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Novamente integrantes do movimento negro invadiram uma aula para impor seu discurso a favor das cotas raciais e, nesse caso, protestar contra frases racistas encontradas no banheiro de uma universidade. Desta vez, o palco foi a USP Ribeirão Preto (SP). Um texto – vergonhoso para um movimento que já ostentou nomes como Abdias do Nascimento e Guerreiro Ramos – repleto de ofensas e palavras de ordem foi lido por uma jovem imponente e malvestida. Perambulando pela sala, dedo em riste, intimou os presentes, exigindo suas almas – e estes, calados, consentiram.

Um vídeo do episódio se espalhou, e alguns curiosos resolveram visitar o perfil público das jovens militantes numa rede social. Ali descobriram que as moças, entre outras coisas pouco comuns para quem se diz marginalizado, estudaram em colégios de elite e fizeram viagens internacionais mais de uma vez. O que mais me chamou a atenção, no entanto, foi a foto de capa no perfil de uma delas: a imagem de Martin Luther King Jr.

A história dos negros americanos se confunde com o cristianismo herdado do colonizador

King foi um dos mais proeminentes líderes do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos. O episódio com Rosa Parks, em 1955, presa por recusar-se a ceder a um branco o lugar onde estava sentada em um ônibus, desencadeou uma série de protestos coordenados por King, que culminaram na lendária Marcha Para Washington e no fim das leis Jim Crow. Sua liderança foi fundamental e seu sonho, apesar de não completamente concretizado, possibilitou grandes avanços à população negra americana.

Mas não só isso. King era um jovem pastor evangélico, e a história dos negros americanos se confunde com o cristianismo herdado do colonizador. A imaginação moral desse grupo, alimentada pela interpretação alegórica das histórias de salvação e libertação contidas na Bíblia, substituiu o banzo pela esperança da Terra Prometida. O Povo Negro era o Novo Israel, o ramo enxertado na oliveira.

Eu seu último sermão, horas antes de ser assassinado, King profetizou: “Ele [Deus] me permitiu subir ao topo da montanha; e, olhando de lá, vi a Terra Prometida. Talvez eu não entre lá convosco, mas quero que saibais esta noite que nós, como um povo, entraremos na Terra Prometida!” E foi essa fé e essa determinação que levaram os negros – que, diferentemente do Brasil, somam pouco mais de 13% da população americana – a alcançar os mais relevantes postos na sociedade.

E o que fez o movimento negro brasileiro, hoje representado por jovens cuja cultura está muito aquém de suas pretensões? Importou a forma e desprezou o conteúdo do movimento inspirado por King. Por isso compartilha fotos de King, mas age conforme determinam os baluartes do multiculturalismo engendrado nas universidades europeias, transformando sua luta em mera ideologia progressista.

Isso gera situações bizarras como a do deputado Jean Wyllys, que, dias atrás, na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, propôs que o Estado crie políticas públicas – leia-se: use o nosso dinheiro – para que a juventude negra evangélica seja “trazida, interpelada, disputada” para a defesa de religiões de matriz africana. Wyllys e o movimento negro brasileiro desprezam não só o legado de Martin Luther King, mas a importância do cristianismo na formação dos negros nascidos e criados no Ocidente. Querem que os negros sejam artificialmente ligados a cultos afro e à violência do discurso ideológico. Querem escravizar os negros novamente.

Paulo Cruz é professor de Filosofia e mestrando em Ciências da Religião.
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