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Editorial

Os avanços e os obstáculos para a paz no Oriente Médio

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Nimrod Cohen, refém israelense libertado pelo Hamas, chega a um hospital em Tel-Aviv, em 13 de outubro. (Foto: Abir Sultan/EFE/EPA)

Dezenas de famílias israelenses – e, com elas, uma nação inteira – respiraram aliviadas na segunda-feira, quando os terroristas do Hamas entregaram os últimos 20 reféns vivos que ainda estavam sob seu poder desde a barbárie do 7 de outubro de 2023. No entanto, o prazo para a devolução dos corpos de todos os 28 reféns assassinados durante o cativeiro já expirou, e até agora os restos mortais de apenas dez pessoas foram entregues – um deles, segundo as autoridades israelenses, é de um morador de Gaza, não de um refém –, negando às famílias das demais vítimas o direito de sepultar seus entes com dignidade. Em troca, Israel já soltou quase 2 mil prisioneiros palestinos, incluindo 250 que haviam sido condenados à pena de prisão perpétua. As dificuldades para que a etapa inicial do processo de paz seja concluída são um sinal dos desafios que ainda aguardam israelenses, palestinos e todos os que desejam um desfecho definitivo para um conflito de décadas que marca a história do Oriente Médio.

Com a entrega dos reféns, o Hamas perde a mais valiosa moeda de troca que já teve para chantagear Israel desde que assumiu o poder na Faixa de Gaza, há quase 20 anos. Mas, pressionados entre colaborar com o processo de paz sugerido por Donald Trump e correr o risco de ver “o inferno explodir como nunca antes”, os terroristas tentam ganhar uma sobrevida. Primeiro, manifestaram ressalvas a algumas partes do acordo, como a desmilitarização do grupo e a supervisão externa do cessar-fogo e da reconstrução da Gaza. Depois, voltou a usar a única linguagem que conhece, a da violência, desta vez contra os próprios palestinos: a Força Radea, “polícia” do grupo extremista islâmico, partiu para o confronto contra outras facções armadas locais, acusadas de “colaborar” com os israelenses durante a contraofensiva levada a cabo por Israel como resposta ao 7 de outubro. A ação, mesmo vitimando palestinos, não recebeu nem de longe a mesma condenação midiática de quem até há pouco não perdia uma oportunidade de se “solidarizar” com o povo palestino – afinal, o agressor agora é outro.

Não poderá haver paz duradoura enquanto os extremistas do Hamas tiverem qualquer tipo de poder de fogo

O conflito fratricida do fim de semana é (mais) uma prova de que não poderá haver paz duradoura enquanto os extremistas do Hamas tiverem qualquer tipo de poder de fogo. Isso não isenta outros grupos palestinos armados, que têm o hábito de promover pequenas “guerras civis” nos momentos em que não estavam lutando contra Israel. Este, talvez, seja um dos maiores entraves ao atual processo de paz: o estabelecimento de uma Autoridade Palestina funcional, capaz de manter a ordem interna nos territórios, e ao mesmo tempo profundamente comprometida com a democracia, com a paz e com a existência pacífica lado a lado com o Estado israelense, já que é inviável pensar em uma solução de dois Estados se um deles estiver empenhado em destruir o outro. Por sua vez, Israel também discorda de um dos pontos do acordo: a substituição de suas tropas em Gaza por uma Força Internacional de Estabilização, que treinaria “forças policiais palestinas aprovadas”.

Enquanto isso, os palestinos que simplesmente desejam viver suas vidas em paz, trabalhando para ganhar o sustento próprio e o de suas famílias, aguardam pela implementação dos itens do plano de paz que preveem a reconstrução do enclave. Ela deve custar dezenas de bilhões de dólares – as estimativas variam muito – e pode levar até mesmo algumas décadas, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Aqui, o desafio é fazer com que o dinheiro efetivamente se transforme em infraestrutura para o benefício da população, já que, durante os anos de governo do Hamas, os recursos dirigidos a Gaza tiveram como principal destino a montagem do arsenal terrorista, privando o povo palestino de padrões mínimos de dignidade.

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Acordos de paz entre israelenses e palestinos – inclusive alguns que renderam a seus protagonistas o Nobel da Paz – já fracassaram no passado, o que justifica um certo ceticismo mesmo após a entrega dos reféns israelenses e a libertação de prisioneiros palestinos. O que pode fazer a diferença desta vez é uma pressão mais firme e duradoura dos Estados Unidos e outras potências ocidentais sobre Israel, e dos países árabes sobre o Hamas e a Autoridade Palestina, de forma que os conflitos não recomecem assim que os aliados voltarem suas atenções para outro lugar. Se preciso for, israelenses e palestinos terão de ser “empurrados” pelo resto da comunidade internacional até chegarem a um ponto de entendimento a partir do qual voltar ao status anterior, de hostilidade perpétua, se torne uma decisão custosa demais.

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