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Opinião 1

Destruição nada criativa

Um personagem tristemente famoso do mundo empresarial americano, Albert Dunlap, praticava um estilo de gestão tão desprovido de respeito pelas pessoas que tinha uma placa em sua mesa alertando os interlocutores: "se você está procurando um amigo, compre um cachorro". Os controladores e os administradores da Gol pareciam inspirados pelo sinistro Dunlap quando compraram uma empresa, a Webjet, e menos de dois meses depois a extinguiram, demitindo 850 funcionários às vésperas do Natal.

Depois, ainda agridem a inteligência geral, invocando razões "técnicas" para o encerramento da empresa comprada. O presidente da Gol declarou à imprensa que a antiguidade da frota de aviões da empresa comprada acarretava um acréscimo no custo dos combustíveis e os tornava "completamente inviáveis do ponto de vista econômico". E que o encerramento da Webjet permitirá à empresa "mitigar parte dos custos excessivos que estão fazendo que o setor de aviação no Brasil tenha o seu pior ano em resultado operacional e financeiro".

Ou seja, a Webjet não ficou nem dois meses sob propriedade da Gol antes de ser liquidada, tinha apenas 5,1% do mercado da aviação civil, mas, apesar disso, seu encerramento ajudará a "mitigar parte dos custos excessivos", blá, blá, blá... As mentes pedestres como a minha apreciariam se o presidente da Gol explicasse como é que sua empresa foi impactada pela "inviabilidade econômica" da Webjet se esta tinha 5% do mercado, enquanto aquela tinha 40%; e no período de janeiro a setembro, quando perdeu mais de R$ 1 bilhão, a Webjet não lhe pertencia?

Que tal uma outra explicação? Com a eliminação de um concorrente menor, especializado em baixas tarifas, a Gol está reforçando sua presença no duopólio que domina a aviação civil brasileira com a TAM: as duas juntas ultrapassam 85% de presença no mercado (a Azul e os nanicos ficam com as sobras). Além disso, a Gol assumiu os slots da Webjet em alguns aeroportos críticos no Brasil, o que reforça ainda mais seu poder duopolista. Em português claro e poucas palavras, a empresa compradora canibalizou a empresa adquirida, demitiu o pessoal, e assim eliminou um concorrente no mercado de baixo custo e baixo preço.

Quem ganha com esse tipo de transação? Certamente não os usuários, que viram a concorrência no mercado aeronáutico se concentrar mais ainda. Menos ainda os trabalhadores do setor da aviação civil.

Ganhou o país? Julgue você mesmo, paciente leitor. Joseph Alois Schumpeter definia a "destruição criativa" como um dos pilares do capitalismo dinâmico, responsável pelo contínuo surgimento de novos produtos e processos mais afinados com as necessidades e desejos do mercado. O que aconteceu com a Gol e a Webjet nada tem de criativo, pois não resultou em novos produtos e processos mais afinados com o mercado. É destruição pura e simples.

Pessoalmente, só espero que agora não passe pela cabeça da empresa pedir auxílio governamental para reverter seus prejuízos. Aí, já será desaforo puro e simples.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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