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A Lei Magnitsky, criada nos Estados Unidos em 2012 em homenagem ao advogado russo Sergei Magnitsky, tem como objetivo central permitir a aplicação de sanções individuais contra pessoas e entidades envolvidas em corrupção e graves violações de direitos humanos, evitando punições coletivas contra populações inteiras por meio de embargos econômicos. Vejo essa legislação como um marco na responsabilização internacional. O grande mérito da Lei Magnitsky é isolar financeiramente corruptos e violadores de direitos, impedindo que tenham acesso ao sistema financeiro global e, consequentemente, reduzindo seu poder de atuação.
A norma inspirou leis semelhantes em países como Canadá, Reino Unido e membros da União Europeia. Na prática, os resultados mais visíveis têm sido o bloqueio de ativos em bancos internacionais, restrições de viagem e o isolamento político e econômico de autoridades e empresários acusados.
A experiência da Lei Magnitsky mostra que é possível responsabilizar de forma cirúrgica quem ataca direitos fundamentais
No Brasil, ainda não temos uma legislação equivalente. Contamos com um arcabouço de prevenção à lavagem de dinheiro, combate ao financiamento do terrorismo e normas do Banco Central e do COAF, mas não existe uma ferramenta jurídica específica para impor sanções direcionadas a indivíduos estrangeiros por corrupção ou violações de direitos humanos, como acontece nos EUA e na Europa.
Do ponto de vista do setor financeiro brasileiro, os desafios seriam significativos. Sem respaldo legal claro, eu e qualquer instituição não poderíamos simplesmente bloquear ativos apenas por suspeitas internacionais, sob pena de responder judicialmente.
Há, portanto, um risco jurídico concreto. Por outro lado, sei que a omissão diante de indícios graves gera também riscos reputacionais, especialmente frente ao mercado global, que cobra cada vez mais rigor no compliance. Estamos diante de um dilema: seguir estritamente a legislação nacional ou alinhar-se a padrões internacionais para não comprometer relações estratégicas com parceiros globais.
Mesmo sem lei específica, percebo que as pressões internacionais já influenciam as instituições financeiras no Brasil. Vejo bancos e cooperativas reforçando seus mecanismos de due diligence, aprimorando a governança corporativa e se preparando para um cenário em que esse tipo de sanção possa se tornar realidade. Esse movimento em direção a práticas mais sofisticadas de compliance pode até gerar custos adicionais no curto prazo, mas tende a fortalecer a credibilidade do sistema financeiro brasileiro no longo prazo.
Na minha visão, o país tem diante de si uma oportunidade. A experiência da Lei Magnitsky mostra que é possível responsabilizar de forma cirúrgica quem ataca direitos fundamentais. O Brasil pode evoluir nesse caminho, e acredito que as instituições financeiras terão papel central, não só como executoras, mas como verdadeiras guardas avançadas contra a circulação de recursos ilícitos.
André Dantas, advogado com expertise em processo legislativo e Direito Público, é head do escritório André Dantas Advogados.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



