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fachada da Copel, em Curitiba
Ações da Copel dispararam após anúncio de privatização| Foto: Divulgação/Copel

A redução brusca de impostos estaduais sobre energia elétrica, telecomunicações e combustíveis, definida pelo Congresso Nacional em meados deste ano, desorganizou as finanças de todos os estados, que até então vinham se preparando para reduzir tais alíquotas de ICMS de forma gradativa até 2024, após decisão do STF no fim de 2021. Neste cenário, é compreensível que um governador reeleito não queira esperar até o início de seu segundo mandato para encontrar uma forma de recompor suas contas. Mesmo fora desse contexto, enfrentar logo, desde os primeiros instantes após a reeleição, temas complexos e relevantes é, mais do que compreensível, meritório.

Mas, no Paraná, este processo ganhou contornos no mínimo bastante discutíveis. O enorme pacote enviado por Carlos Massa Ratinho Júnior à Assembleia Legislativa ganhou destaque não apenas pelas suas dimensões, mas pela forma como foi levado adiante no Legislativo estadual, por meio de um “tratoraço” que resultou na aprovação célere, quase sem discussões, de itens como a privatização da Copel – apenas a enorme pressão do setor produtivo impediu que outras partes do pacote tivessem o mesmo desfecho, embora algumas delas já estejam em estado bem adiantado de tramitação.

Não é preciso ser um parlamentar de convicções estatizantes para considerar que a privatização da maior empresa do Paraná e a terceira maior do Sul do Brasil merecia ampla discussão na Assembleia e na sociedade

Não é nosso objetivo, no momento, discutir a fundo o mérito de cada uma dessas medidas. Em inúmeras oportunidades, a Gazeta do Povo já defendeu o enxugamento do Estado, o princípio da subsidiariedade (pelo qual o Estado só atua diretamente na economia naquilo que a iniciativa privada não tiver interesse ou capacidade de realizar) e uma tributação inteligente, que respeite a justiça tributária e não sufoque o setor produtivo a ponto de desestimular a atividade, como demonstra a chamada “curva de Laffer”. O pacote tem itens bons e itens problemáticos, e a aprovação sem reflexão, sob pressão do governo, por meio de um tratoraço, é a maneira ideal de levar adiante os itens problemáticos sem que a população e a sociedade civil organizada tenham chance de contestá-los, ao mesmo tempo em que consegue lançar suspeitas até mesmo sobre os itens bons.

Errou o governador Ratinho Júnior, que, ciente da maioria que tem na Assembleia, pretendeu que seu pacote tramitasse rapidamente sem nem ter consultado anteriormente vários dos interessados – o setor produtivo foi pego de surpresa com as propostas de aumento da carga tributária, ainda que com a finalidade de bancar um Fundo de Desenvolvimento de Infraestrutura e Logística. Mas errou ainda mais a Assembleia Legislativa ao se prestar ao papel de mero carimbador dos desejos do Palácio Iguaçu. Os deputados da base aliada, aparentemente, até sentiram que havia algo errado, a ponto de ninguém ter subido ao plenário da Assembleia Legislativa para defender a privatização da Copel. Ora, diante da controvérsia que o projeto inevitavelmente causaria, o natural seria que os deputados se opusessem à pressa do governo e pedissem tempo para discutir melhor o tema. Mas não foi o que ocorreu, e assim também a sociedade ficou sem se fazer ouvir.

Que o governo queira levar adiante com celeridade suas propostas é até natural, embora, neste caso, nestas proporções, tal atitude denota uma certa falta de convicções democráticas, de crença no poder do diálogo e do debate aberto. Agora, inaceitável é a atitude subserviente da Assembleia Legislativa. Não é preciso, por exemplo, ser um parlamentar de convicções estatizantes para considerar que a privatização da maior empresa do Paraná e a terceira maior do Sul do Brasil merecia ampla discussão na Assembleia e na sociedade. Em temas como este, que envolve a prestação de um serviço essencial, estudar os projetos com profundidade, avaliar seu alcance, aprimorar o que pode ser aprimorado, dialogar e tentar esclarecer todos os envolvidos e interessados constituem uma obrigação grave.

No exato momento em que há diversas dúvidas sobre os efeitos dos “jabutis” inseridos pelo Congresso Nacional no texto da privatização da Eletrobras, com possibilidade de aumento no custo que o consumidor pagará pela energia, a privatização da Copel jamais poderia ser levada adiante da forma como foi, sugerida em um dia, aprovada no outro e sancionada logo na sequência – mesmo na hipótese de esse processo se dar com lisura inquestionável e resultar em benefícios para a sociedade paranaense. O mesmo se pode dizer de vários outros itens do pacote, como os aumentos na tributação do setor produtivo; a mobilização imediata das entidades foi capaz de frear a ideia de elevar a taxação sobre o agronegócio, mas a elevação da alíquota-base do ICMS foi aprovada, e depende apenas de uma formalidade quanto à redação final e da sanção do governador.

Em vez da boa política, feita com debate público e convencimento à base de bons argumentos, preferiu-se o caminho da força, de uma maioria acrítica e, portanto, passível de muitas falhas. No caso dos projetos já aprovados e sancionados, como o da Copel, não há mais o que fazer; mas nos demais casos ainda há espaço para parar e discutir os temas com a profundidade que eles merecem.

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