
Enquanto outros países e blocos econômicos – inclusive alguns governados pela esquerda, como o México – estão negociando com os Estados Unidos enquanto o novo tarifaço de Donald Trump não entra em vigor, o que deve acontecer em 1.º de agosto, o governo Lula reforça a aposta no confronto. Além de prestigiar os Brics, transformados em clube de ditaduras com o objetivo de validar os interesses chineses e o imperialismo russo, o petista quer reunir um outro bloco de governos esquerdistas, reunindo-se no Chile com o anfitrião Gabriel Boric, o espanhol Pedro Sánchez, o colombiano Gustavo Petro e o uruguaio Yamandú Orsi. O grupo, é verdade, não conta com nenhum peso-pesado geopolítico de envergadura global, mas é outro palanque para o antiamericanismo de DCE que Lula adora ventilar.
A prioridade para o petista, claro, continua a ser os Brics, uma escolha que deve custar ainda mais caro ao Brasil, caso as promessas do secretário-geral da Otan, o holandês Mark Rutte, se tornem realidade. As sanções econômicas impostas à Rússia pelas democracias ocidentais em resposta à invasão da Ucrânia têm sido pouco eficazes porque Vladimir Putin tem encontrado parceiros dispostos a seguir negociando com a Rússia – entre eles, o Brasil. Para resolver este problema, a Otan está disposta a impor sanções também aos países que mantêm comércio com os russos, e Trump promete fazer o mesmo caso Putin não aceite um cessar-fogo e participe de negociações de paz.
O governo Lula dá todos os indicativos de que priorizará um alinhamento ideológico que cobrará um preço muito alto
Em vez de colocar todos os esforços possíveis nas negociações para a eliminação de tarifas que podem trazer inúmeros prejuízos ao setor produtivo brasileiro, o governo Lula dá todos os indicativos de que priorizará um alinhamento ideológico que cobrará um preço muito alto. A Rússia, por exemplo, fornece mais da metade do diesel importado pelo Brasil, praticando preços menores que os de mercado para conseguir compradores e, com eles, os recursos necessários para manter funcionando sua máquina de guerra. Se Lula quiser continuar contando com o combustível barato russo, corre o risco de ver dificultado o acesso brasileiro a inúmeros outros mercados.
A percepção de que esse novo alinhamento incondicional brasileiro às ditaduras russa e chinesa está por trás da decisão norte-americana de taxar em 50% os produtos brasileiros tem se espalhado entre analistas, para quem a menção de Trump ao processo judicial contra Jair Bolsonaro é um pretexto conveniente aos Estados Unidos, mas não a principal razão para a medida norte-americana. Na tentativa de minar os Brics, o Brasil surge como o alvo ideal: não é uma economia pequena como outras que compõem o bloco, mas não é grande o suficiente para ter meios de suportar e reagir à pressão norte-americana, a julgar por episódios do passado em que o Brasil quis bater de frente com os EUA e não teve sucesso.
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Por muitas décadas, a política externa brasileira – o que inclui a busca e a manutenção de parcerias comerciais – se baseou na ideia de evitar alinhamentos incondicionais, de forma que eventuais diferenças político-ideológicas não fossem um empecilho a entendimentos entre o Brasil e outros países caso eles atendessem aos interesses nacionais. Essa postura deu ao país respeito internacional em termos diplomáticos e permitiu o estabelecimento de muitas parcerias comerciais. Lula mudou essa dinâmica, prestigiando desproporcionalmente os Brics – até mais que o Mercosul – enquanto ia queimando suas pontes com os Estados Unidos com declarações incendiárias, muito antes de Trump anunciar a taxação dos produtos brasileiros. O esgarçamento chegou ao ponto de o governo brasileiro já não ter canais fortes de interlocução em Washington.
O Itamaraty continua a ter um corpo técnico competente, e mesmo dentro do governo há elementos mais pragmáticos, por exemplo no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Ainda que, por algum milagre, eles tomem a dianteira e tenham sucesso, revertendo total ou parcialmente as novas tarifas norte-americanas, o problema de fundo não estará eliminado: a paixão de Lula pelos ditadores amigos dos Brics e sua aversão pelo Ocidente democrático continuarão trazendo problemas ao Brasil, cada vez mais visto como nação pouco confiável e nada afeita aos valores que têm construído o progresso global.



