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Com a possibilidade de os pedidos de abertura de processo de impeachment chegarem à Câmara dos Deputados nos próximos dias, a presidente Dilma Rousseff voltou à estratégia desesperada de tentar repetir mil vezes uma mentira até que ela se transforme em verdade. Na quarta-feira, ela usou duas vezes o mantra do “golpismo”, que já tinha retornado aos discursos presidenciais no início da semana.

Nesta terça-feira, após a entrega do Prêmio Jovem Cientista, a presidente falou a repórteres nos seguintes termos: “faremos de tudo para impedir que processos não democráticos cresçam e se fortaleçam”. No dia seguinte, em Presidente Prudente (SP), Dilma foi mais direta e usou a palavra “golpe”. Primeiro, em entrevista a uma rádio da cidade, quando disse que “esse método de usar a crise como mecanismo para chegar ao poder é uma versão moderna do golpe”. Depois, entregando residências do Minha Casa, Minha Vida, a presidente voltou ao tema. “Qualquer forma de encurtar o caminho da rotatividade democrática é golpe, sim. É golpe”, afirmou enfaticamente.

Pode-se concordar ou discordar das alegações daqueles que desejam o impeachment, mas jamais se pode alegar que esteja em curso um atentado à democracia

O impeachment, no entanto, não tem absolutamente nada de ruptura antidemocrática. Pelo contrário: é um instrumento previsto inclusive na lei maior brasileira, a Constituição Federal. Foi por meio deste instrumento que, em 1992, retirou-se do poder o então presidente Fernando Collor de Mello, um processo que teve apoio do PT e de seus movimentos-satélites, como a UNE, então comandada por Lindbergh Farias, hoje senador petista e que fala com muita frequência no impeachment como “golpismo”, sem perceber que assim renega seu passado. Da mesma forma, ainda que não tenha chegado a haver processo formal contra Fernando Henrique Cardoso, o PT esteve na linha de frente do “fora FHC”.

Da mesma forma, não é verdade que o clamor pelo impeachment seja baseado na “crise”, assim, de forma genérica, como faz entender a presidente. A legislação é bem clara nesse sentido: nem a mera incompetência presidencial, nem o descumprimento das promessas de campanha, nem a desorganização econômica são motivos suficientes para se remover um chefe do Poder Executivo. É preciso haver crime de responsabilidade, algo bem específico, que esteja previsto na lei brasileira – mais especificamente, na Lei 1.079/50. E aqueles que têm proposto o impeachment de Dilma se baseiam não em um fluido conceito de “crise”, mas em atos como as pedaladas fiscais, que estão sob análise do Tribunal de Contas da União, ou a omissão da presidente em conter a roubalheira na Petrobras, investigada na Operação Lava Jato. Em resumo: pode-se concordar ou discordar das alegações daqueles que desejam o impeachment, mas jamais se pode alegar que esteja em curso um atentado à democracia.

Com a presidente subindo o tom, não é de surpreender que os que estejam abaixo dela se sintam livres para ir ainda mais além. Na sessão de terça-feira da Câmara dos Deputados, o Brasil teve uma ideia das ferramentas a que pretendem recorrer os defensores do governo. Depois de o líder do Democratas, Mendonça Filho, ler uma questão de ordem pedindo esclarecimentos sobre a tramitação de eventuais pedidos de impeachment, os governistas ocuparam a tribuna. O petista gaúcho Paulo Pimenta comparou Mendonça ao líder oposicionista Carlos Lacerda, acrescentando que “o golpe não passará” e “o povo brasileiro vai resistir”. Mas foram os deputados José Guimarães (PT-CE), líder do governo, e Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que perderam completamente o pudor e partiram para a ameaça. “Não cutuquem a onça com vara curta, vocês pensem duas vezes (...) pensem no dia de amanhã, porque nós temos capacidade de mobilização (...) não venham com esse tipo de comportamento, porque vocês receberão o troco, o troco nas ruas, o troco daqueles que têm história na luta pela democracia”, prometeu Guimarães. “Guerra é guerra (...) nossas armas estão na luta popular e saberemos fazê-la”, disse Jandira. O petista até alegou não estar dizendo aquilo “em tom de ameaça”, como que se defendendo preventivamente de uma conclusão que parece evidente.

Esse tipo de comportamento não surpreende, pois o próprio ex-presidente Lula já tinha lembrado, em fevereiro, que “também sabemos brigar. Sobretudo quando o Stedile colocar o exército dele nas ruas”, em referência ao MST. E, em agosto, o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas, falou em “ir para as ruas, entrincheirados, com arma na mão, se tentarem derrubar a presidente Dilma Rousseff (...) qualquer tentativa de atentado à democracia, à senhora ou ao presidente Lula, nós seremos um exército que vai enfrentar essa burguesia na rua”. Esse apelo foi feito diante da própria presidente, sem que houvesse qualquer reprimenda. E assim, aos poucos, vão se acirrando os ânimos, principalmente daqueles que se dizem defensores da democracia, mas não aceitam o uso dos instrumentos democráticos, recorrendo até mesmo à ameaça, quando são eles os possíveis prejudicados.

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