A preocupação com a crescente produção de resíduos radioativos e seu armazenamento seguro, longe da atividade humana, tem sido o grande desafio a ser vencido por esta importante tecnologia
Os recentes eventos acerca do acidente com a usina nuclear de Fukushima, no Japão, reacenderam um antigo debate sobre a segurança e viabilidade das usinas nucleares ao redor do mundo. Usinas termelétricas queimam combustíveis fósseis para aquecer água e gerar vapor que, por sua vez, faz com que uma turbina gire e produza eletricidade. Uma usina nuclear não difere muito da termelétrica em sua essência. O aquecimento da água é feito através de uma reação nuclear controlada de fissão atômica. Enquanto as usinas termoelétricas despejam na atmosfera uma grande quantidade de carbono, na forma de dióxido de carbono, as nucleares operam de forma não poluente. Ao contrário das usinas hidrelétricas, eólicas e solares, as usinas nucleares não sofrem interferência das variações climáticas, fator importante no planejamento energético de um país.
Nos países desenvolvidos, nos quais a demanda por energia é muito grande, as usinas nucleares fazem parte da matriz energética há mais de 40 anos. Somente os Estados Unidos possuem mais de 100 usinas nucleares ativas, representando, aproximadamente, 20% da sua produção de energia elétrica. Na França, cerca de 80 % da energia elétrica produzida no país vem das usinas nucleares. De acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica, mais de 60 países têm demonstrado interesse em saber como a energia nuclear pode ajudá-los a solucionar os problemas futuros devido à alta demanda energética. Especialmente nos países em desenvolvimento, o acesso à energia elétrica é fundamental para a redução do nível de pobreza, pois sem energia não há como sustentar a demanda crescente por saúde, educação, produção de alimentos e bens. No Brasil 76 % da energia elétrica é produzida por usinas hidroelétricas e apenas 3 % em usinas nucleares (Angra 1 e 2). A construção da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, em Angra dos Reis, tem desempenhado um papel mais estratégico na produção de capacidade técnica para o país do que produzir energia.
A tecnologia de geração de eletricidade por reatores nucleares tem se firmado como a melhor opção, com projetos cada vez mais seguros, para atender à grande demanda mundial por energia, contando ainda com crescente apoio de ambientalistas.
A decisão pela construção de uma usina nuclear não é um processo simples. O custo de construção de uma usina nuclear gira em torno de US$ 4 bilhões, levando cerca de dez anos para se criar a infraestrutura necessária. No entanto, uma vez construídas, as usinas nucleares são baratas de se manter. Embora a operação de uma usina nuclear seja limpa, o ciclo do combustível nuclear (extração enriquecimento - utilização na usina reciclagem armazenamento dos resíduos) é um processo poluidor e que também gera gases de efeito estufa. O principal alvo das críticas sobre as usinas nucleares, além da segurança, é justamente com relação à etapa final do ciclo do combustível nuclear: o armazenamento dos resíduos radioativos. Os resíduos radioativos finais que uma usina produz, mesmo depois de desligada ao final de sua vida útil, podem permanecer substancialmente ativos por pelo menos 300 anos. Piscinas para armazenamento de resíduos são normalmente construídas dentro das próprias usinas, porém quando se tem uma grande produção de resíduos, depósitos seguros para armazenamento definitivo são necessários, como por exemplo, depósitos geológicos ou oceânicos de grande profundidade.
O acidente radiológico de Goiânia, em 1987, no qual catadores de sucata desmontaram inadvertidamente um equipamento de radioterapia abandonado, foi uma amarga experiência vivida pelo governo brasileiro sobre a dificuldade de lidar com resíduos radioativos. A limpeza da área contaminada com cloreto de césio-137 produziu mais de 13 toneladas de lixo atômico que tiveram que ser cuidadosamente acondicionadas em 2.900 tambores, que emitirão radiação em níveis perigosos por pelo menos 180 anos. Para a estocagem desse lixo, foi construído no município de Abadia de Goiás um depósito em forma de vala, com 30 metros de profundidade, revestido de grossas paredes de concreto e chumbo e, sobre esta vala, foi erguida uma montanha de terra.
No mundo todo existem mais de 130 usinas nucleares ativas ou em construção com capacidade de geração acima 1 mil MW cada. A preocupação com a crescente produção de resíduos radioativos e seu armazenamento seguro, longe da atividade humana, tem sido o grande desafio a ser vencido por esta importante tecnologia.
Rogério Toniolo, doutor em Física pela UFPR, é professor de Física da PUCPR.



