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Galbraith se notabilizou pelo pensamento econômico, mas num livreto pouco conhecido, Anatomia do Poder, discorreu sobre as personalidades que exercem poder, distinguindo-as em naturais e sintéticas, dizendo que as fabricadas saem de moda e vão para o esquecimento; as naturais Galbraith divide em histriônicas e dirigentes, abrindo espaço para distinção entre demagogos e estadistas, tema relevante para quem se esforça para consolidar a democracia ainda muito jovem.

O demagogo obtém apoio ao falar o que a plateia deseja ouvir. O estadista diz o que a plateia deve ouvir, aceitando o custo político e pessoal de decisões contrárias à opinião pública. O dirigente diz não ao furor da multidão porque não se contamina pela irracionalidade multitudinária. Para o demagogo a maioria está sempre certa. A rigor o demagogo histriônico não dirige o povo; ele é dirigido pela vontade majoritária. Vox populi, vox Dei. Voz do povo, voz de Deus diz – em latim – a sabedoria comum, servindo de explicação demagógica para a navegação política ao sabor dos ventos da maioria. O demagogo é cuidadoso e mantém a aparência de que ele conduz a massa e não é por ela conduzido.

Demagogos e estadistas habitam monocracias (ditaduras) e democracias. Ocorre, a demagogia faz a monocracia sobreviver mais tempo e, na democracia, causa degeneração precoce. Curiosamente há relação inversamente proporcional: a democracia, para se manter, precisa de autoridade com estofo moral e político para dizer não à vontade majoritária quando a minoritária corre risco de perecimento; a tirania se mantém aceitando a supressão das minorias diante de maiorias. A rigor não é o tirano que manda; é a maioria que tiraniza por meio da pessoa do ditador populista.

Nos sistemas políticos estruturados conforme a tese de Montesquieu, o Legislativo e o Executivo têm ligação direta com o povo e formam governos a partir de maiorias eleitorais. Por força disso os políticos são livres para agir de modo oscilante, atuando em zona intermediária entre a demagogia e a responsabilidade. Ao Judiciário é reservada a tarefa de dizer não, de tomar decisões difíceis, contramajoritárias. A sua autoridade provém da legitimidade técnica e a legitimidade política está assentada na honoralibilidade. A verborragia, as palavras populares, soam estranhas na boca de quem, ao exercer a função, não é simpático.

A demolição da credibilidade causada por afirmações genéricas sobre a honra de todos os juízes afeta intensamente a legitimidade política da magistratura que não tem condição de angariar apoio distribuindo simpatia aos eleitores. As pessoas procuram o socorro judicial por acreditar que a decisão será honesta porque o juiz não precisa estar de bem com todo mundo para manter a posição de poder. É imperioso para o funcionamento do sistema de freios e contrapesos que o Judiciário aja como estadista e não demagogo.

Urbanidade, vocabulário elegante, conduta discreta na vida pública e particular, são deveres da magistratura para que a credibilidade da instituição a legitime a cumprir a missão de decidir com base em princípios superiores de civilidade ainda que ocasionalmente isso cause antipatia.

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