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Menos de uma semana depois de conseguir uma frágil trégua com o Hamas, para encerrar o conflito na Faixa de Gaza, Israel resolveu colocar em risco os entendimentos com a Autoridade Nacional Palestina por causa de uma pequena área na Cisjordânia. No domingo, o governo israelense anunciou a anexação de cerca de 400 hectares de terra (o equivalente ao bairro curitibano do Hauer) ao sul da cidade de Belém. Pode parecer pouco, mas se trata da maior ação desse tipo em 30 anos, e o significado da anexação foi suficiente para atrair ampla condenação não apenas internacional, mas também de membros do governo de Benjamin Netanyahu.

A área tomada por Israel é a mesma onde três jovens israelenses foram sequestrados e mortos em junho, na ação que deu origem a todas as hostilidades observadas na Faixa de Gaza. Logo após do sequestro, e antes de os corpos serem encontrados, Netanyahu culpou o Hamas. O grupo terrorista negou participação no crime, mas, em 22 de agosto, Khaled Meshal, um de seus líderes, afirmou que os responsáveis pelo sequestro e morte dos jovens eram, sim, militantes do grupo, que teriam agido por conta própria, sem conhecimento ou autorização da cúpula do Hamas. Meshal, no entanto, considerou a ação uma expressão da "frustração diante da opressão e da ocupação" israelenses.

Mas a violência passada não é justificativa para que Israel volte a tomar terras dos palestinos, ainda mais quando se sabe que a área será usada para a construção de novos assentamentos judaicos, em uma clara violação da lei internacional que já motivou inúmeras resoluções da Organização das Nações Unidas e de seu Conselho de Segurança. Atualmente, cerca de 700 mil judeus vivem em assentamentos na Cisjordânia, em Jerusalém Oriental e nas Colinas de Golã. A existência dessas colônias é um dos principais obstáculos à paz entre israelenses e palestinos e, a cada ato de condenação internacional a essa política, Israel responde com a construção de novos assentamentos. Tem-se, assim, um círculo vicioso que coloca mais empecilhos a uma solução definitiva, reacendendo um clima de violência que, no passado, já gerou ataques tanto contra colonos quanto contra seus vizinhos palestinos.

A anexação causou manifestações de repúdio por parte das grandes potências, como os Estados Unidos (tradicionais aliados de Israel) e o Reino Unido, além da ONU. Seu secretário-geral, Ban Ki-moon, foi certeiro ao dizer, na segunda-feira, que "corre-se o risco de a tomada de tamanho pedaço de terra abrir caminho para novas atividades de assentamentos, o que – como as Nações Unidas reiteraram em várias ocasiões – é ilegal de acordo com o Direito Internacional e vai em direção totalmente contrária à busca por uma solução de dois Estados". Mas ainda mais significativa que a reação externa foi a revolta de membros do gabinete de Netanyahu. Yair Lapid, ministro das Finanças, disse que a decisão prejudica Israel. "Acabamos de sair de uma operação militar e estamos diante de uma complexa realidade diplomática. Ter o apoio mundial sempre foi um desafio; então, por que tanta urgência em criar outra crise com os Estados Unidos e o mundo?" questionou. A ministra da Justiça, Tzipi Livni, afirmou que a ação era "intrinsecamente errada".

O direito que Israel tem à legítima defesa contra ações terroristas não inclui, de forma alguma, uma legitimação moral para a construção de assentamentos na Cisjordânia. Se a pressão interna e externa continuar a ser incapaz de parar a ampliação dessa política de tomada de terras que deveriam pertencer aos palestinos, o governo israelense estará apenas alimentando seus críticos e reforçando a convicção de que a paz não está nos planos de Netanyahu.

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