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| Foto: FEDERICO PARRA/AFP

O ditador Nicolás Maduro foi reeleito para mais um mandato de seis anos à frente do governo da Venezuela, com 67% dos votos válidos. A afirmação não surpreende, dado o expediente comum a ditadores de recorrer a pleitos fraudulentos para dar um verniz democrático a suas autocracias. É quase um deboche. Com Judiciário e Conselho Nacional Eleitoral (CNE) totalmente aparelhados, instituições em frangalhos, os principais nomes da oposição e sua coalizão proibidos de concorrer e uma população cada vez mais miserável e chantageada a votar pelo regime, ninguém esperava uma real mudança de rumos no país vizinho, mesmo que as pesquisas de opinião mais confiáveis colocassem o ex-chavista Henri Falcón como favorito.

Há fartas evidências de fraude na disputa de ontem (20). Milícias levaram votantes até as urnas, o que é proibido pela lei eleitoral, locais de votação ficaram abertos além do horário previsto, chavistas instalaram “pontos vermelhos” para checar o comparecimento dos eleitores, que votavam sob ameaça de terem seus benefícios sociais cortados pelo governo. Mesmo com todo esse aparato, apenas 46% dos eleitores foram às urnas – o próprio governo o admite. Em 2013, tinham sido quase 80%. O candidato derrotado, egresso do chavismo, agora denuncia nas redes sociais o pleito de ontem como “ilegítimo” e pede a convocação de novas eleições.

A diplomacia latino-americana fará bem em se unir para pressionar Rússia e China

A situação é dramática e quem mais sofre é o povo venezuelano. O país vive uma recessão desde 2013, a previsão da inflação, segundo o FMI, é de 14.000% só este ano, a cotação real do dólar já passou dos 20 mil bolívares no mercado negro e a produção e o comércio exterior estão desestruturados. Em decorrência disso, a população está literalmente passando fome: quase 65% dos venezuelanos perderam peso no ano passado. Os países vizinhos também já sentem as consequências, recebendo refugiados que fogem dos horrores da ditadura de Maduro. Dados da ONU apontam que, desde 2014, 145 mil venezuelanos pediram refúgio a outros Estados e outros 440 mil fugiram para outros países. No total, cerca de um milhão já migraram do país. Em Roraima, no Brasil, já passam dos 50 mil.

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Enquanto isso, militares leais a Maduro e os nababos do regime controlam a distribuição de alimentos, grande parte do câmbio paralelo, a política habitacional e a gigante estatal do petróleo, a PDVSA, joia da coroa da economia venezuelana – isso sem mencionar o envolvimento de funcionários públicos e militares com o tráfico de drogas. Nisso, o “socialismo do século 21”, louvado por parte considerável da esquerda brasileira, revelou-se a mesma tragédia que os socialismos do século 20, negando os direitos mais básicos ao povo e enchendo os bolsos da cúpula do regime, que coloca a culpa por todas as mazelas no “imperialismo” e na “guerra econômica” imaginária contra Caracas.

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A reação aos resultados de ontem dá uma amostra das dificuldades que vêm pela frente. O Grupo de Lima, integrado por Brasil, Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Guiana, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lúcia não reconheceu o pleito e deve reduzir o nível de relações diplomáticas com Caracas. Os Estados Unidos questionaram a eleição, e o presidente Donald Trump assinou hoje uma nova rodada de sanções contra a Venezuela, que não abrangem embargos à compra de petróleo. No entanto, financiadores do regime em Caracas, China e Rússia, que também fornece armamentos pesados a Maduro, reconheceram a vitória do ditador.

A situação na Venezuela já passou da calamidade pública, mas uma solução para o impasse esbarra, antes de tudo, no apoio de Pequim e Moscou ao regime. A diplomacia latino-americana fará bem em se unir para pressionar os dois países e buscar um consenso internacional mais firme contra Maduro. O povo venezuelano já pagou uma conta alta demais.

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