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“Vou continuar a trabalhar, com ou sem o Congresso”. Em janeiro de 2014, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no discurso anual conhecido como “sobre o estado da União”, falou que agiria por decreto se o Congresso continuasse dificultando os trabalhos do governo. O Partido Democrata, do presidente, detém 44% das cadeiras da Câmara, sendo o restante (56%) ocupado pelos republicanos, de oposição.

A situação de Barack Obama em relação ao Congresso pode estar pior que a situação da própria presidente Dilma. Tomemos um caso recente do Congresso brasileiro: na votação da comissão especial ocorrida na semana passada, na qual deputados rebeldes formaram uma chapa pró-impeachment para disputar a indicação dos membros da comissão, 272 parlamentares votaram nessa posição, o que corresponde a 53% dos deputados.

Nos países presidencialistas, como é o caso dos Estados Unidos e do Brasil, sempre haverá o risco de turbulências entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo – o Congresso e a Presidência, respectivamente; afinal, as eleições são distintas para cada um, sendo possível para o eleitor eleger o presidente de um partido e o parlamentar de outro, que pode ser da oposição.

As alianças são obrigatórias para se ter a maioria do Congresso. Governar não necessariamente depende disso

Essa é uma diferença para o parlamentarismo, no qual o governo é formado dentre os próprios parlamentares, sendo eleito pela maioria deles. Assim, a maioria do Poder Legislativo normalmente controlará também o Poder Executivo.

E não raras vezes a Presidência da República precisa lidar com um parlamento formado majoritariamente por deputados da oposição. Nos Estados Unidos, onde basicamente são eleitos parlamentares de dois partidos, Democrata e Republicano, com raras exceções de políticos eleitos por outros partidos, o cálculo do apoio do Congresso é simples e praticamente imutável; afinal, esses partidos não formam alianças.

No Brasil, pluripartidário, o Congresso pode ter muitas configurações, blocos e coalizões. O partido da Presidência, normalmente, não tem a maioria do Congresso, e, por isso, dependerá de alianças com outros partidos. Por essa razão, diz-se que no Brasil funciona um “presidencialismo de coalizão”, em que as alianças são obrigatórias para governar.

Na verdade, as alianças são obrigatórias para se ter a maioria do Congresso. Governar não necessariamente depende disso. No caso de Obama, ele se vê obrigado a governar com um Congresso omisso, preocupado em lhe fazer oposição. Com isso, o presidente dos Estados Unidos tem governado praticamente por decreto, como o que editou recentemente estabelecendo regras para os imigrantes.

E por lá o impeachment é sempre uma ameaça que se avizinha. O tempo todo, deputados mais radicais estão propondo o impedimento do presidente. Se fosse a voto, poderia ser aprovado pela Câmara dos Representantes de lá, mas possivelmente seria barrado no Senado. Foi o caso, por exemplo, de Bill Clinton, salvo pelos senadores em 1999.

Por isso, a atual crise política no Brasil – que para alguns seria mais grave que a própria crise econômica – pode ser, na verdade, apenas um sintoma do presidencialismo e do despreparo das instituições políticas para um Congresso que seja majoritariamente de oposição; afinal, se a maioria dos parlamentares é de oposição, isso seria o suficiente para um impeachment?

Um Congresso majoritariamente de oposição é fruto de alguns fatores, entre elas a falta de disposição para coalizões, mas não necessariamente implica em uma Presidência que deve ser impedida. Sempre haverá pedidos de impeachment – principalmente agora, que todas as partes da política conheceram esse instrumento –, mas sua aprovação depende do voto de dois terços dos parlamentares, e não da maioria simples.

Mas, para governar contra a vontade de um Congresso majoritariamente de oposição, é indispensável uma Presidência com personalidade, que diga, se necessário, que governará sem o Congresso. Talvez essa seja nossa maior crise política.

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