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 | Marcos Oliveira/Agência Senado
| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

O Congresso Nacional se prepara para saltar da responsável aprovação do teto nos gastos públicos para a irresponsável aprovação do desvio de R$ 3,6 bilhões, com o objetivo de financiar as campanhas eleitorais no próximo ano. Um dia, preocupado, o povo assiste ao presidente da República dizer que o Brasil sofre a falência dos serviços públicos por falta de dinheiro; no outro, perplexo, descobre que haverá dinheiro para financiar campanha milionária: R$ 2 milhões para cada eleito – deputados federais e estaduais, governadores, presidente; R$ 30 por eleitor.

Ao assistir a esses dois fatos – falta de dinheiro para os serviços e dinheiro sobrando para as eleições –, o povo desacredita ainda mais de seus governantes, sobretudo depois do reconhecimento de um déficit de R$ 159 bilhões em 2017. A oposição também fica desacreditada ao tratar o povo como se ele não soubesse que este déficit foi provocado sobretudo pela irresponsabilidade de seu período no governo.

O Brasil não supera sua crise se seus dirigentes não derem o exemplo

Chega a ser cínica a afirmação de que este custo das eleições é pequeno, quando sabemos que seria suficiente para enfrentar as dificuldades da nossa ciência e tecnologia, por exemplo. Também é cinismo dizer que a democracia exige estes gastos, sem levar em conta que nossas eleições estão entre as mais caras do mundo; ou, ainda, ao dizerem que o recurso sairá das emendas de parlamentares, quando este dinheiro é pago pelo contribuinte e as emendas são dirigidas para atender necessidades da população. Graças ao teto dos gastos, o povo sabe que o dinheiro é curto e será tomado dele para financiar as campanhas, caracterizando uma corrupção nas prioridades.

É uma vergonha dizer que este gasto é necessário para fortalecer a democracia: não há democracia sem políticos com credibilidade e não há credibilidade em um parlamento cujos membros um dia aprovam um necessário teto de gastos, e no outro continuam fazendo uma das mais caras eleições do mundo, sem dar exemplos próprios de austeridade. O Congresso devia determinar medidas que reduzam o custo das campanhas, e que elas sejam financiadas pelos filiados e simpatizantes dos partidos e dos candidatos.

Leia também:Feições de um Congresso ilegítimo (artigo de Sebastião Ventura, publicado em 23 de agosto de 2017)

Leia também:Batalha de prioridades (editorial de 7 de agosto de 2017)

Além dos elevados gastos de campanha, o governo precisa dar exemplos: acabando com remunerações acima do já elevado teto salarial que equivalente a 35 vezes o salário mínimo do trabalhador; precisa determinar que nenhum de seus dirigentes acumule salários, como aposentadorias; acabar com mordomias e subsídios pessoais. São gestos que têm pouco impacto fiscal, mas um imenso impacto moral.

O Brasil não supera sua crise se seus dirigentes não derem o exemplo. E os políticos estão na contramão ao apresentar uma proposta de reforma política que, além de piorar o maldito sistema atual, desvia recursos públicos para campanha eleitoral.

Pior que o déficit fiscal é o déficit moral. E esta reforma eleitoral está ampliando essa escassez e comprometendo nossa democracia, no lugar de fortalecê-la.

Cristovam Buarque é senador pelo PPS-DF e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).
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