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Medidas não afetam Greenwald, mas representam retrocesso
| Foto: Felipe Lima

Em meio à crise envolvendo denúncias do jornalista norte-americano Glenn Greenwald acerca da parcialidade de Sergio Moro na condução de processos da Lava Jato, uma portaria publicada pelo ministro alterou regras e implementou a deportação sumária de migrantes no Brasil.

Desde seus tempos de parlamentar, Jair Bolsonaro já proferia discursos anti-imigração, bandeira característica da direita e extrema-direita, e foi voto vencido contra a aprovação da Lei de Migração (Lei 13.445/2017), fruto de amplo consenso entre base e oposição no Congresso Nacional. Agora, seu governo dá provas de que fará tudo para criminalizar migrantes ao arrepio da lei aprovada, usando manobras para sua distorção sem passar pelo Congresso.

A Portaria 666/2019 foi publicada dias depois de Moro revogar o status de refugiados de três paraguaios que vivem no Brasil, alegando, em suas redes sociais, que o Brasil “não é terra sem lei” e que o país não será mais refúgio “para estrangeiros acusados ou condenados por crimes comuns”.

A medida representa grande retrocesso no que diz respeito às recentes conquistas de direitos que os migrantes obtiveram

Tal medida representa grande retrocesso no que diz respeito às recentes conquistas de direitos que os migrantes obtiveram, e que vêm sendo alvo de desmonte pelo governo Bolsonaro. Dentre os pontos mais contundentes, o texto do governo prevê que a defesa de processos de deportação sumária ocorra em no máximo 48 horas após a notificação, prazo extremamente curto e que facilita a ação arbitrária do Estado brasileiro em deportar pessoas que possam ser categorizadas como indesejadas pelas autoridades.

Além disso, cria uma vaga categoria de “pessoa perigosa” e um tipo de prisão administrativa para aquele que aguarda deportação, o que é expressamente proibido pela Lei de Migração. Por fim, estabelece que meros suspeitos de determinados crimes possam ser deportados. Cumpre ressaltar que existe um abismo entre alguém se tornar suspeito e ser culpado e condenado pelo crime, de modo que o texto de Moro permite que pessoas inocentes acabem retiradas do país.

Glenn Greenwald, que reside no Rio de Janeiro, também se manifestou no Twitter: “Hoje Sergio Moro decidiu publicar aleatoriamente uma lei [portaria] sobre como os estrangeiros podem ser sumariamente deportados ou expulsos do Brasil ‘que tenham praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal.’ Isso é terrorismo”. A medida parecia mirar diretamente o jornalista, criando novo tipo de deportação que independe da regularidade do migrante, mas desconsidera que ele é casado e tem filhos no Brasil, o que impede a deportação.

Vale lembrar que o Brasil revogou, em 2017, uma lei da época da ditadura militar, e que impunha aos migrantes um olhar de ameaça à soberania nacional e criminalizava a migração. O país também vive o contexto de crise na fronteira com a Venezuela, o que tem feito com que muitas famílias e indivíduos ingressem em território nacional fugindo da fome e da escassez de medicamentos, serviços de saúde e empregos. Tentativas de “fechar a fronteira” têm se mostrado medidas frustradas para estancar fluxos migratórios, tanto no caso brasileiro como em outras regiões do mundo. O mesmo se aplica às políticas migratórias pouco acolhedoras e desumanizadas, que não fazem com que pessoas deixem de migrar, mas apenas as tornam mais vulneráveis e à margem da sociedade, o que vai contra o interesse de desenvolvimento do Brasil.

Vitor Bastos Freitas de Almeida e Victor Del Vecchio são advogados e membros do Programa de Promoção dos Direitos de Migrantes (Promigra).

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