A maioria da população não sabe quanto realmente está pagando em cada compra de mercadoria ou serviço. Uma nova lei deve mudar isso
O projeto de lei que obriga as empresas a destacarem nas notas fiscais os valores dos impostos pagos pelos consumidores foi aprovado e sancionado pela presidente da República e deverá entrar em vigor na metade do próximo ano. É uma ideia já praticada em vários países do mundo e que visa a dar transparência sobre a carga tributária e informar aos contribuintes os valores pagos em impostos.
Quem viaja para os Estados Unidos vê nas notas de compra o valor do tax, que é o imposto sobre consumo pago pelo contribuinte. No Brasil, há tempo se fala em informar à população qual o valor dos tributos pagos em suas compras, mas somente agora a ideia foi transformada em lei, por força de um projeto de iniciativa popular.
A lei aprovada prevê que devem ser explicitados nas notas fiscais o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); o Imposto sobre Serviços (ISS); o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF); o PIS/Pasep; a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); e o imposto que incide sobre a comercialização e importação de derivados de petróleo (Cide).
No Brasil, as coisas são mais complexas, sobretudo em função dos muitos tributos embutidos no preço final dos bens e serviços. A maneira de informar será pela discriminação separada, para cada mercadoria ou serviço, de todos os tributos indiretos federais, estaduais e municipais. A expressão "indiretos" é relevante, pois não serão incluídos os tributos diretos, como o Imposto de Renda sobre o lucro das empresas e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, que dependem da apuração do lucro das empresas, não incidindo sobre o valor das mercadorias e serviços em si.
Apesar da complexidade derivada da confusa carga tributária brasileira, a iniciativa trará, de início, a vantagem de informar a população sobre o tamanho dos tributos embutidos em cada produto. Espera-se que a transparência sobre quanto cada um paga ao governo desperte a consciência nacional e estimule as pessoas a verem a política e os políticos com mais cuidado, aumentando, assim, a cidadania política de um modo geral.
Talvez, com mais informação sobre que parte de sua renda cada um entrega aos governos, a população se mobilize para escolher melhor os candidatos a cargos eletivos e passe a fiscalizar de maneira mais eficiente o destino do dinheiro público, sobretudo porque os brasileiros irão se surpreender com o tamanho da carga tributária embutida no preço final dos produtos. Quando um consumidor encher o tanque de seu veículo em um posto e descobrir que quase metade do preço de um litro de gasolina é composto por tributos, é bem provável que a primeira reação será de indignação. A segunda reação deverá ser um questionamento sobre onde e como é aplicada a montanha de dinheiro que o governo arrecada todos os anos.
Os governos sempre gostaram dos impostos indiretos justamente por serem cobrados de forma sorrateira, meio escondida, sem que a população, em sua grande maioria, saiba o tamanho da mordida do fisco nos três níveis da federação. A carga tributária efetivamente arrecadada está em torno de 38% do Produto Interno Bruto (PIB), o que é muito para um país cuja renda per capita anda na faixa dos US$ 10,6 mil/ano. Se forem levadas em conta a precária qualidade dos serviços públicos prestados pelo governo, a ineficiência do Estado e a corrupção política, a carga tributária se torna escandalosa, mesmo porque ela chega a ser o dobro da verificada em países parecidos com o Brasil.
Cidadania tributária pode ser definida como a consciência que uma sociedade tem sobre o tamanho do governo e a carga de tributos pagos para sustentar a máquina estatal. Embora a informação geral sobre a carga tributária seja sempre divulgada, o fato de haver muitos impostos indiretos escondidos nos preços finais ao consumidor faz que a maioria da população não saiba quanto realmente está pagando em cada mercadoria ou serviço. A nova lei tem a missão de mudar essa situação.
O Brasil é um país de conquistas atrasadas e lentas, e o melhor exemplo disso é o fato de ter negligenciado a educação no século 20. Embora tenha chegado com atraso significativo, a lei que obriga o destaque dos tributos indiretos nas notas fiscais é altamente positiva e dará sua contribuição para melhorar a educação política da população brasileira.



