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| Foto: Senado Federal/Arquivo/Senado Federal

Aos trancos e barrancos, emendada em quase 100 ocasiões, às vezes ignorada ou desrespeitada até mesmo por aqueles que mais deveriam defendâ-la, a Constituição Federal completa, nesta sexta-feira, seus 30 anos. Só não é mais longeva que a primeira Constituição republicana, de 1891, que durou 43 anos, e a Carta Imperial, promulgada em 1824 e que durou até a Proclamação da República, 65 anos depois. Um documento que ajudou a curar um Brasil que saía de 20 anos de autoritarismo e que ainda hoje é um guia importante para a consolidação da democracia no país.

O país acabara de sair de uma ditadura e havia eleito, ainda que indiretamente, um presidente da República civil. Era preciso substituir a carta de 1967, herança dos militares, por um novo documento, que consolidasse a redemocratização. Essa já era uma intenção de Tancredo Neves, levada a cabo por José Sarney. Assim, ainda em 1985 foi aprovada a emenda constitucional que lançava as bases para a elaboração da nova carta. O Congresso eleito em 1986 atuaria também como Assembleia Constituinte, conciliando suas funções de Poder Legislativo ordinário com a elaboração da nova carta.

O momento atual seria o pior possível para a redação de uma nova Carta

O resultado, como dissemos aqui em outra ocasião, foi um documento que é filho de seu tempo, uma resposta às décadas de autoritarismo que o país havia deixado para trás. A Constituição reafirmou de maneira inequívoca uma série de direitos que a ditadura havia cassado, e ainda acrescentou mais alguns; buscou proteger o trabalho dos parlamentares com uma série de dispositivos que impediam arbitrariedades, consagrou a livre iniciativa como pilar da atividade econômica no país, quis proteger a dignidade humana e a família.

E, por ser também filha de um período de grave desequilíbrio econômico, a Carta de 1988 não necessariamente incorporou as melhores práticas na gestão do orçamento: os constituintes viram, com acerto, quais eram as áreas prioritárias para o Brasil superar a pobreza, mas, de forma um tanto contraditória, criavam limitações que engessavam orçamentos enquanto, ao mesmo tempo, não tentavam impedir a gastança ilimitada, prática que seria coibida, anos depois, pela Lei de Responsabilidade Fiscal e, mais recentemente, pelo teto de gastos. À época, também não se vislumbrava, por exemplo, o caos em que entraria a Previdência Social.

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Por motivos mais ou menos nobres, surgem os clamores por uma nova Constituição. O candidato a vice de Jair Bolsonaro, general Mourão, falou em uma nova carta construída por um “conselho de notáveis” e submetida à aprovação popular por meio de referendo; o candidato petista, Fernando Haddad, promete em seu plano de governo instalar uma nova Assembleia Constituinte o quanto antes. E há muitos outros que defendem uma nova Constituição sem interesse político ou ideológico algum, argumentando que o Brasil necessita de uma Lei Maior mais enxuta, adequada aos tempos atuais e considerando os maiores desafios do país no momento.

Não cremos que a redação de uma nova Constituição só possa ocorrer em momentos de grande mudança institucional, embora tenha sido esse o caso de todas as Cartas Magnas de nossa história. Mas a Constituição de 88, com as mudanças pontuais necessárias, tem tudo para continuar a ser, por um longo tempo, a regra do nosso jogo democrático. Já explicamos, em outra ocasião, por que o momento atual seria o pior possível para a redação de uma nova Carta. O país tem atravessado momentos delicados do ponto de vista institucional, e nessas horas é preciso ter um porto seguro, uma âncora que seja a segurança de que o país necessita para estabilizar-se e avançar. Esse guia é a Constituição de 1988, com suas virtudes e defeitos – mais aqueles que estes. Que o país saiba olhar para ela com a consciência de que ali estão as bases para continuarmos a construir nossa democracia.

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