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Fecho a porta. Giro a chave duas vezes. Meus familiares já estão aqui. Agora, enfim, tudo está certo, não está? Não. Ainda falta fechar a janela da sala. Eu tinha a impressão de ouvir sons que prefiro não escutar. Também fecho a janela do quarto, alguém gritava na rua – será mais um roubo de carro? Não, não sei, devo estar delirando.

Aluguei um DVD, uma comédia. Vou conferir depois da refeição, estou mastigando um pedaço de bolo, já bebi um copo de leite. Ligo a tevê. Está passando um jornal. Outra personalidade acaba de morrer. Mais um bombardeio em Gaza. Ou no Iraque? E se o meu apartamento fosse alvo de um míssil? Melhor nem pensar nisso. Desligo a tevê. A comédia fica pra depois.

Preciso conferir se um e-mail chegou, é assunto do trabalho. Antes, entro no Facebook e vejo uma postagem sobre os riscos do Ebola. Outro post, com dezenas de comentários, diz respeito a vítimas do transporte aéreo. O interfone está tocando, o que será? É o porteiro: avisa que uma moradora do prédio morreu e o velório terá início ainda hoje. Nem conferi a caixa de entrada. Aquele e-mail chegou?

Estou com sede. Sigo até a cozinha. E se eu escorregar, cair e bater a cabeça no chão? Não. Isso não vai acontecer. Até pode, mas por que penso nisso?

E a comédia? Ainda não vi. E só agora me dou conta: é um filme com aquele ator, o mesmo que há pouco, de acordo com a notícia do jornal, morreu. Se eu ligar o DVD, vou ficar pensando no que aconteceu com ele.

O que foi isso? É uma ambulância? Ou a polícia? E esses gritos? Briga entre torcidas rivais?

Vou deitar. Desligo a luz. E deito. Preciso esquecer tudo. Deixar que essas notícias sobre as tragédias recentes e as ideias a respeito do fim sigam, me deixem. Estarei na mira? Estou na lista de agosto? Preciso dormir, sonhar com outubro, novembro, dezembro, janeiro e fevereiro de 2015.

Não sei o motivo, mas devo seguir. Chegar até amanhã, dia 22, sobreviver a agosto. Estou adormecendo e tenho a impressão de que não lavei a louça, o encanamento precisa de reparos e esqueci de pagar uma conta. Daqui a pouco, bem poucos minutos, estarei dormindo. Mas, antes disso, agora, lembro que a vida, a minha, a sua, a nossa, pode e vai seguir, não vai? Tomara que um pouco menos turbulenta, com as novas e inevitáveis pedras no caminho, mas em outra estação. Esse inverno vai acabar.

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