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Friedmann Wendpap

Para não passar em branco

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É provável que os chavistas ganhem a eleição presidencial na Venezuela. Pariram o desastre, que o embalem! Se a oposição vencer, terá de tourear problemas gravíssimos de segurança alimentar (a Venezuela não produz alimentos), inflação, sucateamento da extração e refino de petróleo, cisão da sociedade em traidores e patriotas – quer dizer, chavistas e não chavistas. É importante que Capriles tenha muitos votos para marcar posição, mas a vitória de Maduro garantirá o exaurimento da mística de Chávez, impedindo a repetição da tragédia argentina que vive numa sessão espírita, invocando o finado Perón para tudo.

Há brasileiros que suspiram de saudade da ditadura. Ante dissensos da democracia e a incompetência itálica de nossa gestão pública, aludem a passado idílico, quando havia "ordem". O Brasil grande exigia que todos se ufanassem de suas realizações portentosas como a Transamazônica. Quem não amasse aquele Brasil inventado pelo governo deveria deixá-lo. Tachavam-se os opositores de antipatriotas. Os governos ditatoriais foram extremamente malsucedidos na economia e entregaram o Brasil em frangalhos. Quem governou depois da ditadura padeceu de herança maldita e acabou, diante da opinião pública, como responsável pela falência. Quem pariu o fracasso não o embalou e se beneficia da impressão de que foi apeado do poder antes de completar os milagres econômicos.

A ditadura de Perón foi calamitosa; a brasileira – sem caudilho – foi desastrosa. A do chavismo está destruindo a Venezuela. Melhor que complete a demolição para não deixar clima nostálgico.

Em 1972, saindo diretamente do interior barrento do Paraná para a pauliceia desvairada, vi cartaz na parede de uma padaria no qual havia fotos de terroristas procurados. Pré-adolescente, fitei as imagens pequenas e não atinei para o horror da ocasião. Só nos anos 80, militando no movimento estudantil, percebi que havia tido contato com eflúvios dos porões da ditadura. Não, ditadura não merece saudade.

Se não houvesse a ditadura civil-militar de direita, haveria a de esquerda soviética, dizem alguns, trilhando pensamento do mal menor. É conjectura para debate em futuro remoto, no qual os fatos não componham o patrimônio emocional das pessoas. Hoje os sentimentos obnubilam a capacidade analítica sobre o que foi e o que poderia ter sido. Imagino que, à ditadura de qualquer coloração, preferível seria a continuidade dos processos eleitorais, com a eventual vitória de Juscelino em 1965 e sua sucessão em 70. Se tudo se encaminhasse para o curso ordinário da democracia, haveria mais maturidade institucional e, creio, não estaríamos patinando nos atoleiros do terceiro mundo.

31 de março de 1964 é data a ser lembrada com o significado de puerilidade política. O começo da nossa maturidade ocorreu em 5 de outubro de 1988 – e são só 25 anos!

P.S.: Um lustro de exposição hebdomadária de ideias, sentimentos, opiniões. Em algumas ocasiões uso palavras velhas, quase esquecidas. É meu jeito de agradecer à professora Pietra, que, dando reguadas na palma da minha mão, me alfabetizou em seis meses, propiciando-me a chance de escapar da apologia da ignorância feita pelo pieguismo freirense que admite "desvios no letramento" de pessoas que cursam nível superior.

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