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Se tudo correr como planejado, o governo estadual irá privatizar o atendimento de 171 diferentes serviços de 34 órgãos públicos e assemelhados, entregando-os a um concessionário administrativo por 25 anos, prorrogáveis por outros 25, a um custo inicial de mais de R$ 3 bilhões. Faz sentido? Minha opinião curta e grossa: não.

Uma coisa é contratar periodicamente empresas privadas para realizar obras e serviços específicos de um ente ou uma empresa pública ou mista. É o caso de serviços de limpeza, de conservação, de entrega de correspondência, de construção e manutenção de obras etc. Outra totalmente diferente é conceder a uma empresa ou grupo privado praticamente todas as atividades de atendimento ao cidadão por um período tão longo, em condições de virtual exclusividade.

Acresce que os serviços a serem prestados o serão inicialmente em apenas nove localidades: três em Curitiba e seis em cidades-polo do interior, o que não caracteriza exatamente uma conveniência para quem mora em uma cidade com milhões ou centenas de milhares de habitantes. Como não é crível nem conveniente que em uma cidade como Curitiba, Londrina ou Maringá serviços públicos sejam concentrados em três lugares apenas, a atual rede de atendimento dos Correios, da Copel, da Sanepar e outras entidades certamente será mantida; mesmo porque as infraestruturas de tecnologia de informação são diversas e, em muitos casos, devem ser protegidas contra o acesso não autorizado de terceiros. Além disso, os serviços que envolvem o exercício do poder de polícia ou da fé pública (Polícia Civil, Detran, Polícia Federal, Receita Federal e Junta Comercial, por exemplo) obviamente não podem ser inteiramente delegados a funcionários de uma empresa privada. E por aí afora.

Minha opinião é que, se é para firmar Parcerias Público-Privadas, deveríamos fazê-lo para financiar obras de infraestrutura, que envolvam grandes investimentos de retorno lento e algum risco para o concessionário privado. O Tudo Aqui não tem nem uma nem outra característica: os investimentos a cargo do vencedor da licitação são relativamente modestos (três das centrais serão atuais Ruas da Cidadania reformadas e nenhuma das demais terá mais de 4 mil m²); boa parte da tecnologia a ser utilizada já foi desenvolvida para outros serviços semelhantes existentes em outros estados; e o risco de demanda é zero, pois se trata – praticamente em todos os casos – de serviços prestados em regime de monopólio legal ou virtual do Estado.

E, se é para gastar esse dinheirão em melhoria do atendimento ao cidadão, que se faça no desenvolvimento e na implantação de um verdadeiro governo eletrônico – isso, sim, um avanço definitivo. No mundo desenvolvido, o cidadão faz praticamente tudo o que envolve o poder público a distância, via informática. Aí, sim, há um avanço real de qualidade e não na criação de nove centros em um estado com 400 municípios e mais de 11 milhões de habitantes.

Estaria eu exagerando quando percebo no projeto do Tudo Aqui a reedição da incrível e surrealista experiência do Instituto Curitiba de Informática (ICI), a quem a Prefeitura de Curitiba paga fortunas e delegou monopolisticamente seus serviços de tecnologia de informação, mas a cujos custos e práticas não tem acesso?

Quando deputados resolveram inquirir o secretário de Planejamento sobre esse projeto de mais de R$ 3 bilhões envolvendo compromissos por uma ou duas gerações, o requerimento foi derrubado por ordem do líder da bancada do governo, como "uma afronta ao governador". Contrariamente ao que pensa o prestativo deputado Traiano, perguntas não afrontam ninguém; a falta de respostas a perguntas razoáveis é que afronta a inteligência dos outros.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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