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Estão em fase de discussão pública dois interessantes projetos de legislativos, a nova lei de direitos autorais e o marco civil regulatório da internet, que podem trazer uma abordagem mais moderna para discussões dessa natureza

Imagine um serviço criado para o compartilhamento na internet de conteúdos multimídia fornecidos pelos próprios usuários, suponha ainda que uma parte significativa desses conteúdos viola direitos autorais de grandes conglomerados da mídia, por fim imagine que esse serviço se torna um dos mais relevantes da internet em termos de audiência formada substancialmente por pessoas interessadas em conteúdos "pirateados" e por conta disso fatura milhões em publicidade.

Parece-nos apenas uma questão de tempo para que tal serviço seja descontinuado pela Justiça em nome da tutela dos direitos autorais. Foi assim com o Napster, foi assim com o Pirate Bay, mas não foi assim com o YouTube no recente julgamento da corte de Nova York no caso movido pela Viacom versus o Google e o YouTube. Por que será que ao contrário de outros o YouTube é um "porto seguro"?

A resposta está na lei americana especificamente criada para combater a pirataria na internet conhecida pela sigla DMCA (Digital Millennium Copyright Act), que permite que um prestador de serviços tenha sua responsabilidade limitada (safe harbor) caso consiga atender algumas exigências da lei americana como, por exemplo: (a) remover conteúdos infrativos prontamente assim que tomar conhecimento ou quando propriamente notificado, (b) não obter vantagem financeira atribuível diretamente à violação de direitos e (c) manter um agente de propriedade industrial especialmente designado para receber e encaminhar as reclamações recebidas.

Quando obedecidas essas exigências o prestador de serviços na internet não é responsável pela conduta de seus usuários e tampouco é obrigado a agir proativamente vasculhando o conteúdo do seu serviço atrás de violações de direitos.

Em meados do século 17 não existia muita diferença na atuação de corsários e piratas, exceto que os primeiros agiam com a permissão de um Estado. Tais permissões foram abolidas pela Declaração de Paris, em 1856, e, por incrível que pareça, os Estados Unidos nunca ratificaram esta declaração.

No Brasil, talvez, a resposta do Poder Judiciário fosse bem diferente. Como não temos nenhuma lei sequer semelhante ao DMCA, poderia uma eventual ação ser julgada em desfavor do YouTube considerando-o objetivamente responsável por todos os danos causados por força da aplicação da teoria do risco (art. 927 § 1.º do Código Civil), segundo a qual existe obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Estão em fase de discussão pública dois interessantes projetos de legislativos, a nova lei de direitos autorais e o marco civil regulatório da internet, que podem trazer uma abordagem mais moderna para discussões dessa natureza. Por certo, a questão da proteção dos direitos autorais, da propriedade intelectual como um todo, é um dos temas de maior relevância no Direito da sociedade do conhecimento, visto que não podemos presumir que sem a mesma continuaremos inovando.

A não proteção do inventor, do autor, é um golpe direto na sociedade do intangível. Claro que há novos modelos de produção, inclusive envolvendo colaboração em massa. Assim como há novos modelos de oferta e distribuição de conteúdos. Mas qualquer solução extremista pode sabotar, sucatear as próximas gerações que serão cada vez mais dependentes de informação.

Patricia Peck Pinheiro e Luiz Henrique Souza são advogados especialistas em Direito Digital. www.pppadvogados.com.br

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