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| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Nesta semana, quem perguntou aos policiais militares do Brasil o que eles pensavam sobre os eventos em Vitória (ES) provavelmente ouviu como resposta a expressão “é um aviso”, e a explicação: “o que acontece ali pode se espalhar por todo o país”; e ainda: “não podemos aceitar o atraso de salários, nem a perda de direitos em nossas aposentadorias”.

Para eles, foi lembrado que, diante do esgotamento das finanças estatais, do aumento na esperança de vida e da queda na taxa de natalidade, não é mais possível manter antigos direitos que se transformam em privilégios dos adultos de hoje contra os brasileiros do futuro. Mas o parlamentar que lembrou isto aos PMs ouviu uma sugestão: “cortem primeiro os privilégios dos parlamentares, juízes e altos funcionários, os altos salários, o valor das verbas indenizatórias, carro oficial, seguro de saúde ilimitado, ajudas de aluguel mesmo morando na cidade; cortem isto e depois conversamos sobre nossos privilégios”. Quando ouviu que essa medida economizaria muito pouco, ele retrucou: “É porque vocês não percebem o exemplo e o respeito que teriam se fizessem isso”.

Todo encontro hoje nas ruas com o povo serve para sentir o humor da população

Foi isto que escutei, e também: “talvez sejam necessários ajustes para equilibrar as irresponsabilidades fiscais dos últimos anos e fazer reformas que equilibrem gastos e receitas. E por que não começar cobrando mais impostos dos mais ricos e menos dos mais pobres, taxando as grandes fortunas, suspendendo as mordomias no setor público e impedindo que no setor privado elas sejam pagas com recursos públicos, iniciando a austeridade por aqueles que provocam desperdícios? Por que não diminuir o gasto de quase R$ 1 bilhão por ano com o Fundo Partidário? Querem nos obrigar a trabalhar 45 anos para ter aposentadoria integral, então acabem com a aposentadoria integral e pelo teto para os outros”.

Quando lembrados de que trabalhador armado não deve fazer greve, os PMs disseram: “então parem a fábrica de bandidos em que se transformou o Brasil e que, armados, estão nos assassinando”, “querem cumprir a Constituição sobre nós, mas por que o presidente do Senado não respeitou um mandado judicial do Supremo? Por que a presidente da República foi cassada, mas não perdeu os direitos civis?” Eu escutei: “parem de driblar a Constituição para beneficiar a vocês e aceitaremos que ela seja aplicada contra nós”.

Todo encontro hoje nas ruas com o povo serve para sentir o humor da população. O brasileiro sente frustração com o clima de guerra civil, o excesso de privilégios e gastos, as obras inacabadas, o legado frustrado da Copa e dos Jogos Olímpicos, o roubo em forma de propinas e superfaturamentos. Mas, ao mesmo tempo que se faz os ajustes fiscais, a pergunta é: por que continuamos com a mesma maneira de fazer política, repetindo o que criticávamos no passado? Há anos estão avisando e esperando, descontentes e descrentes, indignados e dispostos a romper as regras. Faz anos que o povo avisa e sugere. Por não os ouvir, temos a estranha sensação de surpresa diante do fato anunciado e esperado: como na semana passada, em Vitória.

Cristovam Buarque é senador e professor emérito da UnB.
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