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Editorial

A diplomacia brasileira a serviço da defesa das ditaduras

Lula e o ditador nicaraguense Daniel Ortega| (Foto: Foto: EFE / Fernando Bizerra Jr)

Buscar estreitar laços com o que há de pior na América Latina parece ser uma obsessão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Depois de ter estendido o tapete vermelho ao ditador Nicolás Maduro, recebido no Brasil com toda a honra e deferência, agora a diplomacia brasileira se dedica a defender outro autocrata esquerdista, Daniel Ortega, mandatário da Nicarágua.

Em documento enviado à Assembleia-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o governo brasileiro pediu alterações no texto de uma resolução que deve ser apresentada na próxima semana com críticas à situação da Nicarágua. Para o governo petista, o texto precisa ser “amenizado”, como se as duras e frequentes violações contra os direitos humanos naquele país fossem um mero exagero linguístico e não uma terrível realidade mais do que documentada.

É triste ver a diplomacia brasileira fazendo as vezes de embaixadora das ditaduras, tentando convencer o restante do mundo que não há nada de errado debaixo do sol nicaraguense.

O governo lulista não gostou principalmente do ponto em que a OEA – que engloba 35 países das Américas, incluindo Brasil e a Nicarágua – pede a volta da democracia na Nicarágua. Para o Itamaraty, a redação correta seria “fortalecimento da democracia”, como se ainda se pudesse chamar o país da América Central de democrático. Outra modificação sugerida pelo governo petista seria usar "expressar preocupação", ao invés de “profunda preocupação” com os relatórios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre a repressão na Nicarágua. A diplomacia brasileira também pediu a retirada dos trechos da resolução que falam em “confisco de bens e negação de pensões para as pessoas pelo governo”. E sugere o acréscimo ao documento da palavra “suposta” antes das denúncias de “violações do direito de propriedade” no país.

É grave que a diplomacia brasileira se preste a um papel tão mesquinho – de novo. Em março, durante reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil se absteve de assinar uma declaração conjunta, patrocinada por um robusto grupo de 55 países, que condenava a ditadura de Daniel Ortega, acusada de cometer crimes contra a humanidade. Naquela ocasião, o Brasil também pediu mudanças no texto, sob o argumento de que era preciso haver “espaço para diálogo" com a Nicarágua. Sabiamente, os demais países não aceitaram as sugestões e o texto manteve seu teor contra a ditadura de Ortega.

Regimes “amigos” do petismo podem fazer o que quiserem contra suas populações que não serão criticados pela diplomacia brasileira.

Cada vez que insiste em ações como essa, a diplomacia brasileira mostra que o motor que orienta as relações do Brasil com os demais países é o alinhamento ou simpatia ideológica. O sandinismo de Ortega e o petismo de Lula são velhos conhecidos, mesmo que durante as eleições o PT tivesse usado de todos os meios – inclusive pedindo a censura de veículos de comunicação que mencionavam a proximidade entre Lula e Ortega – para tentar esconder isso.

Sem demonstrar nenhuma sensibilidade com aqueles que são perseguidos, torturados, ou expulsos simplesmente por ousarem levantar a voz contra o regime ditatorial nicaraguense, a diplomacia brasileira mostra que o que lhe orienta não são os acordos nem tratados internacionais, muito menos a voz da moral sabiamente orientada que facilmente distingue o agressor do agredido, mas, sim, o mero “camaradismo”.

Regimes “amigos” do petismo podem fazer o que quiserem contra suas populações que não serão criticados pela diplomacia brasileira. Ortega pode confiscar a estrutura da Cruz Vermelha no país, fechar universidades, mandar prender, torturar, bloquear os bens da Igreja, mandar a polícia de porta em porta ameaçar as pessoas de prisão, prender padres e expulsar freiras. Se for em nome da implantação e manutenção de governos esquerdistas – por mais totalitários que sejam – tudo vale e será aceito pelo petismo. Eventuais críticas são tratadas como “narrativas”, que podem ser “desconstruídas” por meio dos discursos, mesmo que isso seja equivalente a mentir descaradamente e sem pejo algum.

É triste ver a diplomacia brasileira fazendo as vezes de embaixadora das ditaduras, tentando convencer o restante do mundo de que não há nada de errado debaixo do sol nicaraguense – nem em outros regimes disfuncionais ao redor do mundo –, e que a democracia existe naquele país. Trata-se de uma postura indigna para um país verdadeiramente democrático, mas que, infelizmente, parece ter se tornado a bandeira do Itamaraty.

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