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| Foto: Luis Robayo/AFP

As relações diplomáticas entre Brasil e Venezuela ficaram estremecidas com a decisão do regime ditatorial bolivariano, por meio da de sua Assembleia Nacional Constituinte, de declarar persona non grata o embaixador brasileiro em Caracas, Ruy Pereira. Quando a decisão foi divulgada, o diplomata se encontrava no Brasil; portanto, não poderá retornar ao país vizinho para seguir exercendo suas atividades. O Brasil respondeu na mesma moeda, como não poderia deixar de ser, aplicando o mesmo status ao encarregado de negócios venezuelano no Brasil, Gerardo Delgado Maldonado – ele é o mais alto representante diplomático da ditadura de Nicolás Maduro no Brasil, já que a Venezuela chamou de volta seu embaixador em Brasília em maio de 2016, durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff, classificado pelos bolivarianos como “golpe”.

E foi justamente o impeachment a justificativa usada agora pela presidente da constituinte, Delcy Rodríguez, dizendo que Pereira não poderá voltar à Venezuela enquanto o Brasil não retornar à “ordem constitucional que o governo Temer rompeu em nosso país irmão, após a destituição da presidente Dilma Rousseff”. Ao contrário da postura subserviente que o Itamaraty demonstrou com os regimes bolivarianos nos governos Lula e Dilma, desta vez nossa chancelaria não se deixou intimidar e respondeu à altura, ressaltando “o caráter autoritário da administração Nicolás Maduro e sua falta de disposição para qualquer tipo de diálogo”.

O próprio Lula já lamentou não ter feito a “regulação da mídia” quando estava no poder

Esse caráter autoritário é reafirmado por um dado preocupante vindo do Sindicato Nacional de Trabalhadores da Imprensa venezuelano, divulgado no dia 27 de dezembro: o ano de 2017 terminou com 69 veículos de imprensa fechados no país: foram 46 emissoras de rádio, três emissoras de televisão e 20 jornais. No caso das rádios e tevês, a mão do governo se sente de forma direta: as concessões das emissoras não foram renovadas. Além disso, três emissoras estrangeiras – duas colombianas e a CNN em Espanhol – tiveram seu sinal cortado na Venezuela. Já os jornais foram estrangulados de forma um pouco mais sutil: o mercado de papel-jornal é controlado pelo governo, que escolhe quais veículos de imprensa recebem os dólares para poder importar o insumo. Quem não tem como adquirir o papel acaba fechando as portas, caso dos 20 jornais da lista do sindicato.

Além do fechamento de jornais e emissoras de rádio e televisão, o sindicato ainda denunciou 66 prisões de jornalistas e 498 agressões, superando os números dos três anos anteriores. Pouco mais de metade dos ataques ocorreu durante os protestos de rua contra a ditadura de Maduro, violentamente reprimidos por forças oficiais, como a Guarda Nacional Bolivariana, e paramilitares, como as milícias chavistas, no que resultou em 125 mortos.

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E que não se espere alguma crítica de partidos de esquerda brasileiros que ainda hoje apoiam Nicolás Maduro: afinal, se para qualquer democrata a perseguição à imprensa independente é uma agressão inaceitável, para os bolivarianos de PT, PSol e assemelhados o que o regime venezuelano está fazendo é apenas uma versão mais radical (e, talvez, a ideal) da tal “regulação da mídia” que esses partidos sonham em realizar no Brasil, e que o próprio Lula já lamentou não ter feito quando estava no poder, prometendo-a novamente em sua já lançada campanha para a Presidência nas eleições de 2018.

O governo venezuelano não engole o papel exercido pela diplomacia brasileira quando a cláusula democrática do Mercosul foi finalmente aplicada à Venezuela, suspendendo o país do bloco, e precisa achar inimigos em seu esforço de propaganda para não assumir a culpa pelo caos econômico, social e humanitário em que o “socialismo do século 21” jogou o país. A comunidade internacional, Brasil incluído, não fecha os olhos ao sofrimento dos venezuelanos, mas também não pode ser conivente com a perpetuação da ditadura que destrói a Venezuela e que fecha as portas a qualquer possibilidade de ajuda.

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