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A economia brasileira apresentou, ao longo de 2022, um desempenho positivo, mas resultado pode não se repetir em 2023.
A economia brasileira apresentou, ao longo de 2022, um desempenho positivo, mas resultado pode não se repetir em 2023.| Foto: Pixabay

A economia brasileira apresentou, ao longo de 2022, um desempenho positivo em meio a um ambiente macropolítico global desafiador. A continuidade da reabertura econômica global pós pandemia, as discussões e tensões geopolíticas no Leste Europeu e na Ásia, a resiliência da inflação de serviços, o ciclo de aperto monetário dos Bancos Centrais, o avanço do processo de desinflação no ambiente doméstico, o avanço do processo de desglobalização e as incertezas com relação à economia chinesa e sua política econômica, são exemplos de fatos relevantes visualizados em economias emergentes e avançadas.

Na economia local, a atividade (PIB) surpreendeu. Enquanto as projeções de crescimento da pesquisa Focus, no início de 2022, apontavam para a mediana de +0,7%, o consenso moveu-se ao longo do ano e encerrou com uma expectativa de +3,0%. Entre os motivadores para as revisões, destacam-se: (i) a continuidade do processo de reabertura econômica, impulsionado pelo setor de serviços; (ii) transferências de renda do governo às famílias, gatilho para o aumento do consumo interno; (iii) mercado de trabalho positivo, com redução da taxa de desemprego para patamar historicamente baixo (+8,1%, em novembro). O Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), divulgado pelo Banco Central, alcançou +2,90%, ao final de 2022.

Os ruídos políticos ampliam a percepção de riscos pelos agentes econômicos e proporcionam um esforço maior ao Banco Central do Brasil para ancoragem de expectativas de inflação.

Apesar da recuperação econômica, os choques de oferta nas cadeias de suprimentos em meio da recuperação sincronizada da demanda nos países ocidentais pós-Covid e o início dos conflitos no leste europeu, produziram pressões inflacionárias disseminadas. No Brasil, após alcançar 12,1% em abril, a inflação encerrou o ano passado em 5,8%, onde a principal influência positiva foi a redução na tributação de ICMS sobre bens e serviços essenciais, com destaque aos combustíveis. Na Europa, Inglaterra e Estados Unidos, a inflação encerrou o ano passado, respectivamente, em 9,2%, 10,5% e 6,5%. Por outro lado, a inflação na China (e em um conjunto de países asiáticos) foi bastante menor: 2,1% na China, 5,5% na Indonésia e 3,8% na Malásia, por exemplo.

Em resposta aos choques de oferta e demanda, o Banco Central do Brasil (BCB) elevou a taxa Selic para 13,75% e encerrou o ano com uma taxa de juro real ex-ante de 8%, patamar bastante contracionista. As defasagens com que opera a política monetária são elevadas e, estima-se, que o processo de aumento de juros pela autoridade monetária terá seu efeito sobre a economia real neste ano, principalmente no 1º semestre de 2023. Porém, vale ressaltar, que o eficiente combate à inflação é composto pela política econômica e monetária e, também, por uma política fiscal adequada.

Os agentes econômicos aguardam um novo arcabouço fiscal a ser apresentado até o fim de março.

Assim, o déficit fiscal de R$ 231,5 bilhões (estimado no orçamento da União para 2023) e os sinais de ampliação de gastos públicos pelo novo governo preocupam, destacando-se a expansão fiscal aprovada na PEC da Transição, que amplia os gastos públicos em mais de R$ 145,0 bilhões fora da regra de responsabilidade fiscal vigente, o reajuste do salário-mínimo para R$ 1.320 e a isenção do IRPF para indivíduos com renda de até R$ 2.640 por mês.

O plano fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda, apesar de ir na direção correta, é insuficiente para reequilibrar as contas públicas e dar previsibilidade para a trajetória fiscal. Os agentes econômicos aguardam um novo arcabouço fiscal a ser apresentado até o fim de março pelos responsáveis pela política econômica, substituindo a regra fiscal corrente, praticamente extinta com o anúncio da PEC da Transição. Sem entrar em detalhes, o consenso do mercado é de um pacote fiscal com poucas medidas factíveis, destacando-se o aumento da tributação sobre combustíveis e receitas financeiras estimado em R$ 28,8 bilhões e a revisão da base de cálculo das restituições de créditos tributários decorrentes da retirada do ICMS da base de cálculo do PIS e Cofins estimado em R$ 30 bilhões.

As demais medidas da política econômica anunciadas apresentam dúvidas em termos de viabilidade, além de serem pontuais para o ano corrente. Desta forma, aguarda-se um plano fiscal robusto, com a presença de medidas estruturais do lado das despesas, criando condições para o processo de desinflação, início do ciclo de redução da taxa básica de juros e evolução sustentável da dívida pública.

As demais medidas da política econômica
anunciadas apresentam dúvidas em termos de viabilidade, além de serem pontuais para o ano corrente.

Em meios aos desafios citados acima, os ruídos do novo governo e sua política econômica com relação à autonomia operacional do Banco Central e à meta de inflação ampliam a percepção de risco dos agentes econômicos, o que estimula a desvalorização cambial, o avanço da inflação e suas expectativas e abertura da curva de juros futuro, variáveis importantes na precificação de ativos locais. Apesar da ausência de comunicação do Conselho Monetário Nacional (CMN), as expectativas de inflação para o horizonte relevante de política monetária já demonstram desancoragem, ampliando os desafios da política monetária no combate à inflação.

O consenso de mercado é de que o processo de aumento do centro da meta de inflação, com o objetivo de reduzir a taxa referencial de juros, em meio a um contexto de ampliação de gastos públicos, torna-se ineficaz. Uma eventual mudança, caso tecnicamente discutida, deve ser moderada e conduzida em meio a um quadro de equilíbrio fiscal, ou seja, a partir de regras factíveis e críveis de responsabilidade fiscal com as contas públicas.

Nos Estados Unidos, o Federal Reserve elevou a taxa referencial de juros (FFR) para o intervalo de 4,50% e 4,75% em sua última reunião, em linha com o movimento dos principais bancos centrais globais, o que tende a induzir uma recessão global sincronizada nos próximos trimestres. Após alcançar 9,1% em junho, a inflação aos consumidores nos Estados Unidos encerrou o ano em 6,5%, patamar elevado devido a resiliência da inflação de serviços e de suas características inerciais, a partir de um mercado de trabalho que segue apertado.

A economia brasileira, em consequência da desaceleração da atividade global, da retomada da economia chinesa e do juro real local, deve desacelerar

Jerome Powell sinalizou que o Federal Reserve ainda tem muitos desafios para convergir a inflação para a meta de 2%. Em linha, os membros do Comitê de Política Monetária (FOMC) reforçam que o risco de errar para menos, subindo menos os juros referenciais, seria negativo para o equilíbrio econômico de médio prazo da economia, sinalizando uma preferência por errar para mais. Todo esse contexto foi reforçado, recentemente, por dados macroeconômicos resilientes, destacando-se: (a) criação de 517 mil vagas de trabalho, em janeiro, acima do consenso de mercado de 185 mil vagas para o período; (b) inflação ao produtor (PPI) com aceleração de 0,7% na variação mensal de janeiro; (c) núcleo do CPI de janeiro permanecendo pressionado, incompatível com patamar de juros nominal.

Neste cenário de política monetária contracionista e resiliência de dados, parte do mercado acredita que a recessão na economia americana será maior que o cenário estimado inicialmente. Na medida em que a autoridade monetária caminhar para encerrar o ciclo de alta de juros, a calibragem dos próximos aumentos e da taxa terminal será condicional a força (ou fraqueza) dos dados macroeconômicos de alta frequência, como a inflação, atividade econômica e mercado de trabalho. Importante reforçar que, a convergência da inflação corrente para a meta de 2% exigirá um crescimento econômico (PIB) menor que o produto agregado potencial da economia norte americana por certo período. Segundo projeções, o PIB americano encontra-se em 1,4% e 1,0% para 2023 e 2024, respectivamente.

A economia chinesa, após 8 trimestres de uma rígida restrição de mobilidade, decidiu iniciar o processo de reabertura da economia, com atenção à aceleração da vacinação, principalmente da população mais idosa. Após tanto tempo fechada, a recuperação da mobilidade trará um relevante crescimento econômico, em especial do varejo interno e serviços, fechados de forma total ou parcial nos últimos 24 meses. A poupança forçada no período em que a economia estava fechada deve ser consumida, sustentando a demanda das famílias durante o processo de reabertura, movimento muito semelhante ao que ocorreu nos países ocidentais pós-Covid.

O estouro recente da bolha imobiliária e a tentativa do governo em estabilizar o setor, devem limitar o otimismo com relação às commodities em geral. Em adição ao desafio de ajustar o setor de real estate (e os balanços das empresas privadas), destaca-se a recente piora demográfica na economia chinesa, o que deve prejudicar o crescimento econômico de médio e longo prazo no gigante asiático.

A economia brasileira, em consequência da desaceleração da atividade global, da retomada da economia chinesa e do juro real local, deve desacelerar neste ano: a última pesquisa Focus indica crescimento (mediana) de 0,76% da atividade econômica para 2023. Os desafios macroeconômicos são ampliados a partir da necessidade de endereçar o quadro fiscal, mais especificamente o novo arcabouço fiscal, e reformas estruturais necessárias, como a tributária e administrativa.

Os ruídos políticos ampliam a percepção de riscos pelos agentes econômicos e proporcionam um esforço maior ao Banco Central do Brasil para ancoragem de expectativas de inflação (controle da inflação), prejudicando o nosso equilíbrio macroeconômico, incluindo o frágil quadro fiscal corrente. O cenário externo mais desafiador e a desaceleração da atividade contratada para este ano indicam que a gestão eficaz da política econômica será fundamental para a determinação do produto agregado (PIB), inflação, contas públicas, taxa básica de juros e evolução da dívida pública, em 2023, e nos próximos anos.

Felipe Chimenti é membro do Núcleo de Estudos de Conjuntura Econômica (NECON) da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP).

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