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Ucranianos hasteiam bandeira de seu país na cidade de Balakliya, que estava sob controle russo e foi recapturada no início de setembro.
Imagem retirada de vídeo mostra ucranianos hasteando a bandeira de seu país na cidade de Balakliya, que estava sob controle russo e foi recapturada no início de setembro.| Foto: Ukraine Defense Ministry handout/EFE/EPA

A bandeira ucraniana voltou a tremular em centenas de localidades na região de Kharkiv, no nordeste do país. O mesmo vem ocorrendo nos arredores de Kherson, no sul da Ucrânia, muito perto da península da Crimeia. O sucesso da contraofensiva ucraniana alimenta a esperança de que a campanha de agressão russa tenha chegado a um ponto de inflexão, mas também provoca uma série de temores a respeito de como Vladimir Putin reagirá para não sair desmoralizado desta aventura provocada por seus delírios imperialistas.

No leste do país, as tropas russas estão cedendo milhares de quilômetros quadrados de área antes ocupada por elas – em alguns casos, os russos chegaram a ser empurrados de volta à fronteira entre Rússia e Ucrânia. Em seus relatórios, o Ministério da Defesa russo não menciona a contraofensiva ucraniana e se limita a afirmar que está apenas “reagrupando” tropas para reforçar sua presença na região de Donetsk (que, assim como Luhansk, pertence à Ucrânia, mas tem população de maioria étnica russa), mas analistas militares vêm observando que o movimento se parece mais com uma fuga que com um deslocamento programado, com os russos inclusive deixando para trás evidências de crimes de guerra. No sul do país, a inteligência ucraniana diz ter identificado um movimento de saída de famílias de autoridades de ocupação, que estariam deixando a Crimeia, península ilegalmente anexada por Putin em 2014, para voltar à Rússia.

O recente sucesso ucraniano em sua contraofensiva é propício para que as nações ocidentais redobrem seus esforços de ajuda militar e financeira

Esta virada ucraniana se deve à combinação entre a tenacidade dos defensores e a ajuda ocidental, seja com armamentos que vêm impedindo os russos, por exemplo, de impor superioridade aérea no território da Ucrânia, seja com sanções que estão afetando a indústria bélica russa. Mas os próprios russos fizeram escolhas que também limitam suas ações. A invasão da Ucrânia tem o status de “operação militar especial”, pois uma declaração de guerra caracterizaria formalmente a Rússia como responsável pelo conflito diante da comunidade internacional. No entanto, a ausência dessa declaração impede Putin de convocar uma mobilização geral de seu exército, impossibilitando-o de reforçar a presença invasora na Ucrânia e substituir tropas cansadas ou debilitadas.

No cenário ucraniano, não importa apenas o que Putin fará, mas quando. Sem os fracassos recentes russos, ele poderia esperar pacientemente até o inverno – mas não como em 1812 ou 1942, pois os ucranianos, ao contrário dos franceses napoleônicos ou dos nazistas, estão preparados para lutar em baixas temperaturas. Desta vez, a cartada russa consiste na chantagem energética, que já começou, mas ficaria ainda mais intensa à medida que o frio atingisse os países europeus dependentes do gás russo. A Europa corre para buscar alternativas, como novos fornecedores e a reativação de usinas a carvão ou nucleares, e os europeus já estão pagando muito mais pela energia. Seria um cenário confortável para Putin arrancar concessões e reduzir o apoio ocidental à Ucrânia, mas a contraofensiva ucraniana pode forçá-lo a adiantar uma resposta.

Se o autocrata russo concluir que já não tem muito mais a perder diante de uma comunidade internacional que já o vê como agressor, a declaração de guerra e consequente mobilização geral poderiam levar a uma segunda reviravolta. E nunca pode ser descartada a possibilidade do uso de armas de destruição em massa, como armas químicas ou bombas nucleares de baixa intensidade – no início da invasão, houve denúncias a respeito do uso de bombas termobáricas e bombas de fragmentação, também condenadas por convenções internacionais. Estas são hipóteses que desde já precisam ser rechaçadas por todos os líderes mundiais com muito mais veemência que em ocasiões anteriores – basta lembrar como Barack Obama desmoralizou sua própria política de “linha vermelha”, estabelecida em 2012, ao não fazer nada quando o sírio Bashar al-Assad usou armas químicas contra sua população em 2013.

O recente sucesso ucraniano em sua contraofensiva é propício para que as nações ocidentais redobrem seus esforços de ajuda militar e financeira, e, no caso dos europeus, mostrem que eventuais sacrifícios causados por dificuldades no abastecimento de energia são necessários para frear Vladimir Putin. Se este ímpeto não for perdido, e se ainda restar um mínimo de bom senso ao autocrata russo para que não cometa nenhuma loucura ainda maior, podemos vislumbrar o retorno das tropas russas às posições que ocupavam antes de 24 de fevereiro (talvez, até mesmo com a recuperação da Crimeia), e um fim para a guerra.

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