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| Foto: Karen Bleier/AFP

A valorização da criptomoeda, o Bitcoin, que pela primeira vez vale mais que uma onça de ouro, chamou a atenção da sociedade. Em 2 de março, a cotação do Bitcoin alcançou US$ 1.251,32, enquanto a onça de ouro custava US$ 1.233. A sobrevalorização do Bitcoin deve ser analisada à luz da transição de um sistema monetário internacional obsoleto, conhecido por “padrão dólar”, para um sistema híbrido. Este novo sistema tem sido marcado pela coexistência de múltiplas moedas, tais como as criadas pelos bancos centrais, mas também por organizações autônomas descentralizadas (OAD), como o Bitcoin.

Os setores econômicos estão com elevado nível de endividamento e menor capacidade para contrair novas dívidas para manter a produção e o consumo – e, consequentemente, o crescimento econômico. Apesar de todos os esforços dos bancos centrais, esse cenário tem afetado negativamente a rentabilidade e a confiança das instituições financeiras. Uma saída para os investidores tem sido a busca por ativos financeiros que lhes propiciem maior confiança e rentabilidade. A geração dos millennials, pessoas nascidas a partir de 1982, está cada vez mais propensa a usar serviços financeiros desacoplados das atuais instituições financeiras. Destaca-se ainda o aumento do conhecimento da sociedade sobre a forma nociva de criação da moeda pelos bancos centrais e do crédito bancário, via endividamento.

A sociedade está aberta para tal mudança? Qual será o impacto dessa tecnologia na política monetária?

Em meio a este contexto surgiu o Bitcoin, em 2008: uma nova forma de dinheiro, puramente digital e que não pode ser emitida por nenhum governo. O avanço das transações on-line tem contribuído para sua disseminação e aceitação como meio de troca, aspecto fundamental para qualquer moeda. O Bitcoin trouxe inovações para o sistema financeiro mundial, como: criação de uma criptomoeda, transparente quanto ao seu funcionamento; segurança contra fraudes; redução dos custos de transações; demonstração de que podemos ter acesso aos serviços financeiros sem intermediários. Mas a maior delas é a tecnologia blockchain, que pode ser comparada ao surgimento da internet.

O blockchain é um registro imutável de dados, por exemplo, de transações financeiras ou de outros dados que está armazenado em múltiplos servidores, ou seja, um registro descentralizado. O blockchain está recriando as instituições públicas e modelos de negócios. Enfim, traz consigo o potencial de revolucionar o modo como conhecemos o sistema financeiro. O blockchain é um código computacional, portanto, sujeito às limitações e às inovações da ciência da computação.

O código de base do blockchain do Bitcoin tem algumas limitações que já estão sendo superadas. Uma delas é o algoritmo chamado Prova de Trabalho (Proof of Work – PoW), que requer elevado esforço computacional para resolver “charadas” matemáticas, para provar que a pessoa realizou tarefas necessárias para a inserção de novos dados no blockchain, e receber novos Bitcoins. No início, essa tarefa era realizada usando um laptop comum; atualmente, isso não é possível. Em função do elevado esforço computacional, somente empresas detentoras de computadores sofisticados (e caros) é que têm melhores condições de resolver as “charadas” matemáticas. Este aspecto pode levar à centralização do acesso a novos Bitcoins.

O Bitcoin tem sido comparado ao ouro como reserva de valor, em função de sua segurança e confiabilidade, ou seja, o “ouro digital”. Entretanto, o verdadeiro valor aportado vai além da criptomoeda. Ele está no blockchain, porque está permitindo que as pessoas criem novas instituições e outras criptomoedas para solucionar problemas socioambientais. Enfim, essa tecnologia está criando uma nova estrutura institucional para solucionar problemas não resolvidos pelo sistema financeiro internacional, desencadeando um conjunto de inovações que revolucionarão esse sistema. Mas a sociedade está aberta para tal mudança? Qual o impacto dessa tecnologia na política monetária? Ou será que teremos apenas uma mudança de ambiente, do real para o virtual, sem resolver os problemas estruturais do sistema financeiro internacional?

Ranulfo Paiva Sobrinho, doutor em Desenvolvimento Econômico, é cofundador da Sustainability.School. Junior Garcia, doutor em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente, é professor do Departamento de Economia da UFPR.
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