Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Editorial

Juros altos, déficit público e o custo do populismo fiscal

Aumento de IOF teria causado mal-estar entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (e) ao lado do atual presidente do BC, Gabriel Galípolo, durante evento em comemoração aos seus 60 Anos do Banco Central (Foto: Jose Cruz/Agência Brasil)

Ouça este conteúdo

No ano passado, a cada elevação da taxa Selic promovida pelo Banco Central, o presidente Lula, a deputada Gleisi Hoffmann e outros expoentes do Partido dos Trabalhadores lançavam ataques virulentos contra Roberto Campos Neto, então presidente da instituição. As críticas não se dirigiam aos aspectos técnicos das decisões de aumento de juros, mas concentravam-se no fato de Campos Neto ter sido indicado por Jair Bolsonaro – como se isso bastasse para desqualificar sua atuação à frente do BC.

No entanto, em 18 de junho deste ano, o Comitê de Política Monetária (Copom) voltou a elevar a Selic, desta vez para 15% ao ano – o maior patamar desde 2006. E o coro de protestos cessou. Nenhuma nota de repúdio, nenhuma crítica estridente, nenhuma denúncia de sabotagem. O silêncio faz sentido: agora, quem está à frente do BC é Gabriel Galípolo, indicado por Lula, e o discurso político perdeu utilidade. No plano técnico, até mesmo Lula e seus aliados sabem que a alta dos juros não é fruto de arbitrariedade, mas uma medida necessária para conter a inflação.

Enquanto o governo não entender que crescimento econômico sustentável exige confiança, previsibilidade e responsabilidade, o país continuará preso à armadilha dos juros altos

Trata-se de um mecanismo adotado por bancos centrais no mundo inteiro com o objetivo de equilibrar a demanda agregada e a capacidade produtiva da economia. Quando o consumo – seja das famílias, das empresas ou do próprio governo – supera a produção nacional, a pressão sobre os preços se intensifica. Em resposta, eleva-se a Selic para encarecer o crédito e reduzir a demanda. Quando a inflação sobe, os juros sobem; quando ela recua, há espaço para cortes.

O problema é que a inflação brasileira, embora sob controle estatístico, continua sob ameaça estrutural. A política de expansão de gastos adotada pelo governo Lula é incompatível com o equilíbrio das contas públicas. Ao estimular a demanda com aumento de despesas permanentes, subsídios e déficits recorrentes, o governo pressiona a economia de um lado, enquanto obriga o Banco Central a pisar no freio do outro. Resultado: juros em alta, crédito mais caro, investimento retraído, atividade em desaceleração e desemprego crescente.

VEJA TAMBÉM:

Essa equação não é nova. A inflação, em sua essência, decorre de uma demanda maior do que a capacidade produtiva da economia. Essa demanda agregada – composta pelo consumo das famílias, dos governos, pelos investimentos e pelo saldo comercial –, quando supera a produção real do país, gera aumento de preços. É a clássica lei da oferta e da procura. O papel do Banco Central, nesse contexto, é moderar a pressão da demanda, tornando o crédito mais caro e, assim, desestimulando o consumo. Mas isso só funciona de forma eficaz quando todos os agentes – inclusive o governo – cooperam com a política anti-inflacionária.

Não é o que ocorre hoje. A ineficiência da alta de juros em conter a inflação decorre, em parte, da teimosia do governo em não reduzir seus gastos. Quando o setor público insiste em expandir despesas mesmo diante de juros elevados, anula-se parcialmente o efeito contracionista da política monetária. Em outras palavras, o Banco Central tenta esfriar a economia, mas o governo pisa no acelerador fiscal – obrigando a autoridade monetária a apertar ainda mais os freios.

VEJA TAMBÉM:

A Selic a 15% é o retrato fiel de um governo que se recusa a fazer escolhas difíceis. Prefere o populismo da gastança à responsabilidade fiscal. Prefere transferir a culpa ao Banco Central a encarar os próprios erros. O lulopetismo governa como se a expansão do gasto fosse uma virtude em si mesma, descolada de qualquer consequência macroeconômica.

Quem paga o preço dessa ilusão não é a elite burocrática de Brasília – são os trabalhadores, os pequenos empresários, os jovens em busca do primeiro emprego, todos vítimas de um ambiente de negócios sufocado e de uma inflação renitente. Enquanto o governo não entender que crescimento econômico sustentável exige confiança, previsibilidade e responsabilidade, o país continuará preso à armadilha dos juros altos. E nenhum silêncio estratégico – por mais conveniente que pareça – será capaz de esconder essa verdade.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.