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Propaganda eleitoral de Benjamin Netanyahu, em outubro
Propaganda eleitoral de Benjamin Netanyahu, em outubro| Foto: EFE/Sara Gómez Armas

Benjamin Netanyahu fez tudo que podia para voltar ao poder. Depois de 12 anos como primeiro-ministro, colecionou inimigos e, em 2022, para conquistar o posto novamente, desenhos alianças com a extrema-direita e com os ultraortodoxos. Tudo isso em meio a denúncias de corrupção contra Bibi, como é popularmente conhecido no país.

Para agradar os novos aliados e, ao mesmo tempo, fugir das consequências dos julgamentos contra si, Netanyahu começou o governo à milhão, com propostas que excluem minorias, tornam o Estado mais religioso e ortodoxo e, o mais preocupante, menos democrático.

Logo no início do governo Netanyahu, o novo ministro da Justiça de Israel, Yariv Levin, propôs um projeto de lei cujo objetivo é evidente: enfraquecer o Judiciário. O principal ponto sobre essa reforma é o chamado “parágrafo de superação”. A mudança proposta permitiria que 50%+1 do parlamento poderia derrubar decisões da Suprema Corte.

A ideia de Netanyahu é que a maioria dos que escolhem os juízes sejam políticos, isto é, a coalizão que está no poder apontaria nomes para o Judiciário.

Na prática, essa alteração reduziria a atuação justamente do principal poder que contrapõe o Executivo e o Legislativo, dado que, em Israel, são praticamente a mesma coisa. Isso porque o primeiro-ministro e os ministros estão no parlamento, eles legislam e executam. Assim, os poderes se confundem. O único poder que faz funcionar o sistema de freios e contrapesos, tão importante em uma democracia, é o Judiciário.

Um agravante da proposta do “parágrafo de superação” é que, no sistema israelense, um governo só pode ser formado quando a coalizão tem ao menos 61 cadeiras. Assim, qualquer governo conseguiria derrubar decisões da Suprema Corte.

A proposta da reforma também prevê uma mudança no comitê que aponta novos membros para a corte. A ideia de Netanyahu é que a maioria dos que escolhem os juízes sejam políticos, isto é, a coalizão que está no poder apontaria nomes para o Judiciário. Trata-se de mais um ponto preocupante que se soma ainda à sugestão de findar com o ponto de “razoabilidade” para se posicionar a favor ou contra leis aprovadas pela Knesset, parlamento israelense. A ideia de Bibi é que esse argumento deixe de existir. Tudo isso em um país onde não há constituição.

Para avançar com a proposta dessa reforma, o ministro da Justiça israelense, Yariv Levin, alega que a possibilidade de a Suprema Corte frear ações do Executivo diminui a governabilidade de Israel. O argumento, contudo, é apenas um pano de fundo para um interesse maior de Netanyahu, que é de minar o Judiciário, uma vez que ele é acusado de corrupção e alvo de processos.

Diante do contexto, é fundamental alertar sobre o risco que a democracia israelense corre, caso a reforma avance. A Suprema Corte tem um papel fundamental de defesa das minorias em Israel. O Judiciário é responsável, por exemplo, por garantir direitos dos ultraortodoxos, mas também da população LGBTQIA+, dos etíopes e outros grupos minorizados. Em um governo como de Netanyahu, com membros ultraortodoxos, contrários aos direitos da população LGBTQIA+, importantes conquistas viabilizadas pelo Judiciário podem ser derrubadas. Outro ponto é o fim do sistema de freios e contrapesos. Sem o poder do Judiciário, o poder do Executivo seria praticamente ilimitado.

A sociedade civil israelense rapidamente percebeu o risco que a democracia corre. O país tem se mobilizado e grandes manifestações ocorreram recentemente em várias cidades, em especial em Tel Aviv, com mais de 100 mil pessoas nas ruas, para protestar contra a proposta de reforma de Netanyahu. Em cidades como Jerusalém e Haifa, israelenses também se manifestaram, sempre com a mesma demanda: a manutenção da democracia israelense.

Apesar do número relevante de manifestantes, Netanyahu não tinha sido acuado pelo barulho feito pela sociedade. Isso mudou quando os protestos começaram a aparecer também no setor econômico. Economistas importantes do país fizeram um abaixo-assinado contra a reforma do Judiciário, a favor da democracia israelense. O presidente do Banco Central de Israel, Amir Yaron, indicado pelo próprio Netanyahu, além de pessoas da indústria high tech e soldados do Exército nacional também se manifestaram.

No Fórum Econômico de Davos, realizado no início do ano, Amir Yaron foi alertado de que o enfraquecimento do Judiciário israelense pode levar ao rebaixamento da nota de agências de classificação de risco, o que tende a diminuir o investimento internacional em Israel. Tal acontecimento poderia derrubar a popularidade de Benjamin Netanyahu, o que preocupa o primeiro-ministro.

Forças internacionais também alertaram o primeiro-ministro de Israel que, se a proposta andar, o país ficará isolado. Bibi esteve na França, onde ouviu recados de Emmanuel Macron sobre a importância de manter a democracia forte. Antony Blinken, secretário de Estado dos Estados Unidos, esteve em Israel e também alertou Netanyahu sobre os perigos que o país sofre ao mexer com o Estado democrático de direito.

O cenário de fato preocupa toda a sociedade civil israelense. As mobilizações seguem e, diante de tantos pontos de atenção expostos na proposta dessa polêmica reforma, o que fica é o alerta para que a democracia israelense siga plena, forte e preservada.

 Anita Efraim, jornalista, é mestre em Comunicação Política pela Universidad de Chile e coordenadora de comunicação do Instituto Brasil-Israel.

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