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Foi aprovado no Senado Federal projeto de lei que visa criar um instrumento de repatriação de ativos (recursos, bens ou direitos) de origem lícita, mantidos no exterior e que não foram, ao seu tempo, devidamente declarados ao fisco. Por meio da instituição do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), o governo federal estaria disposto a “perdoar” os crimes contra a ordem tributária, como o de sonegação fiscal e os que sejam dele decorrentes, como a evasão de divisas, criando uma oportunidade para aqueles que estejam nessa condição e que efetivamente regularizem sua situação.

Segundo a exposição de motivos do projeto de lei, estima-se que aproximadamente US$ 400 bilhões, pertencentes a contribuintes brasileiros, estariam no exterior de forma irregular. Com certeza um valor bastante expressivo. Como contrapartida à extinção da punibilidade, o projeto de lei prevê o recolhimento do Imposto de Renda incidente sobre o valor dos ativos objetos da repatriação, à alíquota de 15%, além de multa de 100% do valor do imposto pago. Com esse sistema, imagina-se arrecadar algo em torno de R$ 150 bilhões. Seria com certeza um grande alívio aos combalidos cofres da União.

Há uma tendência mundial voltada a intensificar o controle sobre ativos no estrangeiro

Do ponto de vista financeiro, não há dúvida de que, para a União, isso seria um grande reforço de caixa para enfrentar um 2016 que promete ser de grandes dificuldades. Muito embora o projeto de lei preveja que os recursos que são objeto da repatriação devam ter origem lícita, existe uma grande preocupação de que o regime não sirva como porta de entrada ao reingresso de recursos de origem ilícita, agora com a chancela do Estado. Um aspecto positivo em relação a isso é que o texto do projeto aprovado pela Câmara dos Deputados prevê que não poderão fazer uso do presente regime detentores de cargos, empregos e funções públicas de direção ou eletivas, nem mesmo cônjuges e parentes até segundo grau e por adoção.

Apesar de controverso, ao que parece o projeto possui aspectos positivos. Há uma tendência mundial voltada a intensificar o controle sobre ativos no estrangeiro. Esse projeto de lei cria uma oportunidade única para que, dentro do prazo fixado pela lei (210 dias a partir de ato da Receita Federal que regulamente o regime), o cidadão acerte as suas contas com a Receita Federal. Portanto, aqueles que por algum motivo nunca declararam valores mantidos no exterior e, considerando que a origem desses recursos decorra de uma operação lícita, terão a oportunidade de regularizar sua situação no Brasil. De outra sorte, aquilo que não puder regressar ao país através do RERCT terá fortes indícios de irregularidades na sua origem. De se mencionar que muitos países vêm celebrando acordos de colaboração com vistas a dificultar ao máximo a manutenção de recursos ilícitos em instituições financeiras, inclusive com imputação de responsabilidade criminal àquelas que façam vistas grossas a tal situação.

Nesse sentido, o projeto deve ser analisado sob dois prismas. No que tange ao aspecto tributário, não há dúvidas de que o assunto é relevante e positivo tanto ao governo quanto aos contribuintes, que terão oportunidade ímpar para regularizar a sua situação com as autoridades fiscais. Em relação ao aspecto penal, o Estado deverá criar mecanismos eficientes para, com a devida cautela e austeridade, evitar que esse repatriamento seja uma possibilidade de legalização de crimes cometidos, que não exclusivamente fiscais e cambiais.

Hugo José Sellmer é advogado tributarista.
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