar votos elegendo deputados federais, deputados estaduais e vereadores sem muito critério partidário. O resultado das eleições municipais de 2020 fortaleceu partidos políticos mais programáticos, candidaturas femininas e estabeleceu um parâmetro mais claro de posicionamento partidário, situação que não favorece o político que gosta de pular de partido para partido de acordo com os ventos da eleição.

O sistema político brasileiro tem um flerte com a não identificação partidária; passamos por períodos de bipartidarismo forçado, regras partidárias distantes da realidade política, coligações nas eleições proporcionais que escondiam o posicionamento de partidos num grupo amorfo, regras e realidades que sempre mascararam a necessidade dos partidos para a dinâmica política. Entretanto, quando olhamos para as disputas eleitorais, o dia a dia do Congresso Nacional e a organização das lideranças políticas nos estados e municípios, o que mais se observa é a necessidade de uma organização em questões partidárias. Um exemplo disso é o posicionamento político dos partidos dentro de qualquer votação no Congresso Nacional, onde as posições dos grupos partidários são necessárias para qualquer tipo de aprovação significativa.

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No Brasil, os mecanismos de fidelidade partidária são ínfimos, tanto que podemos observar com grande frequência políticos que pertenceram a nove, oito ou sete agremiações partidárias absolutamente diferentes dentro de sua carreira política; isso não soa estranho para a maioria das pessoas, mas seria estranho se esse mesmo indivíduo mudasse de time de futebol a cada edição do campeonato brasileiro.

Querendo ou não, as questões partidárias são absolutamente necessárias dentro do ambiente político; não se faz uma campanha eleitoral, uma aprovação de um projeto significativo, uma coalizão de governo ou se cria estabilidade política sem levar em conta as questões partidárias. Enquanto tivermos a crença de que os partidos não servem para nada, ou enquanto criarmos regras permissivas em desrespeito aos partidos políticos, não vamos amadurecer politicamente, e a federação é mais uma saída legal para o não respeito à fidelidade partidária, permitindo que partidos nanicos e sem identificação política séria continuem a existir e surfar a onda dos demais. Se negarmos a política como ela realmente é, nunca vamos compreender o seu verdadeiro funcionamento.

Francis Ricken é advogado, mestre em Ciência Política e professor da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo (UP).

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