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A decisão da terceira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) coloca em questão a presença do pai na criação dos filhos, para além da presença financeira ou física. A procedência da acusação de "abandono afetivo" sugere que o Judiciário brasileiro está atento às configurações e implicações do papel de uma família no desenvolvimento de seus membros. Nas palavras da ministra do STJ Nancy Andrighi, os pais têm a obrigação de "fornecer apoio para a formação psicológica dos filhos".

A criação de uma criança é historicamente atribuída à figura materna. No caso julgado pelo STJ, o pai contribuiu financeiramente durante o período de infância e adolescência de sua filha, relegando à mãe o compromisso de ser a única referência afetiva para a criança. Entretanto, o papel do pai no desenvolvimento de um filho não pode ser subestimado, como se observa usualmente em nossa sociedade. O caso de abandono afetivo em tela, julgado pelo STJ, é diferente do de uma criança órfã de pai, mas sim de uma criança que conheceu o pai, solicitou sua presença em diversos momentos da vida e não a obteve.

A indenização proposta pelo STJ nos parece não ter a intenção de ser um reparador para a ausência paterna no desenvolvimento do sujeito – uma vez que afeto não se compra – mas estabelece, pela via da Justiça, um limite para a omissão. Notadamente, num contexto histórico, a presença da figura materna é mais frequentemente levada em conta em decisões judiciais.

O argumento utilizado para o pedido de recurso no caso em pauta foi o de que a mãe da proponente do processo impedia o acesso do pai à criança, por mais que este fizesse tentativas, podendo configurar um caso de alienação parental, no qual o rompimento da relação conjugal traz a dificuldade de separar as questões conjugais das parentais: um genitor exclui o outro da vida do filho, colocando-se como o único protetor, em busca de promover o enfraquecimento do vínculo afetivo entre os filhos e o outro genitor. Neste contexto relacional, um dos pais denigre a imagem do outro, acusando, culpabilizando e levando a criança a construir uma visão negativa desproporcional e não condizente com a realidade.

Destaca-se que os fatos e intercorrências da dinâmica familiar nos são desconhecidos e, portanto, é possível falar apenas com base nas informações fornecidas pela mídia e pelas publicações do STJ, de modo que os comentários são de cunho genérico, partindo de fundamentos gerais no que tange à psicodinâmica relacional de família.

A decisão do STJ possui uma visão contemporânea diante das responsabilidades e do papel da família, enfatizando a premissa de que a criação dos filhos não é responsabilidade e dever apenas da mãe e destacando a importância da presença física e afetiva de ambos os genitores para o desenvolvimento de uma criança.

Cleia Oliveira Cunha e Terezinha Kulka são psicólogas; Flávio Voigt Komonski é estudante de Psicologia.

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