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| Foto: Karen Bleier/AFP

O Japão se tornou, em 2017, o maior mercado de câmbio de Bitcoin, superando a China e os Estados Unidos. O avanço da diversificação da economia monetária japonesa não está relacionado apenas ao declínio do mercado chinês, mas à regulamentação do mercado. Em maio de 2016, o Gabinete do Japão aprovou uma série de ações que concederam ao Bitcoin e outras moedas virtuais o status de dinheiro, ou seja, abrindo espaço para sua circulação em paridade com a moeda oficial, o iene. Essa medida contribuiu para aumentar a aceitação do Bitcoin e outras moedas digitais no mercado monetário e financeiro japonês. A BitFyer, bolsa japonesa de Bitcoin, aumentou o volume negociado, alcançando um volume diário superior a US$ 80 milhões. Em uma economia amparada na confiança institucional, a ausência de regulamentação das moedas digitais afetava sua aceitação.

Outra importante mudança institucional foi o reconhecimento do Bitcoin como meio de pagamento oficial a partir de 1.º de abril de 2017. O fato de o governo japonês reconhecer o Bitcoin como um meio oficial de pagamento pode ser uma evidência de que importantes mudanças estão em curso no mercado monetário e financeiro mundial. Claro que essa decisão também foi influenciada pela ação das pessoas que já estavam aceitando a criptomoeda mesmo antes de o governo aceitá-la. Mas o grande avanço é que a população agora tem o direito e o poder para escolher quais tipos de dinheiro usar em seu dia-a-dia.

O dinheiro que usamos diariamente é criado a partir de endividamento; com o Bitcoin não é assim

Os japoneses têm acesso a dois tipos de dinheiro criados de forma totalmente distintas, o que aumenta a resiliência da sua economia. O iene é criado pelo Banco Central do Japão toda vez que ele compra algo, principalmente títulos de dívida do governo japonês ou de empresas governamentais. Os demais bancos comerciais também criam o iene quando algum cliente se endivida no sistema bancário. Isso significa que o dinheiro que usamos diariamente é criado a partir de endividamento. Esse processo trata-se simplesmente de registros numéricos que, quando necessário, são transformados pelo banco central em moeda ou dinheiro. O Bitcoin não é criado via endividamento, mas quando algum participante do sistema resolve uma charada matemática, o que lhe permite inserir dados no blockchain.

O fato de o Japão ser a primeira economia no mundo a aceitar oficialmente uma criptomoeda como meio oficial de pagamento não é surpresa. Desde que a bolha econômica japonesa estourou em 1990, causando sérios problemas sociais para seus cidadãos, o governo e a sociedade organizada iniciaram uma série de experiências usando outros tipos de dinheiro para solucionar problemas ambientais e sociais.

Aqui no Brasil, a maioria dos brasileiros nem sequer pensa que tem o direito de escolher qual tipo de dinheiro pode usar como meio de pagamento. No Japão e outros países, as pessoas aceitam o Bitcoin porque confiam na segurança de seu sistema, e em função de seu elevado preço, sua cotação no mercado de câmbio. Isso é diferente de aceitar um tipo de dinheiro às cegas, como ocorre no Brasil e outros países, onde a maioria das pessoas desconhecem que são obrigadas a aceitar o dinheiro do governo, que apenas tem beneficiado o negócio dos bancos autorizados a criar moeda. E, em um país cujos juros são elevados, o resultado tem sido o aumento das desigualdades. Apesar da crise que assola o Brasil, o setor bancário registra lucros bilionários, enquanto o desemprego afeta 13 milhões de famílias.

A atual crise abre espaço para que os brasileiros exijam mais liberdade no mercado monetário e financeiro, e possam se livrar dos escandalosos juros do mercado de crédito. A sociedade não deve ser escrava de um sistema que nos obriga a aceitar um único tipo de dinheiro lastreado pelo endividamento e pela incidência de elevadas taxas de juros. Quando a sociedade brasileira vai acordar e ver que o século 21 já começou há quase duas décadas?

Ranulfo Paiva Sobrinho é doutor em Desenvolvimento Econômico e cofundador da Sustainability School. Junior Garcia, doutor em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente, é professor do Departamento de Economia da UFPR.
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