Há duas semanas do início da Copa do Mundo, com a Seleção Brasileira instalada e trancafiada na concentração na tranqüila e deslumbrante Weggis, na Suíça, para reencontrar o entrosamento e a forma física nos treinos com bola, sob a vigilância de milhares de jornalistas de todo o mundo que registram, descrevem, analisam e especulam sobre cada suspiro do Ronaldinho Gaúcho, acredito que seja um bom conselho aproveitar a folga, mergulhar de cabeça nas esperanças do sexto título e conceder férias a mais tediosa pré-campanha eleitoral desde os quase 21 anos da ditadura militar, quando os candidatos eram escolhidos e eleitos pelos generais.
Até a decisão do título, com a evidente participação da turma do Parreira, a campanha eleitoral talvez engrene, o presidente-candidato encerre a palhaçada de picadeiro de que não sabe se será ou não candidato e viaja todos os dias, discursa todas as horas para inaugurar obras, lançar novos projetos e cobrar o reconhecimento do voto para a reeleição do "melhor governo que este país teve" e, com mais tempo para esfriar a cuca, reduza o índice recordista de tolices e absurdos.
Estamos realmente necessitados de uma reformulação da campanha antes que a frustração popular ocupe as ruas e escancare a porteira para uma recaída na insensatez. A baixa escolaridade e a ojeriza aos livros, cursos e diplomas do presidente não justificam as bobagens penduradas nos seus improvisos. São pérolas diárias, algumas em dose dupla. A propósito, mais uma para o álbum: ao anunciar a liberação de R$ 1,33 bilhão para 33 projetos na área de saneamento básico em 11 estados e no Distrito Federal, em vez de aproveitar a oportunidade para justificar o atraso de 3 anos e quase cinco meses do mandato, cedeu à vaidade de ensinar ao auditório bem comportado de Brasília conceitos da sabedoria e da experiência. Escorregou no quiabo: "Precisamos priorizar os grandes centros urbanos porque é lá que a população ficou muito concentrada" coisa que ninguém sabia nem desconfiava.
Lula continua favorito absoluto nas pesquisas, sustentado pela sua esperteza de ética torta de aproveitar todos os privilégios do cargo para a campanha em tempo integral, mascarada pela grosseira desculpa de que não sabe como será o seu dia de amanhã.
Mas, se o decoro sai amarfanhado como brinquedo na mão de criança, reconheça-se que conhece o ofício nos muitos anos de aprendizagem e quatro campanhas como candidato a presidente, e esbanja o carisma de líder sindical e a facilidade do improviso, especialmente nos comícios com grande assistência.
E, até aqui, antes da Copa, com o auxílio inestimável da oposição. O ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, não conseguiu sair do chão. Patina no discurso chocho, sem garra nem impacto, girando ao redor de obviedades e repetindo críticas que não tocam o coração nem o bolso do eleitor. Aposta todas as fichas no horário de propaganda eleitoral, depois da Copa, na reta decisiva da massificação da campanha.
É a sua derradeira chance. Se não for abalroado no trajeto por um candidato lançado no buraco, sem nada a perder e com a dura eloqüência espalhafatosa do senador gaúcho Pedro Simon, nas cogitações do PMDB para grande desgosto da ala governista, que excomunga a verticalização, talismã contra a incoerência partidária com a liberação dos conchavos ao gosto de cada freguês estadual.
Até lá a perplexidade diante da incompetência na crítica ao presidente-candidato que se promove com o auto-elogio e não é cobrado pelo recorde nacional de corrupção e roubalheira com o dinheiro público, a inércia do maior ministério de todos os tempos, a falência da segurança pública com o sistema penitenciário sob o comando de facções criminosas; a rede rodoviária em pandarecos e a gatunagem metendo a munheca nas verbas para a tapeação do tapa-buracos; estradas bloqueadas pelos que plantam, afogados em dívidas; o MST ocupando estradas, saqueando caminhões, invadindo fazendas e humilhando a autoridade acuada e as filas de doentes, velhos, deficientes varando noites e madrugadas para não serem atendidos pelos hospitais públicos e postos de saúde.
A Copa começou: vamos dar férias à alma. Até a última gota de esperança é muito mais importante do que as trampas políticas, acompanhar a recuperação de Dida, Roberto Carlos, Cafu, Ronaldo; o ajuste do quarteto mágico; as pedaladas do Robinho e sonhar com os passes, os dribles, os gols, a alegria do futebol de Ronaldinho Gaúcho.



