Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Editorial

Um governo sem base

Lula Hugo Motta base aliada
Lula e o presidente da Câmara, Hugo Motta, em maio de 2025. (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados)

PP e União Brasil são dois partidos que, teoricamente, fazem parte da base aliada de Lula no Congresso Nacional. Por mais que ambos tenham um certo número de parlamentares que são declaradamente de oposição ao governo petista, as duas legendas também têm integrantes no ministério, o que supostamente deveria garantir ao presidente da República o apoio de parte significativa dos 109 deputados e 14 senadores, na soma dos dois partidos. No entanto, ambas as legendas falam em “fechar questão” e negar ao governo qualquer apoio a tentativas de elevação de impostos – seja no caso do decreto que elevou o IOF, seja no caso da medida provisória que substituiria esse decreto, elevando outros impostos em troca.

Não se trata, por certo, de puro altruísmo e preocupação com o contribuinte brasileiro – dias atrás, lembramos que o Congresso tem sua parcela de responsabilidade na construção dos atuais problemas fiscais brasileiros. Há, aí, uma certa dose de oportunismo político, já que, ao contrário dos políticos e partidos já conhecidos por sua fidelidade inabalável a Lula independentemente das bobagens que ele faça, PP e União Brasil não parecem interessados em atrair para si a publicidade negativa que viria com um apoio ao “tarifaço” de Fernando Haddad.

Lula não quis governar com pautas de consenso, levando o Brasil para a esquerda; e a tática de trocar apoio por cargos parece ter encontrado seu limite

Outrora, Lula foi exaltado como um mago da articulação política, capaz de conquistar robustas bases de apoio parlamentar (embora há 20 anos o Brasil saiba com mais clareza como é que isso tem sido feito); agora, ele não pode nem mesmo se dar ao luxo de dispensar os ministros dos partidos “rebeldes”, pois uma ruptura formal com um bloco que representa cerca de um quinto do Congresso significaria o fim de qualquer esperança de ter maioria para emplacar qualquer projeto. Resta ao governo engolir em seco e acenar com algumas poucas ameaças, como a de corte na liberação de emendas parlamentares devido ao contingenciamento necessário caso Lula e Haddad não consigam tirar mais dinheiro do contribuinte.

De certa forma, era um roteiro previsível desde o início do governo. Lula conquistara o Planalto, mas o mesmo eleitor que havia colocado o petista de volta na Presidência elegera um Congresso majoritariamente de centro-direita. A única forma de conseguir um apoio parlamentar sólido seria apresentar uma pauta de consenso nacional, sem radicalismos ideológicos, ou tentar conquistar o apoio do Centrão oferecendo cargos. Lula rechaçou de imediato a primeira opção, dando uma guinada à esquerda em vários temas, da economia à agenda de costumes – uma rara exceção parece ter sido a reforma tributária, apesar de todas as suas imperfeições. Já a segunda alternativa, como se vê agora, está chegando ao seu limite, com aliados de ocasião percebendo que a água entrou de vez na canoa do petismo.

VEJA TAMBÉM:

Um item da cultura política que os Estados Unidos exportaram para o mundo é a expressão “pato manco”, para descrever governantes que, por algum motivo, estão de saída e por isso já não são tão levados a sério. Lula ainda tem um ano e meio de governo, pode tentar a reeleição e jamais pode ser considerado carta fora do baralho com tanta antecedência; mas seu comportamento e sua insistência em pautas que enfrentam a rejeição da população e do Congresso podem fazer dele um outro tipo de “pato manco”: um governante sem base aliada, incapaz de implementar suas plataformas que dependam da aprovação de leis. De certa forma, não deixa de ser um grande alívio.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.