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Lula e a ministra da Saúde, Nisia Trindade.
Lula e a ministra da Saúde, Nisia Trindade.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O presidente Lula durante a campanha disse que o aborto era uma questão de saúde pública. Após ser pressionado durante a campanha, disse ser contra o aborto. Só alguém muito ingênuo ou não bem intencionado acreditou nessa mentira. Ele já diversas vezes no passado se manifestou pelo aborto como questão de saúde pública (eufemismo para se declarar favorável ao aborto).

Aborto não é problema de saúde pública porque não preenche nenhum critério para assim ser denominado. Não provoca muitas mortes nem morbidades e nem custo aumentado para o sistema público como eu mostrei exaustivamente na audiência pública na ADPF 442 no STF em 2018 em que fui lamentavelmente o único médico contra o aborto. Consegui provar com números que as mortes por aborto ilegal eram muito inferiores aos dados inventados pelas defensoras da descriminalização do aborto. Enquanto o número real não passa de 20 a 40 por ano, elas chegavam a falar em até 50 mil mortes anuais no Brasil por aborto. O Lula também no passado assumiu inflar números do aborto para provocar comoção.

Não existe homicídio legal. O que existe é aborto com excludente de ilicitude quando feito por médico nas situações que a lei prevê.

Mesmo com essa realidade, o STF achou por bem proibir de se dizer que o Lula era favorável ao aborto durante a campanha. Conforme previsto, após assumir, a atual ministra da Saúde de Lula revogou diversas medidas a favor de mães e bebês e contra o aborto. Ela disse que todas as medidas contra o "direito sexual e reprodutivo" seriam revogadas e o secretário da Atenção Primária que assumiu no meu lugar disse que iria revogar tudo que tenha sido feito contra o "aborto legal" na minha gestão.

Primeiro, é importante entender que o termo “direitos sexuais e reprodutivos” é utilizado por ativistas como eufemismo de aborto e que aborto legal não existe, assim como não existe homicídio legal. O que existe é aborto com excludente de ilicitude quando feito por médico nas situações que a lei prevê. Quem votou no PT sabia em quem estava votando. O PT nunca foi contra o aborto. Sempre defendeu a legalização.

É preciso saber qual será a linha de ação do governo Lula: se será realmente no sentido de se ampliar e facilitar o aborto ou se ele irá cumprir a promessa de campanha.

Em 2019, veio a pá de cal nos movimentos abortistas porque cortamos o orçamento de estudos de péssima qualidade que usavam para dar caráter científico à causa. A mídia sumiu com o tema aborto na campanha porque sabia que isso tiraria pontos do Lula. As próprias ativistas a favor do aborto deram ordem para não se tocar no tema. Mas na época nosso próprio governo também não soube mostrar tudo o que foi feito a favor das duas vidas, a da mãe e a do bebê desde a concepção.

O mais bizarro é que o então candidato Lula saiu do último debate como o candidato contra o aborto, ao mesmo tempo em que tentou imputar a ideia de que o presidente Bolsonaro era a favor do aborto. Foi algo absurdo, pois sempre tive o apoio de Bolsonaro para fazer as diversas medidas que fiz contra o aborto. Agora é preciso saber qual será a linha de ação do governo Lula: será realmente no sentido de se ampliar e facilitar o aborto ou ele irá cumprir a promessa de campanha, quando disse ser contra o aborto?

Quem votou no PT sabia em quem estava votando. O PT nunca foi contra o aborto. Sempre defendeu a legalização.

Após a revogação da portaria que obrigava ao médico notificar o estupro de quem fosse fazer aborto por estupro e, obviamente, intimidava quem mentia, reuni-me com a CNBB para explicar nossas ações contra o aborto na época do governo e logo depois a CNBB lançou uma contundente carta contra o aborto pressionando o Lula a recuar. Saiu na mídia que, após essa carta, o Lula chamou a ministra e pediu para ela e os secretários parassem de falar de aborto. Se ocorreu isso, ela parece não o ter obedecido.

Logo depois, veio o segundo tiro de morte nas nossas ações. O Ministério da Saúde retirou do ar o documento que proibia matar bebês acima de 20 semanas dentro da barriga nos casos permitidos por lei. Essas duas ações salvaram milhares de vidas e o PT as destruiu em poucos dias. Isso demonstra que ações verdadeiramente efetivas dependem de leis que são feitas pelo Parlamento.

Embora muitos parlamentares de direita tenham se elegido com o argumento de serem contrário ao aborto, nada fizeram de prático para dificultar a prática. Parece que foi apenas uma estratégia para conseguir votos. Seria muito fácil fazer projetos nesse sentido sendo maioria e contando com o apoio do governo, mas não o fizeram. Agora, na atual legislatura, também não parecem interessados em frear ou ao menos censurar o governo Lula. Lembro que quando eu era secretário, qualquer ação minha em relação à defesa da vida era seguida de uma saraivada de convites e convocações para comissões na Câmara e no Senado e de ações judiciais vindas dos mais diversos lugares.

Em vez de se preocuparem em facilitar o aborto, deveriam se preocupar em fazerem políticas de saúde que beneficiem a população. Ainda não vi nenhuma ação efetiva que foque nos reais problemas da saúde após quase três meses de governo. Diziam que éramos genocidas e que não vacinávamos a população. Se era tão fácil aumentar as taxas de vacinação como diziam, por que só marcaram a primeira campanha de vacinação após dois meses de governo e ainda jogaram fora mais de 27 milhões de doses de vacinas?

As mesmas ativistas que dizem que em casos de agressão à mulher se deve sempre denunciar para evitar novos casos dizem que em casos de estupros não se deve denunciar.

A única política lançada até agora foi a de reconstrução mamária, que foi totalmente feita pelo nosso governo. O presidente do Conass na época – que hoje ocupa o cargo de secretário da Atenção Primária de Lula – não quis pactuar a medida em dezembro. Nos dois anos e meio em que ocupei o cargo de secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde, de junho de 2020 a dezembro de 2022, lançamos diversas medidas contra o aborto. Mais do que em toda a história do Brasil. Essas ações foram muito mal divulgadas, o que abriu espaço para a grande mídia surfar com mentiras contra elas.

A primeira foi a portaria que obriga ao médico, ao ficar ciente de uma solicitação de aborto por estupro, comunique o fato à polícia. Simplesmente cumprimos a Lei de Violência Sexual de 2018. As ativistas entraram em desespero com essa portaria porque elas sabem que muitos casos de quem pede o aborto por estupro são mentiras. Entraram no STF para derrubarem e não conseguiram, mas agora o PT a revogou, mesmo com a Igreja Católica pedindo que a medida fosse mantida. Ou seja, querem proteger estupradores nos casos em que houve estupro e proteger mentirosas nos casos em que não houve estupro.

Não há justificativa médica para se matar o bebê antes de o retirar da barriga. Só maldade mesmo.

As mesmas ativistas que dizem que em casos de agressão à mulher se deve sempre denunciar para evitar novos casos dizem que em casos de estupros não se deve denunciar. Ou seja, deve-se deixar a mulher e, muitas vezes, crianças, continuarem a serem estupradas. É a eterna hipocrisia da extrema-esquerda. Mas é preciso lembrar que mesmo com a revogação, a notificação é obrigatória baseada na Lei de Violência Sexual de 2018. Interessante que não vejo nenhum checador de fake news da grande mídia esclarecendo a verdade. Detalhe: essa regra foi instituída pelo próprio PT em 2012, mas ninguém cumpria.

Sobre o aborto após 20 semanas, não houve proibição a quem tem direito. A medida que constava do manual sobre aborto do Ministério da Saúde simplesmente proibia o sadismo de se injetar cloreto de potássio no coração do bebezinho antes de o tirar e se dar a ele uma chance de tentar brigar pela vida. Não há justificativa médica para se matar o bebê antes de o retirar da barriga. Só maldade mesmo. Nunca vi a mídia questionar o motivo de os médicos de SC, em caso recente, terem matado o bebê antes de o retirar já com 29 semanas. Aliás, os defensores do aborto querem nos proibir até de usarmos o nome "bebê" para nos referirmos ao feto que será abortado.

Outras duas ações importantes do governo passado foram notas técnicas. Uma delas proibia o aborto por telemedicina, um verdadeiro crime contra o Código Penal. A outra era a que proíbe venda de remédio abortivo. Foram essas as ações do governo Bolsonaro no âmbito do Ministério da Saúde contra o aborto. Já o Parlamento, que é o poder com capacidade para restringir o aborto, lamentavelmente, não fez nada de efetivo. Além disso, duplicamos o orçamento para cuidar de mães e bebês criando a Rede de Atenção Materno-infantil (RAMI) no lugar da péssima Rede Cegonha criada pelo PT que duplicou o número de mortes de gestantes na pandemia. Havíamos duplicado o orçamento da atenção materna infantil de R$ 900 milhões para R$ 1,8 bilhão. O governo Lula também a revogou por questões estritamente ideológicas. Isso mostra que mães e bebês não são prioridades do PT. Uma verdadeira terra arrasada é o que eles irão deixar para mães e bebês e na saúde brasileira.

Todo nosso trabalho foi deixar como legado uma saúde materna muito melhor.

A saúde das mulheres e das crianças foi a prioridade máxima do governo anterior. Minha primeira providência como secretário foi qualificar a gestão, colocando um obstetra com quatro pós-doutorados e livre docência na direção do setor e uma obstetra com mestrado na coordenação que cuida da saúde de mulheres e crianças, além de mim, ginecologista-obstetra com mestrado em epidemiologia e doutorado em ginecologia e médico concursado da UFRJ. Sugiro procurar o histórico do Ministério e jamais verão corpo técnico tão qualificado.

Lançamos também o Previne Brasil, novo modelo de financiamento da Atenção Primária, que, após diversas melhorias na nossa gestão, aumentou o orçamento de R$ 17 para R$ 26 bilhões com a ajuda dos ministros Pazuello e Queiroga, além de conseguimos mais de R$ 10 bilhões em créditos extraordinários. Isso possibilitou uma condução da pandemia com apoio federal sem que faltasse recurso para nenhum município do Brasil. Tudo isso, reforço, graças ao governo do presidente Bolsonaro. Perguntem a qualquer secretário municipal de saúde do Brasil, e eles serão unânimes em dizer que nunca houve tanto recurso para a Atenção Primária na história.

Outra ação que merece destaque é o Médicos pelo Brasil, que levou profissionais capacitados, com CRM e contratados com a dignidade que os médicos merecem, a oferecer saúde de qualidade para a população, totalmente diferente do modelo anterior, do PT, que trazia pessoas de outros países sem qualquer certeza de sua qualificação e, quando advindos de Cuba, tinham parte de seus salários aprisionados e enviados para financiar o governo cubano.

Nossa gestão focou nas três causas prevalentes de mortalidade materna: hipertensão, hemorragia e infecção. Durante muitos anos, por questões ideológicas, as políticas públicas tinham verdadeira fixação por somente dar publicidade para aborto e diminuição de cesarianas, com o único objetivo de baratear custos tirando obstetras da assistência ao parto e o direito de as mulheres pobres escolherem sua via de parto, impondo-lhes o parto vaginal sem anestesia à custa de colocar as mulheres pobres em risco. Nossa gestão acabou com esse cenário de horror. Nosso governo defendia as duas vidas desde a concepção e todas as nossas políticas foram no sentido de valorizar sempre as vidas da mãe e do bebê.

Todo nosso trabalho foi deixar como legado uma saúde materna muito melhor e que levaria o Brasil, nos próximos anos, a patamares civilizatórios de mortalidade materna e a um SUS muito mais forte. Pena que o PT não deixou.

Raphael Câmara Medeiros Parente é ex-secretário nacional de Atenção Primária do Ministério da Saúde e Conselheiro Regional e Federal de Medicina pelo RJ.

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