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A crise do racionamento teve profundos impactos políticos e econômicos, nem todos eles adequadamente avaliados. Uma dessas consequências foi a fixação, no ambiente elétrico, da máxima “melhor sobrar do que faltar energia”. Desde então, a expansão do sistema elétrico tem sido conduzida de forma a evitar novos racionamentos, sem que seja dada a devida atenção à necessidade de ser preservada a competitividade econômica do abastecimento elétrico do país. O resultado daquela máxima é a queda acentuada do fator de carga do sistema elétrico brasileiro.

Mais de R$ 14 bilhões foram investidos desnecessariamente

Os leilões de energia têm sido regularmente conduzidos de forma a gerar expansão da capacidade instalada superior ao ritmo do consumo de energia. Dessa forma, a relação entre o consumo de energia e a capacidade instalada (fator de carga) vem caindo paulatinamente. É verdade que a característica hidrelétrica de nosso parque gerador exige um fator de carga próximo de 55% para atender as inevitáveis flutuações do funcionamento da máquina elétrica. Contudo, o fator de carga do sistema está atualmente em 49,2%, e ele vem caindo desde 2010.

Esse fator de carga indica que aproximadamente 6% dos investimentos realizados na expansão do parque gerador são desnecessários! Em termos financeiros, mais de R$ 14 bilhões foram investidos desnecessariamente. A má notícia é que, mesmo quando for iniciada a retomada do crescimento da economia (e, portanto, do consumo de energia), o fator de carga deverá continuar caindo, porque a expansão contratada nos leilões de energia supera o mais otimista cenário de crescimento nessa retomada.

Ciente dessa realidade, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) decidiu parar o despacho das centrais térmicas com custo operacional superior a R$ 600/MWh em agosto passado. Recentemente, o Ministério de Minas e Energia (MME) anunciou que pretende estender a parada do despacho para as centrais com custo operacional superior a R$ 400/MWh. Pelo menos 2 GW de capacidade instalada ficarão permanentemente ociosos após essa decisão. Os custos dessa ociosidade serão pagos pela sociedade.

A regulação da Aneel permite que as distribuidoras repassem para as tarifas elétricas até 5% da energia por elas contratada nos leilões de energia, ainda que não utilizada por seus consumidores. Dessa forma, a maior parte do ressarcimento dos custos dessa capacidade ociosa acabará saindo do bolso dos consumidores cativos das distribuidoras. Contudo, algumas distribuidoras anunciam que o repasse de 5% da energia não consumida para as tarifas não é suficiente. O consumo de energia está muito abaixo da energia contratada nos leilões. Paradoxalmente, a situação mais favorável dos reservatórios hidrelétricos anuncia que as bandeiras tarifárias terão de permanecer elevadas, desta vez para evitar o colapso financeiro das distribuidoras. Já se pode visualizar um novo entrevero judicial entre as distribuidoras e a Aneel no início de 2016.

Adilson de Oliveira é professor do Instituto de Economia e membro do Conselho Curador da UFRJ.
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