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Passou da hora de enquadrar crime organizado como terrorismo

O controle do crime organizado no Brasil é o mais amplo entre 18 países na América Latina, incluindo alguns bastante conhecidos pela violência armada dos grupos criminosos, como México e El Salvador.
O controle do crime organizado no Brasil é o mais amplo entre 18 países na América Latina, incluindo alguns bastante conhecidos pela violência armada dos grupos criminosos, como México e El Salvador. (Foto: Imagem criada utilizando Whisk/Gazeta do Povo)

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A violência tornou-se parte do nosso cotidiano. Todos os dias assistimos, pela imprensa e pelas redes sociais, cenas de assaltos, assassinatos e brigas entre facções criminosas que fazem centenas de vítimas. E o pior: aquilo que antes deveria deixar a população estupefata e indignada passou a ser visto apenas como episódios lamentáveis, mas corriqueiros do nosso dia a dia.

Uma recente pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, publicada no dia 16 de outubro do corrente ano, demonstrou que facções criminosas e milícias estão cada vez mais presentes em nosso território, passando a fazer parte da convivência de cerca de 20% da população brasileira, ou seja, aproximadamente 30 milhões de pessoas.

Embora nossa legislação não enquadre essas organizações como terroristas, entendo que já passou da hora de ampliarmos esse conceito, adequando-o às práticas empregadas pelo crime organizado, o que facilitaria uma atuação estatal mais contundente

O aumento da criminalidade é de tamanha envergadura que, segundo a mesma pesquisa, em 2024 o índice era de 14%, o que significa um crescimento expressivo em apenas um ano. Em outras palavras, um em cada cinco brasileiros vive em áreas nas quais o crime organizado está evidentemente presente.

Não restam dúvidas de que essa convivência ocorre, sobretudo, entre a população mais carente – nos morros cariocas, nas favelas das grandes capitais, hoje chamadas de “comunidades”. A maioria dos que lá residem são trabalhadores, pessoas de menor poder aquisitivo, mas que vivem reféns da criminalidade e das leis impostas pelas facções.

Apesar dos dados estarrecedores, que apenas confirmam o que a população já sabe, o governo parece fazer “vista grossa”, evitando um enfrentamento direto e firme contra o crime organizado.

O jornal O Globo, em matéria publicada no dia 28 de outubro de 2024, revelou que barricadas do tráfico e das milícias se multiplicaram, tomando favelas e bairros cariocas – chegando, inclusive, a aparecer nos mapas de aplicativos, tudo com o intuito de dificultar a entrada das forças policiais e, consequentemente, do Estado. Os armamentos utilizados pelas facções são de altíssimo poder bélico: rifles, metralhadoras, fuzis .50 – capazes de derrubar aeronaves de asa rotativa (helicópteros).

Com o objetivo de lavar o dinheiro oriundo do tráfico de entorpecentes, segundo reportagem da BBC News publicada em 28 de agosto de 2025, o PCC (Primeiro Comando da Capital) utilizou fundos de investimento e empresas financeiras sediadas na famosa Avenida Faria Lima, em São Paulo, movimentando a impressionante quantia de R$ 42 bilhões em apenas quatro anos (2020 a 2024). Todos esses dados alarmantes demonstram que o Brasil está negligenciando a segurança de seus cidadãos, permitindo que facções criminosas ocupem cada vez mais espaço na sociedade.

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Embora nossa legislação não enquadre essas organizações como terroristas, entendo que já passou da hora de ampliarmos esse conceito, adequando-o às práticas empregadas pelo crime organizado, o que facilitaria uma atuação estatal mais contundente e eficaz. O discurso de que é preciso “atacar a causa e não o efeito” da criminalidade é bonito, mas, nas atuais circunstâncias, mostra-se falacioso. A verdade é que o efeito já atingiu tamanha proporção que, se não o enfrentarmos e o eliminarmos, não haverá sequer como tratar das causas.

Não se pode perder de vista que a população mais carente é a que realmente vive refém das facções, alijada da segurança estatal e sem perspectiva de proteção efetiva. Hoje, conforme a pesquisa do Datafolha, 20% da população convivem em ambientes dominados pelo crime organizado; amanhã, se medidas drásticas não forem tomadas, esse percentual tende a aumentar. Ou o governo ocupa seu lugar e enfrenta o crime organizado, ou o crime organizado tomará conta do país. Dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço.

Bady Curi Neto, advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) e professor universitário

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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