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opinião do dia 1

Uma luz no fim do túnel: tomara que seja um trem

A imprensa noticia que o governo do estado estaria disposto a sentar na mesa de negociações com as concessionárias do Anel de Integração para encontrar uma saída para o impasse do pedágio que já dura cinco anos e não levou a nada de concreto a não ser um azedume crônico de parte a parte, uma sucessão de derrotas judiciais e a um gasto de milhões de reais para pagar advogados dos dois lados. Finalmente, uma tênue esperança de que os problemas da infra-estrutura viária voltem a ser tratados principalmente como questões de engenharia e não de direito. Finalmente uma luz no fim do túnel, e é bem vinda, pois o Paraná anda precisando urgentemente ampliar, modernizar e adequar seu sistema de escoamento da produção.

Em primeiro lugar, antes de falar nas rodovias, é preciso falar das ferrovias pois se tivéssemos uma malha ferroviária adequada, boa parte dos problemas com o chamado Anel de Integração desapareceriam. Isto porque é impossível dissociar os impactos dos custos dos pedágios do tipo de produtos que são transportados por via rodoviária. Em estudo que coordenei para a Federação dos Transportadores de Cargas – Fetranspar – em 2003 e que foi discutido esta semana na Comissão Especial de Investigação da Assembléia Legislativa, essa impossibilidade fica evidente: na época, um caminhão carregado de farelo de soja tinha um valor igual a mais do dobro de um outro carregado com milho. Se o caminhão estivesse transportando carnes, o valor da carga seria mais de cinco vezes maior do que o milho, vinte vezes maior do que uma carga de calcário para correção de solo. Ou seja, há um descompasso flagrante entre nosso sistema produtivo e a rede de transportes. No mundo inteiro, commodities não utilizam o transporte rodoviário e sim o ferroviário e o hidroviário que são muito mais econômicos. Aqui usamos o transporte rodoviário por falta de alternativas e essas alternativas têm de ser urgentemente criadas: é preciso investir pesadamente na ferrovia que trará os produtos do Oeste do Paraná (e do Mato Grosso e do Paraguai) até Paranaguá, o que exigirá, além do Corredor Oeste, uma nova ligação de Curitiba com o litoral. Aliás, essa ligação começou a ser construída nos anos setenta, há vários trechos de terraplenagem e diversas obras de arte feitas, mas a obra foi abandonada há mais de vinte e cinco anos.

Quanto às rodovias os problemas de defasagem das nossas estradas são evidentes. Vamos ser bem práticos: o grande surto de investimentos rodoviários em nosso estado foi realizado pelo governo Canet (1975-1979), ou seja, há quase trinta anos. De lá para cá contam-se nos dedos de uma mão as obras rodoviárias de importância estadual ou nacional e os sucessivos governos de lá para cá pouco mais fizeram do que recapar, restaurar e complementar a malha viária legada por Canet.

Com o impasse do Anel de Integração, os investimentos nos principais eixos de escoamento do estado (que formam exatamente o tal Anel) entraram em compasso de espera e isso terá efeitos negativos importantíssimos no futuro, pois a BR-277, por exemplo, faz parte do chamado Eixo Interoceânico Capricórnio que ligará Paranaguá ao porto de Antofagasta no Chile, um projeto apoiado pelo BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. O eixo prevê investimentos na construção de uma rede multi-modal integrando o Brasil (via Paraná) com o Paraguai, a Argentina, a Bolívia e o Chile. A importância estratégica desse eixo para o nosso estado salta aos olhos, pois seremos capazes realmente de polarizar regiões do Mato Grosso, do Paraguai e da Bolívia. Mas enquanto persistir o impasse com as concessionárias, a BR-277 não será duplicada e obviamente o Eixo Interoceânico não se materializará, pois nas condições atuais a estrada já está demonstrando um crescente estrangulamento.

Portanto, é bom que haja alguns sinais de que as partes conflitantes vão se despir de seus preconceitos e pré-julgamentos para procurar, com boa vontade recíproca, um ponto de encontro. Se for apenas para dar à opinião pública a impressão de que "o outro" é que não quer negociar, é inútil perder tempo. Mas se for para desatar esse nó górdio que nos imobiliza há vários anos e abrir espaço para uma urgente, urgentíssima modernização da infra-estrutura do estado, o esforço vale a pena. Tomara que essa luz no fundo do túnel seja uma metáfora para trens e caminhões trafegando em uma rede de estradas digna do nosso Paraná.

P.S. Sempre que falo em infra-estrutura viária me vem à mente a figura de Osires Stenghel Guimarães, o grande secretário de Transportes do governo Canet que não vejo há tempos. Alguns opositores, na época, quiseram ridicularizá-lo apelidando-o de "gigante do asfalto". No seu primarismo nem suspeitavam que estavam colocando o apelido certo na pessoa certa.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR.

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