
A divulgação, na manhã desta terça-feira, da ata da última reunião do Copom tranquilizou o mercado financeiro em relação à divergência vista na decisão de reduzir a Selic em 0,25 ponto porcentual. O fato de todos os quatro diretores favoráveis a um corte de 0,5 ponto terem sido indicados por Lula havia alimentado o temor de uma possível leniência em relação à inflação e uma postura mais política que técnica, de modo a agradar o governo federal, que constantemente ataca o Banco Central e defende uma redução mais drástica dos juros. O que a ata mostrou, no entanto, é uma concordância ampla dentro do colegiado sobre o cenário preocupante que se desenha, enquanto a divergência se deu mais por questões ligadas à estratégia de comunicação e à credibilidade do BC e do Copom.
É nas partes da ata intituladas “Discussão sobre a condução da política monetária” e “Decisão de política monetária” que estão expostos os argumentos tanto do quarteto defensor do corte de 0,5 ponto quanto da maioria que definiu a redução de 0,25 ponto porcentual na Selic. A minoria reafirmou seu compromisso com a meta de inflação e concordou com a necessidade de uma política monetária contracionista, mas argumentou que seria melhor seguir a sinalização dada no comunicado e na ata da reunião anterior, de março, que antecipava um novo corte de 0,5 ponto. O preço de não cumprir o que havia sido anunciado, segundo este grupo, seria um “custo reputacional de não seguir o guidance, o que poderia levar a uma redução do poder das comunicações formais do comitê”. Uma redução de meio ponto, completaram esses diretores, não representaria nenhum tipo de leniência com a inflação ainda acima da meta, e manteria a política monetária no terreno contracionista.
A ata não só afasta os temores de uma “tombinização” do Banco Central como também envia um recado a Lula e sua equipe econômica
A maioria, no entanto, argumentou que o forward guidance trazia consigo uma condição, explicitada na expressão “em se confirmando o cenário esperado”. Como o tal “cenário esperado” não se confirmou, especialmente depois que o governo federal enviou ao Congresso Nacional a mudança na meta de resultado primário para o ano que vem, a promessa de redução de 0,5 ponto já não seria vinculante. De acordo com o grupo que acabou prevalecendo na discussão, muito pior que pagar um preço “reputacional” de não entregar o que fora prometido – até porque as condições para que isso acontecesse já não existiam – seria o “risco de perda de credibilidade sobre o compromisso com o combate à inflação e com a ancoragem das expectativas”. A percepção de que o BC e o Copom estariam perdendo a mão no sentido da leniência, portanto, seria mais grave que a possível crítica por um corte inferior ao previamente anunciado – além disso, boa parte do mercado financeiro já tinha passado a considerar plausível um corte de 0,25 ponto depois da mudança da meta de resultado primário para 2025.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comentando a ata, minimizou as divergências, afirmando que “eram duas posições técnicas, respeitáveis”. O que ele não afirmou é que os trechos que refletem a posição unânime do Copom não são nada bons para o governo. Mesmo os membros indicados por Lula reconhecem que os últimos movimentos do Planalto e da Fazenda não ajudaram em nada o esforço de preservação do valor da moeda; a ata afirma, por exemplo, que “o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia”, e lista “os recentes anúncios de política fiscal” entre os “possíveis motivos da recente desancoragem das expectativas de inflação”.
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Esta ata, portanto, não só afasta os temores de uma “tombinização” do Banco Central como também envia um recado a Lula e sua equipe econômica. Foi sintomático o fato de o Copom não ter se comprometido com nenhum tipo de sinalização sobre a próxima reunião, em junho – esta, sim, uma decisão unânime –, preferindo aguardar um “novo conjunto de informação” para “calibrar a trajetória do instrumento de política monetária da forma apropriada”. Os diretores do BC usaram uma linguagem bastante firme sobre o compromisso de ancorar as expectativas de inflação e trazê-la para a meta, e disseram que isso depende do “contínuo fortalecimento da credibilidade e da reputação tanto das instituições como dos arcabouços fiscal e monetário que compõem a política econômica brasileira”. Resta saber se o presidente e seus ministros entenderão a mensagem.



