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Artigo

Os carros de praça

Até os anos 70, nas principais praças públicas da cidade havia locais onde, abaixo de uma singela estrutura de madeira coberta, os chauffeurs, proprietários de seus carros pretos brilhantes, conversavam entre si e aguardavam pelo toque agudo da campainha do telefone do ponto. A organização e o respeito eram tais que ninguém furava a fila ou parava em local que não estivesse autorizado. A cidade cresceu, as distâncias aumentaram e parece até que o tique-taque dos relógios acelerou. Enfim, estamos todos sempre atrasados para chegar a algum lugar e, diante dessa costumeira situação, buscamos um meio de deslocamento mais rápido, confortável e seguro.

Aqui começa a indecisão da escolha: automóvel próprio, transporte coletivo ou táxi? Seja qual for a escolha, sempre teremos de decidir entre os atributos do custo, da segurança, do tempo de deslocamento e da disponibilidade. Diante de um trânsito urbano cada vez mais caótico e lento, de um transporte coletivo que é polêmico desde a forma dos contratos até o valor da tarifa, e do próprio estresse que começa na lentidão do deslocamento e se amplia na busca de locais para se estacionar no destino, surge, como oportuna alternativa, a opção de "chamarmos um táxi".

Doce ilusão! Dependendo do horário, da condição do clima ou de outras condicionantes que desconhecemos, não teremos a resposta rápida pretendida. Por vezes, nem mesmo as centrais de chamada atendem; em outras, se respondermos que o pagamento será com cartão de crédito ou talão pré-pago, pior ainda.

Qual o possível motivo das falhas de atendimento? Resposta óbvia: a falta de oferta para suprir a demanda! Quem regula isso? A prefeitura e a Câmara Municipal. Qual o interesse em limitar a expansão das autorizações desse serviço de grande demanda comprovada? Em outras capitais brasileiras e em grandes cidades estrangeiras, há uma relação da ordem de um táxi para cada 300 habitantes. Em Curitiba, essa oferta é de pelo menos a metade.

Não entrando no mérito dos motivos desta situação, destaca-se que, se houvesse uma maior disponibilidade desse serviço, muitos problemas seriam minimizados: teríamos menos carros particulares circulando, com a consequente diminuição da lentidão do trânsito; teríamos uma importante alternativa de transporte urbano oferecida de forma eficiente, e até com preços mais módicos como consequência da maior oferta; e ainda diminuiríamos as emissões atmosféricas de gases poluentes.

Mas esse sonho de eficiência de transporte passa por pesquisa e planejamento prévios. Aliás, não são estas as atribuições do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc)? Ordenar o crescimento urbano, criar soluções integradas, articular políticas setoriais e tantas outras ações sob a égide da prefeitura? Será que a decisão de ampliar a frota autorizada em apenas mais 750 veículos foi fundamentada em uma pesquisa de opinião pública ou em algum estudo de planejamento, ou terá sido consequência de forças ocultas que pretendem manter um reduzido número de permissões para o benefício dos atuais detentores das placas autorizadas?

Todas essas questões deveriam ser respondidas e modificadas as políticas restritivas, de forma a se garantir uma maior oferta dos "carros de praça" para a população. O interesse coletivo deve sempre ser prioritário ao benefício de poucos que tentam manter a exclusividade da prestação deste serviço.

Eduardo Ratton é professor titular de Transportes da UFPR.

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