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| Foto: Federico Parra/AFP

As eleições municipais venezuelanas, ocorridas no último dia 10, não tiveram a participação dos principais partidos de oposição do país. Ação Democrática, Vontade Popular e Justiça Primeiro, além de legendas menores, não quiseram, com sua participação, chancelar um processo que consideravam fraudulento, por ser organizado pela Justiça Eleitoral bolivariana. O Conselho Nacional Eleitoral (CNE), totalmente aparelhado e obediente ao ditador Nicolás Maduro, já havia mostrado não ser confiável em 2016, ao ter impugnado as assinaturas recolhidas pela oposição e que, de acordo com a Constituição venezuelana então vigente, eram suficientes para se convocar um referendo revogatório que poderia abreviar o mandato de Maduro.

No entanto, ainda que pudesse ser justificada – dadas as fortes evidências de fraude nas eleições de outubro, que escolheram 23 governadores –, a ação dos partidos de oposição abriu o flanco para mais uma arbitrariedade da ditadura bolivariana de Maduro, em parceria com a Assembleia Nacional Constituinte irregularmente convocada (já que não houve o aval da população, em referendo, para tal medida), composta por pessoas escolhidas em um processo dirigido – desenhado para reduzir a representação das grandes cidades e para aumentar a participação de militantes chavistas, sem falar das suspeitas de fraude e do uso do voto de cabresto – e que tomou para si as funções de Poder Legislativo, esvaziando a Assembleia Nacional eleita em 2015, com ampla maioria oposicionista. Ainda no domingo, Maduro afirmou, em entrevista, que os partidos que não lançaram candidatos nas eleições municipais estariam automaticamente barrados da eleição presidencial marcada para o fim de 2018. “Foi o critério que a Assembleia Nacional Constituinte estipulou”, afirmou o ditador.

Só a intensificação da pressão internacional pode garantir uma eleição limpa em 2018

Já há tempos Maduro tinha perdido qualquer pudor nas tentativas de consolidar seu poder, a despeito da enorme oposição que enfrenta nas ruas, motivada não só pela ditadura que implantou no país, como também pelos caos econômico e humanitário em que o “socialismo do século 21” chavista jogou o país. Quando o ditador resolveu ignorar o Poder Legislativo eleito pelo povo para convocar uma assembleia constituinte, seu regime já tinha cometido incontáveis outras violações, como a detenção arbitrária de líderes oposicionistas, como Leopoldo López, agora em prisão domiciliar (o colega Antonio Ledezma teve mais sorte e conseguiu fugir do país em novembro, chegando à Europa); o uso de milícias armadas para a repressão violenta das manifestações de rua, com mais de 100 mortos; e a supressão da imprensa independente.

A comunidade internacional tem respondido, ainda que tardiamente ou de forma tímida, à escalada ditatorial na Venezuela: o resultado das eleições para a assembleia constituinte não foi reconhecido por diversos países latino-americanos, pela União Europeia e pela Organização dos Estados Americanos – o Brasil, depois de uma posição inicial vacilante do ministro Aloysio Nunes, adotou a mesma postura. O governo norte-americano tem sido mais enfático, aplicando sanções que têm o objetivo de dificultar o financiamento do regime, ainda que Maduro possa contar com russos e chineses para contornar parcialmente esta dificuldade. No entanto, ainda não houve repercussão significativa a respeito da possível exclusão dos partidos de oposição da eleição presidencial de 2018 – Nunes afirmou, no Twitter, que via a notícia “com preocupação” e considerava a decisão “um absurdo”, mas ainda não houve nota oficial do Itamaraty.

Leia também: O ditador quer confronto (editorial de 24 de janeiro de 2017)

Leia também: A raiz do mal venezuelano (editorial de 14 de agosto de 2017)

Ainda que analistas e outros oposicionistas, contrários ao boicote, tenham alegado que ficar de fora das eleições municipais só ajudaria os candidatos de Maduro, é simplesmente inaceitável que um partido seja impedido de lançar um candidato à presidência do país com base nesta postura. As negociações em curso na República Dominicana seriam uma oportunidade para que essa arbitrariedade seja corrigida, mas, dado o pouco apreço que o ditador venezuelano tem por qualquer obstáculo a seu poder absoluto, a chave para que pelo menos a eleição de 2018 ocorra de maneira limpa parece estar na intensificação da pressão internacional.

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