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O presidente russo, Vladimir Putin, durante uma sessão anual de perguntas e respostas com transmissão ao vivo de televisão e rádio em toda a Rússia, em 2018.
O presidente russo, Vladimir Putin, durante uma sessão anual de perguntas e respostas com transmissão ao vivo de televisão e rádio em toda a Rússia, em 2018.| Foto: EFE/ EPA/MICHAEL KLIMENTYEV

Muito se tem ouvido falar em sanções econômicas internacionais, considerando o contexto de guerra entre Rússia e Ucrânia, que tirou o foco central até mesmo de assuntos que antes eram recorrentes nos noticiários, como a Covid-19. Mas sabemos realmente o poder das sanções econômicas internacionais e seus impactos em um nível globalizado? O que são elas e que efeito têm na economia mundial?

Muitos afirmam, de maneira simplista, que se trata de uma maneira de punir os países que não compactuam ou que não estão no eixo esperado, conforme regras previamente estabelecidas. Eu diria mais: elas têm um contexto histórico importantíssimo, com intuito de frear ações que possam demandar consequências catastróficas, ou seja, elas são muito mais que uma simples ferramenta política. No cenário bélico atual envolvendo Rússia e Ucrânia, será que o Ocidente está agindo de maneira correta e coerente ao aplicar tais sanções? Existe autonomia para essa aplicação?

Vejamos, em primeiro lugar, um contexto histórico: se voltarmos à definição e às considerações iniciais, as sanções econômicas internacionais consistem, também, em instrumento jurídico, destinado a combater atos contraditórios ao direito internacional, vinculado às ferramentas de cunho político, é verdade. Historicamente, possuem grande significância no pós-guerra, especificamente em 1945 e no fim do socialismo na União Soviética e no leste europeu, tendo como marco crucial a queda do Muro de Berlim, ocorrida em 1989, evidenciando o fim da guerra fria e da política internacional bipolar, que confrontava União Soviética e Estados Unidos. Surgiu um cenário de despolarização, com Estados nacionais interdependentes, através de uma regulação democrática, trazendo à tona o fortalecimento de organismos mediadores internacionais, como é o caso da ONU, agora protagonista do direito internacional, tendo por escopo garantir a paz e a segurança em caso dos indesejáveis conflitos, sobretudo aqueles responsáveis pela guerra.

Qualquer semelhança com os dias atuais não seria mera coincidência, não é mesmo? Dias atrás, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, emitiu um alerta de que a Rússia poderá usar armas químicas e pediu mais sanções, no intuito de bloquear a intenção e a ação do presidente russo, Vladimir Putin. Neste sentido, fica clara a evidência do caráter benéfico das sanções, em que pese a economia russa estar cada vez mais comprometida, cabendo ao seu chefe de Estado tomar as ações corretas para que seja possível sua imediata reconstrução.

Quanto ao aspecto prático no dia a dia das atividades econômicas nas instituições reguladas em âmbito internacional – sobretudo as financeiras, que avaliam as sanções em seus controles internos de compliance –, um bom exemplo a ser citado são as operações vinculadas à exportação, pois até as empresas responsáveis pelo transporte de mercadorias e produtos acabam afetadas. Um caso é o da navegação: os navios e os portos por onde eles passam são criteriosamente verificados, uma vez que, se no trajeto houver um porto de país sancionado, a operação simplesmente não será autorizada, tamanha a preocupação com o tema. Este é apenas um exemplo de como as sanções podem ter efeitos na economia de qualquer país.

Outro ponto que tem sido amplamente discutido nos últimos dias é o código Swift das operações, consistindo em uma forma de se identificar cada banco de maneira independente –  grosso modo, podemos defini-lo como se fosse uma forma de chave PIX internacional. No contexto da guerra atual, o principal objetivo está em isolar a Rússia como forma de pressão para que a guerra cesse. Aliás, grandes empresas também optaram por não fazer mais negócios com a Rússia, incluindo também aspectos culturais e ligados ao esporte. Isto sem falar nos protestos de determinados oligarcas que, sem dúvida, experimentam prejuízos inimagináveis.

Estas ações não devem ser encaradas como uma forma de travamento ou engessamento de importantes operações para a economia das nações, pensando em um contexto global, mas como medidas de segurança, capazes de criar um obstáculo, seja nos conflitos bélicos, como este a que hoje assistimos indignados, seja para impedir o acesso de condutas ilícitas em nosso convívio social – o financiamento ao terrorismo é um bom exemplo. Ressalte-se que também não se trata de “americanizar” o mundo, eis que a questão é muito mais abrangente. O Ocidente, ao tomar um posicionamento concreto, aplicando as sanções e, com elas, isolando economicamente o país sancionado (no caso, a Rússia), deixa evidente a necessidade de forçar que os ataques e a destruição em massa da Ucrânia cessem, eis que, em um primeiro momento, a Rússia anunciou que não atingiria civis, e sabemos que não foi isso que aconteceu.

Há, no entanto, o risco de um efeito reverso, em que Putin, acuado, aumente o grau dos ataques, por exemplo usando as armas químicas supracitadas. Aliás, quem deve operar junto com as sanções é o bom senso de ambos os lados. As sanções constituem poderosa ferramenta, seja política ou jurídica, em âmbito internacional, mas não devem ser encaradas como a única tábua de salvação de solução de conflitos, eis que elas compõem um conjunto com outras medidas que devem ser utilizadas com sabedoria a partir de ações concretas, tendo em vista as consequências globais experimentadas, sendo o aumento do preço dos combustíveis um bom exemplo.

Sob a ótica das boas práticas na governança é que facilmente visualizamos o elo entre as sanções econômicas internacionais e o compliance, especialmente quando pensamos em um nível globalizado. Aliás, instituições de todas as ordens, incluindo as econômicas, políticas, culturais e religiosas, entre outras, têm o mesmo propósito de manter a paz e a convivência com responsabilidade e dignidade, independentemente do espaço geográfico, ideologias e crenças.

Andrea Wiezbicki Strapasson é advogada, especialista em Compliance e em Direito e Processo Penal, membro da Comissão de Compliance da OAB/PR, professora universitária e palestrante.

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