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Já que não dissemos “não”

Por que não dissemos "não", quando vieram com essa história de ter a Copa do Mundo em Curitiba? O ufanismo político local (município e estado) podia ser sintetizado na frase reinante: agora o mundo vai ver como Curitiba é boa. Para quê? E o complemento era que os investimentos – públicos, mas também privados, claro – tirariam do papel obras importantes. Cadê? No dia 16 de junho começa a Copa na cidade. Dez dias depois, os turistas irão embora.

E aí entra em cena quem realmente importa: você. Aos poucos nos daremos conta das obras inacabadas, as várias necessárias e não realizadas, e as construídas desnecessárias. Então nos perguntaremos: por quê? Por que não dissemos "não", quando vieram com essa história de ter a Copa do Mundo em Curitiba?

Entre as cidades que sediarão os jogos, Curitiba tem várias vantagens. A primeira delas é que o estádio está no centro da cidade, com quase a totalidade dos hotéis de categorias superiores – acima de três estrelas – a menos de 2 quilômetros de distância; e a Rodoferroviária, por onde parte dos turistas chegarão, vindo de ônibus ou do aeroporto, a menos de 1 quilômetro. Ou seja, haverá um trânsito intenso de pedestres nos dias de jogos. Além disso, é uma região bem servida de transporte público, e também conta com várias atrações turísticas.

A segunda, derivada desta, é que Curitiba não precisaria, portanto, de investimento pesado em infraestrutura de transportes. Mas, já que aceitamos – na verdade, nos candidatamos – sediar a Copa, teria sido o momento de se fazer uma análise realista do que de fato precisávamos, do que poderíamos cumprir em cinco anos, e de como usar a atenção mundial para focar nos projetos que sabemos fazer de melhor: inesperados (uma casa de ópera em pedreira abandonada), de pequena escala (fechar o trânsito em uma via local e fazê-la um jardim ambiental), e de amplo impacto (coletar material reciclado e dar a isso uma identidade urbana, com um caminhão verde tocando uma sineta).

Algumas obras avançaram, como a reforma da Rodoferroviária, que será importante para depois dos jogos. No entanto, no maior espírito Maria-vai-com-as-outras, prometemos até um metrô em cinco anos, e acabamos com um viaduto estaiado. No vídeo sobre a cidade lançado há poucos dias pela Fifa, o atrativo turístico mais recente já estava pronto na Copa da Coreia do Sul/Japão, aquela em que dormi.

Em 2009, em comentário a pedido da revista do Crea-PR, escrevi que corríamos o risco de investir muito para ver Togo jogando contra Tuvalu. Tirando a vinda da Espanha, errei por pouco. Mas não é hora de ser pessimista, e confio em que a cidade fará o melhor para receber os turistas nesses dez dias de festa. O que me preocupa é o 11.º dia.

Fábio Duarte é professor do Mestrado e Doutorado em Gestão Urbana na PUCPR.

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