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No Norte Novo e no Noroeste do estado, num curto período de 20 anos, nas décadas de 50 e 60 do século passado, uma imensa floresta subtropical foi posta abaixo, a machado e a fogo.

Se o exemplo de colonização adotado no estado do Paraná continuar a ser seguido na ocupação da Amazônia, como parece estar sendo, a resposta ao título deste artigo é não. Os governos do Paraná e da União foram omissos na fiscalização da reserva florestal nas terras devolutas estaduais e nas de faixa de fronteira, transferidas ao domínio privado. Mas não foram apenas os governantes os responsáveis pela devastação que pôs fim a mais de 95% das florestas nativas do território paranaense.

Na primeira metade do século 20, a indústria extrativista da madeira devastou uma enorme área de araucárias que cobria praticamente o Sul e o Sudoeste do estado. Os senhores das serrarias e das araucárias se limitaram a extrair e a serrar o que a natureza lhes oferecia, sem nenhuma preocupação com o reflorestamento.

No Norte Novo e no Noroeste do estado, num curto período de 20 anos, nas décadas de 50 e 60 do século passado, uma imensa floresta subtropical foi posta abaixo, a machado e a fogo, por pequenos, médios e grandes agricultores. As determinações legais no sentido de se preservar de 20 a 25% de cobertura florestal em cada propriedade foram inteiramente ignoradas. Tampouco foram mantidas as matas ciliares, proporcionalmente à largura de córregos e rios, como previsto no Código Florestal Brasileiro.

Mas esses péssimos exemplos não são exclusividade de nosso estado. Como diretor de recursos fundiários do Incra, reuni-me, em 1987, com alguns governadores da Amazônia e relatei-lhes a experiência negativa do Paraná, assinalando, ainda, que o tosco machado do agricultor paranaense fora substituído por modernos tratores, potentes cabos-de-aço e motoserra, de potencial destrutivo exponencialmente maior. Certamente não os sensibilizei, pois prosseguiram pensando ser a Floresta Amazônica inextinguível, infensa à ação do homem.

Reuni-me também com prefeitos de Santa Catarina que denunciavam estarem os sem-terra invadindo pequenas e médias propriedades, nos municípios de Rio Negrinho, Timbó e outros, e derrubando, para vender ou queimar, madeira explorada há dezenas de anos – e de forma sustentada – pela indústria moveleira local.

Não exerço atualmente qualquer cargo ou função pública, mas tenho acompanhado pela imprensa as notícias sobre a ação ou inação governamental na Amazônia e o processo continuado de sua devastação, ora com recuos (tímidos) ora com avanços (preocupantes). Leio que um governador vinculado ao meio agrícola, grande plantador de soja, continua pensando como os governadores de 1987, e que os agricultores já assentados pelo Incra, e os que ainda não o foram, os sem-terra (em áreas de invasão), são igualmente grandes devastadores da Floresta Amazônica.

Esses fatos, do passado e do presente, envolvendo autoridades públicas e representantes de segmentos sociais tão díspares, ideológica e politicamente antagônicos – para ficarmos apenas nesses dois exemplos extremos –, nos trazem, sem dúvida, grandes perplexidades e pessimismo.

Apesar disso, e independentemente do que outros povos fizeram ou deixaram de fazer para preservar o meio ambiente, é necessário que o governo brasileiro não prossiga repetindo na Amazônia os mesmos erros já praticados por diversas nações, pelo estado do Paraná e por outros estados brasileiros no processo de colonização de seus territórios.

Pois, neste momento em que o aquecimento global parece inevitável, nós brasileiros nos vemos confrontados com a nua e crua realidade de sermos ou não capazes de manter a Floresta Amazônica íntegra, de honrar nosso compromisso natural com a humanidade toda no sentido de preservar o seu bem mais precioso: o planeta Terra.

É evidente que o sucesso ou fracasso desse desafio que nos é colocado não envolve a soberania do Estado brasileiro sobre a Amazônia. Aliás, o conceito de soberania nacional, como a história dos povos tem demonstrado, não contempla o princípio da preservação ambiental como fator determinante para manutenção ou perda de território. Se contemplasse, hoje grandes nações desenvolvidas ou em franco processo de desenvolvimento teriam que ser inteiramente despojadas de seus territórios.

Antenor Ribeiro Bonfim é advogado. Foi diretor de Recursos Fundiários do Incra e diretor de Terras do Instituto de Terras, Cartografia e Floresta do Paraná.

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