No oco político da inanidade oficial do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, a bem dizer, ainda não começou depois de três meses e 25 dias desperdiçados na interminável montagem da base majoritária de apoio do Congresso a temporada que se inicia com a instalação, em exagerada dose dupla, das CPIs do Apagão Aéreo e a munição que se recolhe no monturo das omissões, promete repetir em versão nanica o clima dos shows da fase de ouro das denúncias de escândalos do mensalão, do caixa 2, do fim do mundo do jorro de ferventes depoimentos com a cobertura da mídia mobilizada em tempo integral.
Mas a oposição precisa conter os impulsos reprimidos de meses de provação a pão e água por falta de assunto e com a ronda governista de sacola abarrotada para fechar o acordo com o PMDB, facilitada com a amnésia presidencial que arquivou antigos agravos e acolheu, por entre abraços e paparicos, os desafetos das trocas de ofensas cabeludas.
Águas passadas. A novíssima e alvissareira visita da sorte com a convocação das duas CPIs é um estímulo a imaginação para a montagem do novo modelo ajustado às mudanças no cenário.
Certamente não é tão simples ousar nos ajustes. É improvável que a mídia conceda as CPIs murchas, já sugadas pelas tumultuadas apurações pela Aeronáutica, o mesmo tempo e destaque da novidade da ofensiva que encostou o governo na parede.
As CPIs do Apagão no Senado e na Câmara (duas, para quê?) só justificarão a iniciativa se conseguirem denúncias novinhas em folha e com a carga explosiva para assustar o governo. Ou, calçando os borzeguins da humildade, partir para o levantamento dos erros na calamitosa sucessão de ministros civis da Defesa. No acalanto da demagogia desperdiçou milhões na reforma de aeroportos, que geram obras e visibilidade e deixaram à matroca o sistema de controle aéreo, que não rende votos nem outras vantagens. Se o sabido não tem o sabor da novidade, a denúncia formal, em relatório da CPI, com as devidas provas, causará um enorme estrago na credibilidade do governo.
Se a dieta é pobre em calorias, os augúrios da temporada do fim de outono, em 21 de junho, e começo de inverno, incluem no cardápio a escorregadela da toga no festival de corporativismo explícito: a decisão do ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinando a liberação dos desembargadores Carreira Alvim e Ricardo Regueira, além do procurador João Sérgio Leal e do desembargador do Tribunal do Trabalho, Ernesto Dória todos presos na Operação Hurricane, acusados de receber propinas pelas sentenças favoráveis a bicheiros e deixando os paisanos no xilindró compromete o último poder até aqui preservado dos respingos das suspeitas.
Claro, o governo não entrará na crise do Judiciário, com a polêmica acesa no cruzamento de manifestações a favor e contra ao que o presidente da Associação Nacional de Membros do Ministério Público, José Carlos Cosenzo, resumiu na frase lapidar: "Ou solta todos ou não solta ninguém".
A Operação Têmis, deflagrada em São Paulo pelo Ministério Público e a Polícia Federal para desbaratar a quadrilha que vendeu sentenças judiciais e lavagem de dinheiro e a suspeita de vazamento, gerou o filhote do inquérito para apurar os responsáveis pelo grave irregularidade.
Com o ministério que bateu o seu recorde com a criação da 36.ª secretaria para adivinhar o futuro, o governo inflaciona a agenda de aborrecimentos previsíveis para o ano inaugural do mandato bisado.
E a oposição rachada mergulha de cabeça no poço fundo da luta pela sobrevivência.
Villas-Bôas Corrêa é analista político.



