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O coordenador da transição, Aloizio Mercadante, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
O coordenador da transição, Aloizio Mercadante, e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

“Vai acabar (sic) privatizações nesse país”, prometeu Lula em discurso no qual confirmou o nome de Aloizio Mercadante como presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Que Lula diga isso de forma tão aberta não chega a ser surpresa para ninguém, pois o petismo sempre teve um enorme apego às empresas estatais. Não apenas por convicções jurássicas a respeito do papel do Estado na economia, mas também por outros motivos mais inconfessáveis, que no entanto ficaram conhecidos do país inteiro quando a Lava Jato mostrou como o PT viu na pilhagem das estatais a forma ideal de reabrir a torneira que tinha sido fechada com o estouro do escândalo do mensalão.

E, se tudo isso não é segredo para ninguém, para que adiar o momento em que o PT voltaria a colocar sua mão gulosa sobre as estatais? Para não perder tempo valioso, a Câmara aprovou, na calada da noite e com tramitação relâmpago, um projeto de lei que altera o artigo 17 da Lei das Estatais, que, no parágrafo 2.º, II, veda a indicação, para a diretoria ou Conselho de Administração, “de pessoa que atuou, nos últimos 36 (trinta e seis) meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”. Os deputados reduziram a quarentena para meros 30 dias – o que, no fim, equivale a quarentena nenhuma. O primeiro beneficiário da mudança, caso passe pelo Senado, é o próprio Aloizio Mercadante, que participou da campanha de Lula e é coordenador técnico da equipe de transição.

O petismo sempre teve um enorme apego às empresas estatais. Não apenas por convicções jurássicas a respeito do papel do Estado na economia, mas também por outros motivos mais inconfessáveis

“A quarentena atual é demasiadamente extensa”, reclamou a relatora do projeto, deputada Margarete Coelho (PP-PI), acrescentando que ela “atinge inclusive dirigentes de pequenos partidos que são impedidos por três anos de assumir qualquer cargo em um município” – um exagero, já que a lei trata apenas de empresas públicas, e não de “qualquer cargo”. Mas todos sabem que não é com o pequeno líder partidário que exerce seu micropoder nos confins do Brasil que a relatora está preocupada; trata-se de permitir que os grandes caciques voltem a indicar livremente seus apadrinhados para cargos importantes nas gigantes em poder do Estado brasileiro, como o BNDES, a Petrobras, os Correios, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. E é por isso que o Centrão, ao qual Margarete Coelho pertence, deu seu apoio entusiasmado ao projeto, já que esses partidos foram vitais para que o petismo fizesse o petrolão funcionar.

A Lei das Estatais foi uma das consequências da Lava Jato e parte da “herança bendita” deixada pelo governo Michel Temer ao desfazer ao menos parte da destruição causada pelo lulopetismo. Quando a maior operação de combate à corrupção da história do Brasil escancarou o resultado do uso político das estatais, a nova legislação veio colocar ordem na casa e impor boas regras de governança para essas empresas, evitando que elas voltassem a ser presa de governos e partidos inescrupulosos. E bastou uma administração mais responsável para que várias delas revertessem uma trajetória de prejuízos e voltassem a dar lucro. Mas, como o dinheiro não estava mais parando em certos bolsos (independentemente de a estatal ser lucrativa ou deficitária), era preciso derrubar as regras, intenção que o Centrão e o PT já haviam manifestado em meados deste ano, quando Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, falava em alterar a lei por medida provisória; e Gleisi Hoffmann, presidente do PT, atacava abertamente as regras de nomeação de diretores.

No discurso, o petismo sempre tratou as estatais como “patrimônio do povo brasileiro”, usando essa retórica para denunciar privatizações ou reclamar quando empresas como a Petrobras adotavam práticas responsáveis de mercado em suas políticas. Mas, na verdade, as estatais, como diz o nome, pertencem ao Estado – esse mesmo Estado que o petismo confunde com o próprio partido quando está no poder. E, se no fim das contas a empresa é “do partido”, o partido pode fazer com ela o que bem entender, como o BNDES fez com sua desastrosa política de “campeões nacionais” ou com o incentivo camarada para que ditaduras latino-americanas e outros regimes de esquerda bancassem obras quase sempre realizadas por certas empreiteiras amigas. Acreditar que, voltando ao Planalto, o petismo faria algo diferente do que fez no passado com as estatais é passar atestado de ingenuidade.

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