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O Senado aprovou o reajuste nos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que passarão a ganhar R$ 46 mil a partir de 2025.
Sede do STF em Brasília.| Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF

Estamos vivendo novos tempos de extraordinário protagonismo da Justiça e, em especial, do Poder Judiciário. A crise política que o país recentemente atravessou permitiu criar um autêntico ineditismo histórico que projetou a Justiça brasileira, e o Poder Judiciário Federal em particular, a um novo patamar funcional, outorgando-lhes uma responsabilidade extremamente importante: prover a imprescindível estabilidade institucional ao país, em uma situação muito assemelhada a de um autêntico poder moderador, tal como exercido (outrora) pelo Exército Brasileiro.

Todavia, exatamente como ocorrera em diversos momentos da história nacional, tal peculiar encargo necessita estar obrigatoriamente associado a um atuar sereno e equilibrado, desprovido de paixões e vaidades, assim como daqueles antigos pecados que comprometeram, sobremaneira, a necessária lucidez inerente à atuação isenta e imparcial (e rigorosamente dentro da lei e da ordem constitucional) dos protagonistas do passado.

O que se pode (e se deve) fazer é criminalizar a conduta dos agentes públicos que se apropriam de suas respectivas posições para praticar delitos graves, independentemente de serem integrantes do Legislativo, Executivo ou Judiciário,

“Quando comecei a advogar, em 1957, o Poder Judiciário e o Ministério Público exerciam com competência e discrição suas funções, não buscando as luzes da ribalta e da admiração popular, com o que sempre foram extremamente respeitados”, lembra Ives Martins. Mas o atual estágio da democracia brasileira não permite e muito menos recomenda que a Justiça brasileira, como bem adverte o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli venha a cometer “os mesmos erros dos militares em 1964”, através de um “exagerado ativismo” e de uma perigosa tendência de “criminalizar a política” (ou a classe política) como um todo, até porque a mesma representa, em última análise, o fundamento e o alicerce da própria democracia.

O que se pode (e se deve) fazer, ao reverso, é criminalizar, correta e individualmente, a conduta dos agentes públicos que se apropriam de suas respectivas posições para praticar delitos graves, independentemente de serem integrantes dos Poderes Legislativo, Executivo ou Judiciário, ou mesmo do Ministério Público. Por conseguinte, conforme registrado por Toffoli, deve a Justiça se limitar a “resolver a crise de maneira pontual”, evitando, de todas as formas, conduzi-la a um condenável “totalitarismo do Judiciário e do Sistema Judicial”, fenômeno que, na ótica do ministro, dá-se através da eventual e criticável prática de se proferir “sentenças aditivas”.

De igual forma, merece ser destacado que a autoridade moral do Judiciário (e do Sistema Judicial como um todo) repousa, como bem anota José Murilo de Carvalho, na absoluta ausência “de espetáculos midiáticos por parte de delegados, promotores de Justiça e juízes”, sendo por demais conclusivo que, não obstante “o Poder Judiciário tenha se afirmado e ganhado força e credibilidade inéditas em nossa história, tal predicamento, também chamado de judicialização da política, só se sustentará se os operadores da Justiça mantiverem a necessária postura profissional, resistindo à tentação dos holofotes e de inaceitáveis incursões na política”.

Ou seja, “se eles se contiverem, em última análise, nas manifestações rigorosamente dentro dos autos”, como dever inerente a todos aqueles que nela militam, consoante preconizam, inclusive, o art. 36, III, da Lei Complementar 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), o art. 43, II, da Lei 8.625/93 (Lei Orgânica do Ministério Público) e, de certa forma, a partir de uma exegese ampliativa, o art. 2º, § 6º, da Lei 12.830/13 (relativa à investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia), dispositivos legais que impõem aos referidos operadores do Direito a indispensável e absoluta atuação técnico jurídica, normas que, a toda evidência, abrangem o dever de se abster de qualquer espécie de “holofotofilia”, mantendo, assim, o sagrado silêncio (exteriorizando, desta feita, o princípio da publicidade na sua correta e restrita forma de manifestação nos autos) em benefício último do próprio prestígio da Justiça.

Ademais, essa é a postura institucional dos países mais desenvolvidos do mundo, notadamente em relação aos membros da magistratura, como é o caso da Suprema Corte estadunidense. Como lembrou Linda Greenhouse, “temos muita sorte de os nossos membros da Suprema Corte (norte-americana e os juízes estadunidenses de modo geral) não falarem com a imprensa (...) É salutar que juízes só se manifestem por meio de suas decisões ou de seus livros”. Possam nossos juízes um dia seguir o exemplo dos americanos.

Reis Friede é professor emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) e da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Exército (EsAO), professor Honoris Causa da Escola de Comando e Estado-Maior da Aeronáutica (ECEMAR), membro da Sociedade Brasileira de Direito Aeroespacial (SBDA), da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED), do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) e da Academia Brasileira de Defesa (ABD). É coautor da obra “Das Novas Guerras (Fenomenologia dos Conflitos Armados)”.

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