
Dois atentados recentes nos Estados Unidos, ambos motivados por ódio à comunidade judaica, mostram que o antissemitismo não é uma lembrança do passado – ele está vivo, alimentado por ideologias radicais, discursos de intolerância, desumanização e uma crescente banalização da violência.
No último domingo (1º), em Boulder, no Colorado, um grupo pró-Israel chamado Run for Their Lives foi alvo de um ataque brutal durante uma caminhada pacífica em solidariedade aos reféns israelenses mantidos pelo Hamas na Faixa de Gaza. O agressor, identificado pelo FBI como um egípcio que vivia ilegalmente nos EUA, lançou coquetéis molotov e usou um lança-chamas improvisado contra o grupo, ferindo oito pessoas – algumas gravemente. Testemunhas relataram que o homem gritava “Palestina livre” enquanto promovia o ataque.
Questionar decisões militares ou estratégias adotadas por um Estado faz parte do exercício legítimo da opinião pública. No entanto, o que ultrapassa todos os limites da legitimidade é a desumanização e o desprezo, bem como a violência sob qualquer forma, baseados na origem nacional
O episódio se soma a outro, ocorrido semanas antes, em Washington. Um cidadão nascido em Chicago foi preso acusado de matar dois funcionários da embaixada de Israel – um jovem casal – após abrir fogo contra um grupo que deixava um evento do Comitê Judaico Americano. Ao ser detido, o criminoso repetiu a mesma expressão usada em Boulder: “Palestina livre”. Em ambos os casos, o alvo era claro: judeus ou quem com eles se solidariza.
Tais casos não são aleatórios. Desde o bárbaro massacre perpetrado pelo grupo terrorista Hamas em 7 de outubro de 2023 – que matou mais de mil pessoas em Israel – e a resposta militar israelense subsequente em Gaza, o mundo vem assistindo a uma inquietante escalada do antissemitismo. Um relatório divulgado neste ano pela Universidade de Tel Aviv evidencia essa realidade com números preocupantes.
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Ainda que 2024 tenha registrado alguma redução do número de casos de antissemitismo, os dados gerais mostram crescimento em diversos países: no Brasil, foram 1.788 incidentes antissemitas em 2024, contra 1.410 no ano anterior e 432 em 2022. O aumento é alarmante, e vem acompanhado de manifestações hostis em espaços públicos e nas redes sociais contra judeus.
Manifestação de apoio ao Hamas – que tem como objetivo a eliminação de Israel e dos judeus – também se tornaram comuns. Na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), por exemplo, um “ato político” foi realizado na última semana para manifestar apoio ao grupo terrorista Hamas e aos atos criminosos do dia 7 de outubro de 2023. Além do grupo palestino, outras organizações terroristas foram saudadas e, do lado de fora, eram vendidas camisetas do Hezbollah. Nos intervalos, o público entoava cantos e gritos como "do rio ao mar, a Palestina triunfará", slogan do Hamas que conclama o fim de Israel.
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Outros países apresentam quadros semelhantes. A Austrália registrou 1.713 casos em 2024, ante 1.200 em 2023. Na Itália, os números quase dobraram – de 454 para 877. No Canadá, a organização judaica B’nai Brith contabilizou 6.219 episódios, o maior número já registrado no país. Nos Estados Unidos, o avanço também é visível: Nova York teve 344 incidentes em 2024 (contra 325 em 2023), e Chicago, 79 (contra 50). Mesmo cidades como Londres e Berlim, onde houve recuo, mantêm níveis superiores aos registrados em 2022.
Os dados e os episódios recentes devem servir de alerta. O antissemitismo é uma ideologia assassina, que matou em massa no século XX e continua a ferir, perseguir e ameaçar judeus ao redor do mundo. Sua manifestação moderna, que já faz vítimas ao redor do mundo, não pode ser tolerada, devendo ser desmascarada e combatida com firmeza.
A crítica à atuação de Israel em Gaza e no Líbano – no contexto de seu esforço para neutralizar ameaças representadas pelo Hamas e pelo Hezbollah – é válida dentro dos marcos do debate democrático. Questionar decisões militares ou estratégias adotadas por um Estado faz parte do exercício legítimo da opinião pública. No entanto, o que ultrapassa todos os limites da legitimidade é a desumanização e o desprezo, bem como a violência sob qualquer forma, baseados na origem nacional ou pertencimento étnico de um povo – o abjeto racismo em sua essência. A civilização já conheceu os horrores que nascem do antissemitismo e não pode permitir que eles se repitam.



